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‘Paridade na CUT é uma conquista das mulheres e de toda a central’

Aumento do número de mulheres nas direções da CUT mostra o quanto é positivo realizar uma política que enfrente as desigualdades

Roberto Parizotti/cut

CUT tem nova direção para gestão que segue até 2019; serão 44 nomes, pela primeira vez com paridade de gênero

São Paulo – “Mas é preciso ter força, é preciso ter raça, é preciso ter gana sempre. Quem traz no corpo a marca, Maria, Maria mistura a dor e a alegria.” Foi com a música de Milton Nascimento e Fernando Brant “Maria Maria” que as mulheres da maior central sindical da América Latina comemoraram a histórica conquista da paridade, há três anos.

O 11º Congresso da Central Única dos Trabalhadores (Concut), em 2012, com o tema “Liberdade e Autonomia se constrói com igualdade”, aprovou a obrigatoriedade estatutária de as direções da CUT nacional e em todos os estados do Brasil terem 50% de mulheres e 50% de homens, a partir do 12º Concut.

A atual conjuntura do país nos coloca o desafio de pensar ações e políticas para enfrentar a luta de classes e de ódio da elite, que não aceita que, desde 2003, um projeto democrático-popular vem governando o país, com sucesso, e, entre outros avanços sem precedentes, implementou políticas específicas e inéditas para mulheres.

Ao mesmo tempo em que a CUT coloca em prática a paridade, polêmicas no Plano Nacional de Educação (PNE) e também no documento elaborado por estados e municípios, para combater a discriminação e a desigualdade de gênero, têm provocado intenso debate. No Congresso Nacional, onde as mulheres são pouco mais de 10% dos parlamentares, bancadas conservadoras que reúnem empresários, ruralistas e religiosos não querem ouvir a palavra gênero. A maioria da população, por sua vez, desconhece a importância dessa discussão, também historicamente ignorada pela mídia tradicional.

Além de garantir o que está determinado na lei, a igualdade de gênero na educação possibilita diálogo e atividades sobre temas e conflitos no dia a dia, dentro e fora das salas de aulas, como a discriminação nos locais de trabalho.

O número de mulheres no mercado de trabalho mundial aumentou em 200 milhões na última década. O crescimento foi considerado o mais alto da história, mas, ao mesmo tempo, as mulheres ocupam as funções mais vulneráveis, segundo dados são da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

No Brasil, as desigualdades encontradas pelas mulheres no mercado de trabalho ainda são grandes: maior desemprego, menos participação e mais informalidade, salariais desiguais, segmentação ocupacional, dupla jornada e escassez de políticas que ajudem a conciliar o trabalho de reprodução social e aquele voltado ao mercado, quando as mulheres optam por ser mães e trabalhadoras.

A participação feminina no mercado de trabalho formal atingiu 43% em 2013, um aumento de apenas 1,1 ponto percentual desde 2009, quando o índice era de 41,9%. Apesar dos avanços, há muito o que ser feito. É o caso da presença feminina em postos de comando, ou seja, os empregos mais valorizados, com mais poder e mais bem remunerados continuam sendo majoritariamente masculinos. Dados do IBGE e da Fundação Getúlio Vargas apontam que apenas de 6% a 7% de mulheres chegam aos cargos mais altos de direção nas empresas. Outro dado revelador: nove em cada dez trabalhadores domésticos são mulheres.

As desigualdades de gênero historicamente têm relegado as mulheres a uma realidade de inferioridade. Mesmo sendo mais da metade da população brasileira, com maior nível da escolaridade e mais anos de estudo que os homens, ainda assim recebemos salários menores. Na média, as mulheres ganham 30% menos do que os homens para exercer a mesma função, de acordo com pesquisas.

A ONU preconiza em seu estudo “Progresso das Mulheres no Mundo 2015-2016: transformar as economias para realizar os direitos” que trabalho decente deve ser “adequadamente remunerado, exercido com condições de liberdade, igualdade e segurança, capaz de garantir uma vida digna para os trabalhadores e as trabalhadoras”.

No movimento sindical, a participação das mulheres segue os padrões da sociedade. Elas estão participando mais das direções dos sindicatos e da central.

Os 27 congressos estaduais da CUT demonstram o acerto, o quanto foi acertada a decisão de aplicar a paridade nos estados. É evidente que para alcançarmos este resultado tivemos de fazer muitas articulações e vencer fortes resistências. O novo sempre assusta e dividir poder nem sempre é aceito com muita tranquilidade, mas provamos que é possível construir a paridade em nossas direções, que é possível distribuir responsabilidades e poder entre homens e mulheres que têm o mesmo objetivo: a defesa dos direitos da classe trabalhadora.

A CUT já entrou para a história do movimento sindical como a primeira central a entender que o caminho é esse: a paridade é uma responsabilidade de toda a CUT e a composição da direção é a primeira etapa.

O machismo e o patriarcado refletem no mundo sindical. As mulheres sindicalistas estão sempre resistindo a esse círculo vicioso presente na sociedade, tanto em suas casas, superando as desigualdades nas tarefas domésticas e responsabilidades familiares, quanto no movimento sindical, no enfrentamento diário do machismo e da falta de reconhecimento do empoderamento das mulheres dos últimos anos.

Há muita luta e desafios pela frente, portanto, é preciso garantir as condições necessárias para que, de fato, a igualdade de gêneros aconteça no mundo do trabalho e em todos os espaços de representação.

O começo de tudo

A questão de gênero entrou na história dos sindicatos a partir da presença das mulheres nas direções. Em 1986, com as mobilizações das trabalhadoras e lideranças sindicais é aprovada, no 2º Concut, a criação da Comissão Nacional sobre a Questão da Mulher Trabalhadora da CUT, vinculada à Secretaria de Política Sindical. Vinte anos depois da fundação da Central, no 8º Concut, em 2003, foi criada a Secretaria Nacional sobre a Mulher Trabalhadora da CUT (SNMT).

O debate sobre a política de uma cota mínima de 30% e máxima de 70% para ambos os sexos nas instâncias de direção da CUT, em âmbitos nacional, regional e estadual, colocou em xeque a discussão do poder no movimento sindical cutista, a partir 1994. O tema dividiu opiniões de homens e mulheres, tendências políticas e sindicatos. Segundo documento da CUT, a cota vem “como medida inicial para construir relações políticas igualitárias”.

O aumento do número de mulheres nas direções da CUT mostra o quanto é positivo realizar uma política que enfrente as desigualdades e procure alavancar um processo educativo para que, paulatinamente, as oportunidades entre homens e mulheres sejam iguais e as direções sindicais representem, no mínimo, o percentual que cada um dos sexos têm nas suas categorias.

A presença das mulheres nas diferentes instâncias da CUT tem trazido uma nova dinâmica para a agenda política: mais rica e mais solidária. Mas outra afirmação também se faz necessária: as mulheres não podem deixar esfriar a luta pela igualdade neste espaço. Pois ainda temos muito caminho a percorrer nessa “jovem mulher” que é a organização das trabalhadoras. A SNMT foi uma grande vitória da classe trabalhadora e nasceu pautada na construção de políticas que reconhecem a importância da igualdade de gêneros para a consolidação da democracia e o desenvolvimento econômico com inclusão e justiça social do Brasil. Mulheres não podem deixar esfriar a luta pela igualdade neste espaço. Pois ainda temos muito caminho a percorrer nessa “jovem mulher” que é a organização das trabalhadoras.

*Mulheres da Direção Executiva Nacional da Articulação Sindical: Carmem Foro, Elizangela dos Santos Araújo, Fabiana Uehara, Junéia Martins Batista, Maria Julia Reis Nogueira, Maria das Graças Costa, Maria Godói de Faria, Rosane Bertotti.

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