Nada a comemorar

Em seu dia, pesquisadores denunciam desmonte da ciência pelo governo Alckmin

Prestes a aprovar projeto que autoriza venda de fazendas experimentais, governo paulista sucateia 19 institutos de pesquisa, não realiza concursos e servidores têm salários congelados desde 2011

Arquivo/Governo SP

Um dos 18 institutos sucateados, o Adolfo Lutz é referência nacional em análises químicas em água e alimentos

São Paulo – Pesquisadores de 19 institutos vinculados ao governo de São Paulo fizeram hoje (18) manifesto na entrada do Instituto Butantan, no bairro de mesmo nome, na zona oeste da capital paulista. Com apitaço e faixas estendidas no meio da Avenida Vital Brasil a cada fase vermelha do semáforo, eles aproveitaram o dia estadual do pesquisador para chamar a atenção de quem passava por ali para a situação que afeta não só os servidores, mas também a sociedade.

De acordo com o presidente da Associação dos Pesquisadores Científicos do Estado de São Paulo (APqC), Joaquim Adelino de Azevedo Filho, os institutos vêm sendo negligenciados há 20 anos. “No entanto, de dez anos para cá tudo foi piorando e hoje estamos numa situação crítica jamais vista. Há cinco anos não são contratados novos pesquisadores e há cinco anos os funcionários da carreira cientifica não recebem reajuste salarial. Nos 18 institutos faltam investimentos em infraestrutura e há extinção de programas de pesquisa criados para melhorar a qualidade de vida da população.”

O Instituto Adolfo Lutz é um deles. Referência nacional em ações de vigilância sanitária, epidemiológica e ambiental, monitora agentes contaminantes em alimentos e na água, como agrotóxicos, por exemplo, e é referência nacional e internacional em diagnósticos laboratoriais da aids e de outros vírus. “Isso tudo apesar dos investimentos cada vez menores, da dificuldade para obter insumos e da falta de recursos humanos. Muitos se aposentam e não há novos concursos”, explica a pesquisadora Maria Cecília Cergole Novella.

Conforme a APqC, sem investimentos, fica prejudicado o trabalho dos pesquisadores que estudam novas vacinas, soros ou diagnósticos para novas doenças ou antigas que voltam a aparecer no estado, como a febre amarela. Tecnologias para aumentar o rendimento de lavouras de tomates e outras hortaliças sem a utilização de adubos químicos e agrotóxicos, especialmente em pequenas propriedades rurais para abastecer feiras e a merenda escolar com menor custo, também são afetadas. Sem contar estudos para a conservação do solo, da água e das florestas, entre outros.

Pelas contas da entidade, os pesquisadores acumulam perdas salariais em torno de 42%. “A última correção salarial foi feita em 2011. Houve promessa em 2013, que ainda não foi cumprida apesar de toda cobrança que vimos fazendo ao longo do tempo”, diz Joaquim.

Segundo ele, a carreira desprestigiada na maior parte dos 18 institutos oferece salário inicial inferior ao valor de bolsas pagas por agências de fomento a pesquisadores de mestrado e doutorado. No nível 1, por exemplo, o pesquisador, geralmente com doutorado, ingressa recebendo um bruto de R$ 4.500, quando as bolsas estão em torno de R$ 6.000. “Mais recentemente, o estado criou um cargo de especialista ambiental, principalmente para a área florestal, com salário inicial bruto de R$ 5.800.

Em meio à situação complicada, está para ser votado na Assembleia Legislativa o Projeto de Lei (PL) 328/2016, de autoria do Executivo, que autoriza a venda de um conjunto de 79 imóveis considerados “inservíveis” pelo governo deverão ser vendidos, entre os quais 16 abrigam fazendas experimentais voltadas ao desenvolvimento de tecnologia agrícola e pecuária voltada principalmente ao pequeno produtor. O estado espera arrecadar no total R$ 1,43 bilhão. Até agora, os pesquisadores não sabem o que vai acontecer caso o PL seja aprovado e as áreas sejam vendidas.