'Ativismo judicial'

Presidente do TST defende Estado menor e reformas mesmo com crise

Se o Brasil não resolver questão trabalhista, poderá virar uma 'Venezuela', disse Ives Gandra Filho durante palestra na Fundação FHC. Para ele, direitos são 'protecionismo' e desestruturam economia

Fellipe Sampaio/TST

Presidente do TST considera legislação rígida, mas maioria dos ministros do tribunal discorda

São Paulo – Em debate na Fundação Fernando Henrique Cardoso, o presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Ives Gandra Filho, criticou o que chama de “ativismo judicial” e afirmou que o “protecionismo” prejudica a economia e o próprio trabalhador. Gandra acrescentou ainda que enquanto a questão da segurança pública, se não resolvida, pode levar o Brasil a ser uma “Colômbia”, a questão trabalhista poderá levar a uma “Venezuela”, com “uma desestruturação econômica absoluta”.

“É disso que queremos escapar”, disse Gandra Filho, defendendo “segurança jurídica” e valorização da negociação. “O trabalhador está fragilizado, mas as empresas também”, afirmou. “Crise econômica não é desculpa para não fazer reforma, é até motor para que se consertem as coisas. Por um Brasil maior, um Estado menor.”

Na primeira fila da plateia, estava o próprio Fernando Henrique, homenageado pelo presidente do TST. No meio da palestra, chegaria ainda o senador Aécio Neves (PSDB-MG), depois de o magistrado apontar uma “disputa” entre o Congresso e o Supremo Tribunal Federal (STF) em precedentes sobre negociação coletiva. Para ele, é o Congresso que deve, em contato com a sociedade, decidir sobre normas legislativas”.

A comparação com países vizinhos, segundo Gandra Filho, surgiu durante conversa ontem com o ministro interino da Justiça, José Levi do Amaral, que substitui Alexandre de Moraes, indicado por Michel Temer para o STF. O próprio presidente do TST era cotado para o cargo, em substituição a Teori Zavascki.

Em sua palestra, o magistrado criticou várias vezes o “ativismo judicial”, referindo-se basicamente à Justiça do Trabalho. “O ativismo judiciário hoje chegou ao cúmulo de, a partir de princípios genéricos, criar normas contra a lei”, afirmou. Ele lembrou de comentário justamente de Teori, no ano passado, durante cerimônia pelos 70 anos do TST e 75 da Justiça trabalhista: “No momento em que você põe princípios no lugar da lei, um juiz vai dizer uma coisa, outra vai dizer outra”.

Juiz precisa ter juízo

Gandra Filho defendeu a realização de uma reforma ainda neste semestre, deixando a previdenciária para a segunda metade do ano. “Uma legislação rígida e aplicada rigidamente é pior para o trabalhador. Mas tem muitos colegas meus que entendem que a Justiça tem de resolver todos os problemas”, afirmou, reagindo contra o que chama de “intervencionismo estatal” excessivo. Isso, segundo ele, “acaba mais desestruturando a economia do que ajudando”.

Há uma corrente, tida como majoritária no Judiciário trabalhista, crítica às reformas. Para o presidente do TST, “o juiz tem de ter o juízo da consequência”, ou seja, considerar as consequências de suas decisões. Citou um julgamento, no tribunal superior, sobre Remuneração Mínima de Nível e Regime (RMNR) na Petrobras. “Dependendo da solução, nós quebramos a Petrobras”, afirmou.

O presidente do TST comentou os diversos projetos em discussão sobre o tema, especialmente o PL 6.787, cuja comissão especial foi instalada ontem, o PL 4.962 (negociado sobre o legislado), o PLC 30 e o PL 4.302 (ambos sobre terceirização) e o PLS 218 (trabalho intermitente). “Não precisamos fazer uma mega-reforma, basta prestigiar a negociação coletiva”, sustentou Gandra Filho, para quem na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) bastariam “normas gerais”.

Ele defende o princípio da “vantagem compensatória” para estimular a conciliação e reduzir conflito. Por exemplo, se não é possível dar reajuste com base na inflação, pode-se compensar com um abono ou um vale-refeição maior. Gandra Filho defendeu ainda temas como ampliação do contrato temporário, marco regulatório da terceirização, arbitragem e representação dos empregados em atividade conciliatória. 

A representação de empregados está prevista no PL 6.787, mas sua redação final provocou reclamações entre os sindicalistas, porque houve alterações entre o texto apresentado pelo governo e o encaminhado ao Congresso, em relação à função desses representantes, critérios de escolha, participação sindical e proporção. Um analista presente à palestra comentou, posteriormente, que a proposta, no conteúdo, ficou semelhante à da Confederação Nacional da Indústria (CNI). 

Coube ao ex-presidente encerrar a palestra, que teve ainda o presidente da UGT, Ricardo Patah, e o professor Hélio Zylbsrstajn, pesquisador da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe). “Na prática, já está acontecendo isso (negociado sobre o legislado). Chegou bem uma hora de avançar. Não atropelando os outros, mas com os outros”, afirmou Fernando Henrique, que no final de seu governo apresentou um projeto que trazia, como base, o princípio do negociado sobre o legislado. Aprovado na Câmara – sob a presidência do então deputado Aécio Neves –, parou no Senado e foi arquivado em 2003, no primeiro ano do governo Lula. O PL 4.962, do deputado Júlio Lopes (PP-RJ), defendido por Gandra Filho, traz bastante semelhança em relação àquele do período FHC.

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