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MPT e juiz apontam vínculo empregatício no trabalho em aplicativos. ‘Subordinação clara’

Para representante do MPT, poder escolher horário da jornada é muito pouco para dizer que não existe uma relação de emprego nos aplicativos: “O trabalho é permanente e é feito no intuito do empregador”

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Em torno de 86 mil motoristas de aplicativos, de um total de 704 mil, tinham ensino superior. Entre os entregadores de comida e produtos, eram 70 mil, de 589 mil

São Paulo – O Ministério Público do Trabalho (MPT) entende que há relação de emprego nas plataformas digitais dos aplicativos de entrega, e essa posição foi apresentada durante audiência pública realizada ontem (5) na Câmara. Promovida por duas comissões da Casa (de Desenvolvimento Econômico, Indústria, Comércio e Serviços e de Trabalho, Administração e Serviço Público), a reunião foi convocada para debater o Projeto de Lei (PL) 5.069/2019, que reconhece o vínculo empregatício.

O autor do projeto é o deputado Gervásio Maia (PSB-PB), que afirmou ter como objetivo acabar com a insegurança jurídica no assunto. Isso porque a Justiça do Trabalho já deu tanto sentenças favoráveis quanto contrárias ao vínculo empregatício entre os entregadores e as plataformas digitais.

O PL prevê direitos básicos da CLT, como férias e 13º, além da possibilidade do trabalho como microempreendedor individual. A tramitação da matéria é feita de forma conclusiva em comissões, ou seja, sem necessidade de votação em plenário. O relator é Augusto Coutinho (Republicanos-PE).

Para o vice-coordenador de Combate às Fraudes nas Relações de Trabalho (Conafret) do MPT, Renan Bernardi Kalil, não se pode concordar com o argumento recorrente das plataformas, que alegam serem empresas de tecnologia. “Ninguém procura uma empresa de transporte de pessoa ou de mercadoria, buscando uma solução tecnológica. A pessoa quer ir de um ponto A para um ponto B, ou quer que um produto saia de um ponto A até um ponto B”, afirmou na audiência.

“Todos estão trabalhando”

Para ele, a ausência física de alguém determinando o que o trabalhador deve fazer não impede a caracterização de subordinação. Hoje, argumentou, algumas dessas questões (valor, jornada) são feitas via algoritmos. “Me parece que olhar para o simples ponto de que o trabalhador pode escolher o seu horário de trabalho é muito pouco para dizer que não existe uma relação de emprego”, acrescentou Kalil.

Assim, segundo o presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), Luiz Colussi, não é possível distinguir trabalhadores de plataformas dos demais. “Percebemos com clareza a presença do vínculo empregatício”, afirmou. “O trabalho em aplicativos é pessoal, seja dirigindo o carro da Uber, seja pilotando a bicicleta do Ifood. Todos estão trabalhando. O trabalho não é gratuito, é remunerado. O trabalho é permanente e é feito no intuito do empregador. E aqui temos essa nova espécie de subordinação, que é clara. Ou seja, o trabalhador está vinculado, subordinado à empresa.”