Sem alteração

Relator da reforma trabalhista quer texto em ‘acordo’ com o Planalto

Ferraço rejeitou mais de 200 emendas e apenas sugeriu vetos ou mudanças, que seriam feitas por medida provisória. 'Melhor fechar o Senado', reagiu Lindbergh. Acordo joga votação para a semana que vem

Geraldo Magela/Agência Senado

Paim, Ferraço, Jucá e Jereissati: governistas querem aprovação sem mudanças, mas oposição protesta

São Paulo – Cenário de tumulto na semana passada, a Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado retomou em tom conciliatório, ou menos ríspido, na manhã desta terça-feira (30), a discussão do projeto de lei (PLC 38) de “reforma” trabalhista. Um acordo envolvendo o presidente do colegiado, Tasso Jereissati (PSDB-CE); o relator do texto, o também tucano Ricardo Ferraço (ES); o líder do governo, Romero Jucá (PMDB-RR), e Paulo Paim (PT-RS), pela oposição, jogou a votação para terça-feira que vem (6), contrariando o governo, que quer urgência para votar a matéria. Mas há divergência quanto à fórmula adotada pelo relator, que não mexeu no texto vindo da Câmara, apenas “sugeriu” mudanças, que poderiam ser feitas via medida provisória pelo Executivo. Qual governo?, perguntam os oposicionistas. 

Até o anunciado acordo, os parlamentares poderiam votar hoje o parecer do relator, de 74 páginas, que há uma semana, diante de tumulto na sessão da CAE, mesmo sem apresentação formal foi considerado como lido pelo presidente da comissão. A oposição contestou, pedindo mais debate para o relatório. Os oposicionistas rejeitam aprovar um texto sem alterações, só com “sugestões”.

Em seu parecer, Ferraço rejeitou todas as 193 emendas que foram apresentadas no Senado. Atendendo a um pedido do Palácio do Planalto, que não quer modificações no texto para evitar um retorno do projeto à Câmara, ele só sugeriu alguns vetos ou mudanças pela Presidência da República, por meio de uma medida provisória, no que o relator chama de “acordo institucional”. Hoje, Ferraço informou sobre novas emendas (de 194 a 218), apresentadas depois da sessão do dia 23 – e também rejeitadas. “De minha parte, tenho fé e esperança que esses acordos serão cumpridos”, afirmou. “Esta é uma legislação ordinária. Estou convencido que não há violação de direito fundamental.”

Os itens sugeridos no parecer referem-se à presença de gestante e lactante em ambientes insalubres, horas extras para mulheres, acordos individuais para implementação de jornada 12 (de trabalho) por 36 (de descanso), trabalho intermitente, representação de empregados e negociação de intervalos entre jornadas. “Em relação à jornada intermitente, o governo está aqui se comprometendo a editar uma medida provisória sobre o assunto”, comentou Jucá.

Segundo Ferraço, o Senado está diante de uma “escolha de Sofia”, já que retornar o texto à Câmara representaria um risco. “Os deputados já manifestaram qual é sua opinião, e se voltar lá eles vão passar a régua.”

Lídice da Mata (PSB-BA) disse que duvidava: “Vamos pôr isso a teste”. Ela também contestou a tese, repetida por Ferraço, de suposta inspiração, na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), da Carta del Lavoro da Itália na época do fascismo. Segundo a senadora, “estudos modernos” apontam outras fontes para a CLT brasileira – entre esses estudos, ele citou Arqueologia do Estado-Providência, de Alfredo Bosi.

“É melhor fechar o Senado Federal”, reagiu o líder do PT, Lindbergh Farias (RJ), para quem se trata de um acordo “indecoroso”, referindo-se ao acerto com o Planalto. Segundo ele, o relator admite problemas no texto, mas em vez de corrigi-los prefere transferir as mudanças para um governo que “não se sustenta”. 

“A Câmara fez mais de 100 mudanças e o Senado não pode fazer nenhuma?”, questionou Jorge Viana (PT-AC). “É uma irresponsabilidade”, acrescentou. “Defendo atualização das leis trabalhistas, mas não nesses termos que o governo Temer apresentou. Acho que o senador Ferraço deveria apresentar o seu relatório, não o relatório do governo. Está sendo imposto ao Senado não decidir nada.” Para ele, a Casa deveria fazer uma “mediação”, em vez de confiar em vetos de um governo que ninguém sabe qual será.

Viana lembrou ainda que em 6 de junho, data em que seria realizada a votação, haverá julgamento, no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), da chapa de Dilma Rousseff e Michel Temer na eleição de 2014. “Em vez de estar discutindo aqui uma lei que diz respeito à vida dos brasileiros, de empresários, comerciantes, industriais, desempregados, domésticas, donas de casa – porque todo mundo está envolvido nessa lei –, nós vamos estar de olho em sabe o quê? Se o governo vai seguir ou pára no dia 6”, disse o parlamentar.

Ele lembrou que, na próxima semana, o ministro Herman Benjamin vai apresentar seu relatório que caça os votos e o resultado da eleição de 2014. “Foi uma proposta do nosso colega senador Aécio Neves (PSDB-MG), inconformado com o resultado das eleições. E é isso que vai estar sendo decidido na próxima terça-feira”, ressaltou Viana.

Sem conserto

Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) também criticou Ferraço, afirmando que a função do Parlamento é de legislar. “Vossa Excelência, como senador da República, não tem a prerrogativa de sugerir, mas de votar. Fazer um acordo para o presidente modificar? Nós nem sabemos quem vai ser”, afirmou, acrescentando que nos corredores da Casa já se discute quem será o substituto de Temer. “Esse projeto não tem conserto, pelo menos da forma que está.”

O relator repetiu o discurso adotado pela bancada governista na Câmara, que aprovou o projeto (PL 6.787) em abril, afirmando que o texto não ameaça direitos e que é preciso flexibilizar a legislação para facilitar a criação de postos de trabalho. A tese é contestada por especialistas, para quem não há relação entre flexibilização e o aumento do nível de emprego. Para o senador Fernando Bezerra Coelho (PSB-PE), a economia já está reagindo e o projeto vai ajudar na retomada. Segundo ele, neste ano o Produto Interno Bruto (PIB) terá “crescimento positivo” (sic).

A oposição diz que o Senado não pode ser uma Casa “carimbadora” de textos aprovados na Câmara, e defende alterações no texto, ou mesmo sua retirada. “O Senado não pode ser o instrumento que carimba”, comentou Paulo Paim, acrescentando que isso estimula a discussão sobre o Congresso unicameral (apenas uma Casa). Ontem, as centrais aprovaram a realização de nova greve geral, em junho, contra essa reforma e a da Previdência, e contr a permanência de Michel Temer. 

Na semana que vem, os senadores Lídice, Paim e Vanessa apresentarão votos em separado. O projeto que altera a legislação trabalhista tem de passar ainda pelas comissões de Assuntos Sociais (CAS) e de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado. Na parte final da sessão, o autor do criticado substitutivo na Câmara, deputado Rogério Marinho (PSDB-RN), foi à mesa e cumprimentou Tasso.

 

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