Reparação

Acordo de indenização trabalhista resulta em barco-hospital na região amazônica

"Papa Francisco", que será inaugurado neste sábado, vai atender mil comunidades ribeirinhas, num total de quase 700 mil habitantes. Metade deles abaixo da linha de pobreza

Associação e Fraternidade São Francisco de Assis na Providência de Deus
Associação e Fraternidade São Francisco de Assis na Providência de Deus
Barco-hospital atenderá aproximadamente mil comunidades ribeirinhas em uma área de difícil acesso, o Baixo Amazonas

São Paulo – O “Papa Francisco” começará a navegar nos próximos dias pela região amazônica. É um barco-hospital que atenderá aproximadamente mil comunidades ribeirinhas em uma área de difícil acesso, o chamado Baixo Amazonas, em projeto cujos recursos vieram de um acordo de indenização trabalhista. Intermediado pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) de Campinas (SP), esse acordo foi homologado em 2013 pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST), encerrando uma ação civil pública de 2007, sobre negligência da Raízen (Shell) e da Basf na proteção de funcionários em uma fábrica de agrotóxicos em Paulínia, na região de Campinas. A inauguração será neste sábado (17), em Belém.

O projeto será executado pela Fraternidade São Francisco de Assis, entidade filantrópica sem fins lucrativos, com recursos do acordo. O valor é de R$ 25,1 milhões. Segundo o MPT, no barco haverá atendimento em ginecologia, pediatria, urologia, oftalmologia, cardiologia, dermatologia e odontologia. O local terá ainda salas de mamografia, de raio-x, sala de teste ergométrico, ultrassom, eletrocardiograma e laboratório de análises clínicas. A estrutura inclui duas “ambulanchas” para visitas domiciliares ou em pontos de encontro nas comunidades.

Ainda de acordo com o Ministério Público, o Baixo Amazonas concentra 675.510 habitantes em 12 municípios: Alenquer, Almerim, Belterra, Curuá, Faro, Juruti, Monte Alegre, Óbidos, Oriximá, Prainha, Santarém e Terra Santa. Quase metade dessa população (48,37%) está abaixo da linha da pobreza e não tem atendimento de saúde – em Prainha,  esse índice chega a 69,33%. “A pesca e o extrativismo são as atividades econômicas mais comuns na região. Algumas contaminações são frequentes nas comunidades ribeirinhas, decorrentes da exposição ao veneno da malária e ao mercúrio, devido ao garimpo realizado em larga escala.” Os moradores levam, em média, 24 horas, para se deslocar até Manaus e 12 até Belém, de barco.

“Todos os trabalhadores e familiares vítimas desse caso conhecido como Shell/Basf foram atendidos pelo SUS e pela Previdência Social. Dessa forma houve prejuízo aos cofres públicos, portanto para todo o país. Nada mais justo que as reparações sejam promovidas de norte a sul do território nacional, como vem acontecendo, e se concretiza com mais esse projeto do barco-hospital, no Pará”, diz o procurador Ronaldo Lira, do MPT em Campinas.

O acordo na Justiça do Trabalho já atingiu mil pessoas, entre ex-trabalhadores, terceirizados, autônomos e filhos. Incluiu indenização por danos morais coletivos, no valor de R$ 200 milhões, para instituições indicadas pelo MPT, e por danos morais e materiais individuais, em um total de R$ 87,3 milhões. Desde que a ação foi ajuizada, foram registradas mais de 60 mortes entre os que trabalharam naquela fábrica. O acordo prevê ainda atendimento médico vitalício a 1.058 vítimas habilitadas.

O que a Shell diz

Em nota, a assessoria de imprensa da Shell lembra que “a existência de contaminação ambiental não implica, necessariamente, em exposição e prejuízo à saúde de pessoas” e que o acordo firmado firmado em 2013 “não reconheceu qualquer negligência por parte da Shell e da Basf com relação à saúde dos funcionários da antiga fábrica de produtos químicos na cidade de Paulínia (SP).”

No comunicado, a empresa afirma que mais de um ano antes da homologação já prestava assistência médica integral para os antigos trabalhadores de Paulínia e seus dependentes, “apesar de estudos técnicos mostrarem que a contaminação ambiental não impactou a saúde” daquelas pessoas.

 “A empresa não reconhece, portanto, a ocorrência de óbitos relacionados à atividade laboral exercida nas antigas instalações da Shell em Paulínia(SP)”, finaliza a assessoria.

 

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