Exploração

Ministério Público faz acordo com empresas fornecedoras da Renner

Bolivianos resgatados de oficina devem receber verbas salariais e rescisórias, além de danos morais, com valor de quase R$ 1 milhão. Eles serão recontratados a partir de fevereiro

Igor Ojeda/repórter brasil

Os dormitórios eram divididos por madeira e às vezes por cortinas de tecido, com falta de higiene e privacidade

São Paulo – O Ministério Público do Trabalho (MPT) em São Paulo informou hoje (2) ter firmado um termo de ajustamento de conduta (TAC) com duas fornecedoras da Lojas Renner, flagradas com 37 trabalhadores bolivianos em condições análogas à de escravidão. Pelo acordo com as empresas de confecção, serão pagas verbas rescisórias e salariais, além de danos morais para os empregados da oficina quarteirizada. Segundo o MPT, o valor chega a quase R$ 1 milhão.

Ainda conforme a TAC, as empresas – Kabriolli Indústria e Comércio de Roupas Ltda. e Indústria Têxtil Betilha Ltda. – vão readmitir os trabalhadores a partir de fevereiro do ano que vem, quando termina o pagamento do seguro-desemprego especial. Está prevista ainda uma estabilidade de seis meses. A Procuradoria afirma que o documento “não isenta a responsabilidade da Lojas Renner e nem reconhece a licitude da cadeia produtiva, tendo sido firmado apenas para a imediata proteção dos trabalhadores resgatados e desamparados”. Isso sem prejuízo de uma possível ação judicial, inclusive com eventual responsabilização da destinatária dos produtos.

O MPT entende que a Renner pratica “dumping social”, prática pela qual uma empresa obtém vantagem financeira por meio da desvalorização da mão de obra para obtenção de lucro e ao se beneficiar de trabalhadores em condições análogas às de escravo. Há um inquérito civil em curso. A empresa recebeu 30 autuações do Ministério do Trabalho e Emprego. “A Lojas Renner negou-se a reconhecer qualquer responsabilidade no caso, porém as investigações continuam para o dimensionamento de toda a sua responsabilidade”, diz o Ministério Público, em nota.

A fiscalização, realizada entre outubro e novembro, foi resultado de operação conjunta entre a Superintendência Regional do Trabalho e Emprego (SRTE) em São Paulo, o Ministério Público e a Defensoria Pública da União. Foram encontrados 37 costureiros bolivianos, incluindo uma adolescente. “A oficina é de propriedade de uma boliviana e fornecia alojamento e alimentação aos trabalhadores, cujos valores eram abatidos em seus rendimentos”, informa o MPT. “Os dormitórios eram divididos por madeira e às vezes por cortinas de tecido, com falta de higiene e privacidade, com botijões de gás empilhados e alimentos armazenados em locais impróprios.”

Havia um registro de ponto indicando jornada média de oito horas diárias, mas a fiscalização constatou que o expediente começava às 7h e ia até as 21h, “havendo semanas em que trabalhavam até 70 horas”. Também foi apurada fraude no pagamento: oficialmente, os salários eram mensais e fixos, com holerites assinados, mas na prática os trabalhadores eram pagos com base na quantidade de peças produzidas, “cuja retribuição variava de R$ 0,30 a R$ 1,80 por peça”. Ainda assim, parte dos rendimentos ficam retidos com a chefe da oficina.