Assédio institucionalizado

Assédio sexual na Caixa: ‘Quem não pune o crime se torna responsável’, diz Érika Kokay

Há quase dois meses Pedro Guimarães caiu, mas escândalo de assédio segue sem conclusão. Trabalhadores da Caixa denunciam assédio institucionalizado, “inspirado” em Bolsonaro, e cobram punições

Elaine Menke/Câmara dos Deputados
Elaine Menke/Câmara dos Deputados
Deputada Erika Kokay: o crime pressupõe uma pessoa que agride, o assediador, e uma rede de apoio a essa pessoa

São Paulo – Trabalhadores da Caixa Econômica Federal cobram mais rapidez na apuração das denúncias de assédio moral e sexual praticado por gestores da instituição. A resposta, considerada crucial para combater a cultura permissiva ao assédio, aliciamento de funcionários e acobertamento de crimes, caminha a passos lentos. Mesmo depois da gravidade das denúncias que derrubaram do cargo o ex-presidente Pedro Guimarães. Investigado pelo Ministério Público do Trabalho após revelações de cinco funcionárias do banco sobre suas práticas humilhantes, Guimarães caiu, mas não seria o único “criminoso”. Pois novas informações surgiram a partir de investigações internas – na corregedoria da Caixa e em uma empresa independente. Porém, até o momento, os processos, sigilosos, ainda estão inconcluso.

O assunto foi tema de audiência pública nesta quinta-feira (18) na Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público da Câmara dos Deputados. A deputada Erika Kokay (PT-DF), que pediu a audiência, observou que não houve a responsabilização, na própria Caixa, das pessoas denunciadas. “Várias pessoas na Caixa foram destituídas de suas funções, mas assumiram outras funções, às vezes com remunerações maiores”, afirmou. Nesse sentido, reforçou que administrações que se omitem a punir essas práticas se tornam responsáveis por elas.

Além disso, Erika Kokay relatou a existência de esquema de acobertamento de crimes na instituição. “O crime pressupõe a existência de redes: uma pessoa que diretamente agride, o assediador, mas existe uma rede que se constrói em apoio a essa pessoa”, explicou.

Assédio, no governo Bolsonaro, “vem de cima”

“Foi com vergonha que expliquei aos meus colegas de trabalho, que me perguntam se já houve alguma punição, que no Brasil as coisas andam mais devagar. E que a palavra de dezenas de mulheres ainda vai ser julgada”, disse uma das vítimas de assédio responsável pela denúncia, a funcionária do banco Carolina Lacerda Tostes, que hoje está no Canadá. Entretanto, sem dar detalhes, ela disse que o seu caso foi o de menor gravidade comparado a outras denúncias. E afirmou que uma das vítimas disse ter ouvido, do ex-presidente, Pedro Guimarães a ordem “levanta aí para eu ver se você está de biquíni”, antes de uma reunião de trabalho on-line.

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Takemoto cita pesquisa sobre assédio: “Caixa está adoecendo os funcionários” (Elaine Menke/Câmara do Deputados)

O presidente da Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa (Fenae), Sergio Takemoto, informou que questionou pessoalmente a presidenta do banco, Daniella Marques, na quarta-feira (17). Na audiência, voltou a cobrar a apuração das denúncias de assédio sexual na Caixa e punição dos responsáveis. Além disso, levantou o problema do assédio moral.

“É uma prática do governo. Não há como esperar que gestores indicados pelo presidente Bolsonaro se comportem de modo diferente do que ele pratica. É reflexo dele”, avaliou. “É um governo que não respeita as mulheres, os trabalhadores, os seres humanos e a vida. Para combater o assédio e melhorar as condições de trabalho precisamos mudar o governo”, observou.

‘Em 161 anos de existência, empregados e a Caixa nunca foram tão atacados e humilhados’

Takemoto apresentou dados da pesquisa encomendada pela Fenae sobre o assédio moral na Caixa. De cada 10 empregados, seis sofreram assédio e 77% já presenciaram a prática no ambiente de trabalho. Mais de 90% já sentiram pressão ou ansiedade no âmbito da Caixa e 42% relataram problemas de saúde relacionados ao desempenho das atividades na empresa. “O resultado da pesquisa é assustador. A Caixa está adoecendo seus empregados”, disse.

Assédio sexual e institucional na Caixa

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Rita Serrano: “Assédio institucionalizado na Caixa” (Elaine Menke/Câmara do Deputados)

A representante dos funcionários no Conselho de Administração da Caixa, Maria Rita Serrano, destacou a prática do que chamou de “assédio institucionalizado” durante os anos do governo de Jair Bolsonaro. A prática, segundo ela, consiste, entre outras coisas, na rotatividade nos cargos de direção e demissão injustificada de diversos funcionários que atuavam em posições estratégicas, como forma de retaliação. “Até que se chegasse a um momento em que o presidente da empresa se sentisse a vontade para cometer casos de assédio sexual, com o aumento drástico do assédio moral e da pressão sobre os trabalhadores”, disse Serrano.

Nessa mesma linha, a ex-presidente do banco Maria Fernanda Ramos Coelho frisou que o discurso da meritocracia dentro da Caixa “nada mais serve do que para mascarar as desigualdades”. “O que nós vimos nos últimos três anos foram retiradas de funções sem justificativa. Não porque a pessoa tinha tido mal resultado, ou não atingido as metas, mas para mostrar que precisava se subordinar à chefia”, ressaltou.

Como política contra o assédio, a secretária da Mulher da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT), Fernanda Lopes, sugeriu formação específico sobre o que constitui o crime de assédio sexual. “O corpo da mulher é dela, então, se ela não te autorizou a dar um aperto de mão, isso já é uma violação”, disse.

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Com informações da Agência Câmara de Notícias e Fenae