Saúde

O amianto no Brasil está com os dias contados, diz ex-funcionário

Mudanças no ambiente, no entanto, só vão beneficiar futuras gerações. 'Muita gente está na fila para morrer'

Eduardo Guedes de Oliveira/Ass. Leg. SC

Eliezer: “Fui saber que o amianto era cancerígeno 14 anos depois. Foi todo mundo enganado”

 São Paulo – O presidente da Associação Brasileira dos Expostos ao Amianto (Abrea), Eliezer João de Souza, saiu otimista após mais uma etapa do julgamento sobre o uso do produto, ontem (17), no Supremo Tribunal Federal (STF). A relatora da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4.066, ministra Rosa Weber, considerou procedente a ação, considerando que a fibra é lesiva para a saúde. Independentemente disso, Eliezer acredita que “o amianto no Brasil está com os dias contados”. 

Mas a possível mudança com o definitivo banimento do produto só deverá beneficiar futuras gerações, acrescenta Eliezer, 76 anos, que trabalhou durante 13, de 1968 a 1981, na fábrica da Eternit em Osasco, na Grande São Paulo. “Fui saber que o amianto era cancerígeno 14 anos depois”, conta, afirmando que em momento algum a empresa fez algum alerta sobre riscos. “Foi todo mundo enganado.” 

“Foi um passo importante”, afirma o presidente da Abrea sobre o voto da relatora, mas ele afirma que “muita gente está na fila para morrer, não tem mais volta”. Ele diz estar bem de saúde no momento, após retirar um nódulo da pleura – convive “com falta de ar, cansaço físico”.

O julgamento será retomado na próxima quarta-feira (23), quando serão colhidos os votos dos ministros, que podem ou não acompanhar a relatora. Ontem, ela reconheceu como inconstitucional um artigo da Lei 9.055, de 1995, que permite a extração, industrialização e comercialização do amianto crisotila. A indústria sustenta que essa variedade do produto pode ser usada com segurança, o que é contestado por trabalhadores, procuradores e magistrados.

Na sessão anterior, o ministro Dias Toffoli votou favoravelmente a três leis estaduais (Pernambuco, Rio Grande do Sul e São Paulo) e uma municipal (São Paulo), que proíbem a produção e comercialização do amianto. Ele manifestou-se contra a autorização federal, mas está impedido de votar sobre a ADI 4.066, porque era advogado-geral da União na época em que a ação foi ajuizada (2008). Luís Roberto Barroso também está impedido, porque elaborou parecer para a indústria do amianto antes de se tornar ministro da Suprema Corte. A ação foi proposta pela Anamatra (magistrados da Justiça do Trabalho) e pela ANPT (procuradores do Trabalho).

No voto, Rosa Weber disse considerar que o artigo da Lei 9.055 em questão está em desacordo com dispositivos constitucionais que tratam da proteção da vida, o direito à saúde e a um meio ambiente equilibrado. Também estaria desrespeitando convenções internacionais das quais o Brasil é signatário. “Os preceitos constitucionais que elevam a saúde à categoria de direito social incumbem ao Estado o dever de garanti-la mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doenças e assegure aos trabalhadores a redução de riscos no trabalho e adoção de agenda positiva para a proteção desses direitos.”

Sempre no segundo sábado de cada mês, um grupo de ex-trabalhadores do amianto se reúne em Osasco para discutir ações e atualizar assuntos. Além de São Paulo, a Abrea está organizada na Bahia, Minas Gerais, Paraná, Pernambuco e Rio de Janeiro. O possível fim da produção e comercialização do produto não resolve os problemas, lembra Eliezer. “A gente tem muito trabalho pela frente”, afirma, acrescentando que boa parte do encanamento de água potável ainda é à base de amianto. Também faltam políticas públicas para que as pessoas possam, por exemplo, trocar suas caixas d´água.

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