Fundamento

Nos 80 anos da Justiça do Trabalho, Cármen Lúcia defende Constituição e juiz refuta ‘Carta del Lavoro’

Para ministra do STF, o trabalho é “fundamento da ordem econômica capitalista”

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Edição de 1º de maio de 1941 do "Diário de S.Paulo" traz na manchete criação da Justiça do Trabalho

São Paulo – Ao comemorar (com atraso, devido à pandemia) os 80 anos da Justiça do Trabalho no Brasil, magistrados aproveitaram para enfatizar o caráter social desse ramo do Judiciário, surgido também sob divergências e ataques. No segundo e último dia de seminário internacional, nesta sexta-feira (13), a ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) Cármen Lúcia ressaltou a Constituição e afirmou que o trabalho é “fundamento da ordem econômica capitalista” (assista aqui ao pronunciamento de Cármen Lúcia).

Ainda ontem, o ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST) Mauricio Coutinho Delgado rebateu a tese de que a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), surgida em 1943, tenha tido como base a Carta del Lavoro do fascismo italiano. “É um documento quase medíocre em termos jurídicos”, afirmou. “Tem 30 artigos, a maioria meramente programáticos.” Estudiosos apontam outras influências para a legislação brasileira.

Anos 1940: Judiciário e CLT

Uma das primeiras menções a uma justiça trabalhista aparece na Constituição de 1934, que fala em “dirimir questões entre empregadores e empregados”. A Justiça do Trabalho foi instalada em 1º de maio de 1941, exatamente dois anos antes de Getúlio Vargas anunciar a CLT.

Delgado citou momentos anteriores a esses fatos. “Em 1922, uma lei estadual de São Paulo criou os tribunais rurais, que tinham uma composição tripartite e, talvez, tenham sido influenciados por duas instituições importantes na época: a Organização Internacional do Trabalho, criada em 1919, e a Constituição alemã de Weimar, do mesmo ano”, lembrou. E apontou ainda a importância do governo Vargas na formação de uma justiça social. “Foi um período muito fértil na criação de uma estrutura direcionada às relações de trabalho. (…) Já a Constituição de 1934 trouxe o constitucionalismo social à nossa história.”

Dever do Estado

O ministro chegou até a Constituição de 1988, que segundo ele procurou democratizar a sociedade e a economia, “garantindo um processo contínuo de inclusão social”. Hoje, Cármem Lúcia também falou da Carta, que traz em seu texto o valor social do trabalho como fundamento, e do princípio da dignidade humana. Buscar o pleno emprego “é dever do Estado e da sociedade”, disse a ministra do STF, ao lamentar o alto nível de desemprego no país. “A pandemia escancarou as profundas e trágicas desigualdades da sociedade brasileira.”

Ela citou também duas encíclicas papais: a Rerum Novarum, que no domingo (15) completará 131 anos (papa Leão XIII), e a Laborem Exercens, de 1981 (João Paulo II). A primeira critica o socialismo e as greves, ao mesmo tempo que fala em condições de trabalho mais dignas. E a segunda diz que não pode contrapor trabalho e capital.

Em outro painel, o presidente da Academia Brasileira de Direito do Trabalho, Luiz Carlos Amorim Robortella, afirmou que o surgimento das chamadas plataformas digitais criou um novo padrão de vida profissional, potencializado pela pandemia. Isso vem tornando, segundo ele, os empregados cada vez mais autônomos, e estes cada vez mais subordinados. “Dessa forma, existe uma dificuldade de estabelecer critérios para aplicação da proteção trabalhista”, afirmou. “Precisamos ter uma lei com garantias fundamentais mínimas, uma negociação coletiva sindical, ou individual para determinadas atividades, e níveis de remuneração. E, também, códigos de conduta para as empresas”, defendeu.


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