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Com mais 23 readmissões, sobe para 35 número de grevistas que voltarão ao Metrô

Durante greve, em junho, 42 foram demitidos sumariamente pela empresa. Alckmin acusou trabalhadores por cometerem depredações que agora não consegue provar na Justiça

Nelson Antoine/Fotoarena/Folhapress

Lema da campanha pela readmissão dos trabalhadores está se tornando realidade após ação na Justiça do Trabalho

São Paulo – O juiz Thiago Melosi Sória, da 34ª Vara do Trabalho de São Paulo, determinou ontem (30) em liminar que o Metrô reintegre mais 23 dos 42 trabalhadores demitidos em virtude da greve da categoria, que paralisou parcialmente o sistema de 5 a 9 de junho. Com a nova decisão, sobe para 35 o número de metroviários readmitidos – dois voltaram após terem sido punido por engano e 33, por intervenção da Justiça.

Para o magistrado, não há provas de que os funcionários tenham cometido atos que justifiquem as demissões por justa causa, conforme alegara a empresa em telegramas enviados aos trabalhadores após o movimento grevista. Os metroviários devem receber comunicado da companhia informando sobre a readmissão em até cinco dias após a notificação da empresa, o que deve ocorrer ainda hoje (1º), sob pena de multa diária de R$ 500 por empregado.

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Melosi Sória considerou que tanto as imagens como os áudios das conversas entre os operadores em serviço, além dos depoimentos testemunhais prestados em inquérito policial, em 15 de julho, não servem para individualizar a conduta dos demitidos. O magistrado ainda destaca que a individualização tampouco foi comprovada pelos advogados do Metrô, que descreveram simplesmente um ato coletivo e uniforme de impedimento da circulação dos trens, sem dizer o que cada trabalhador fez.

O juiz sustenta que os depoimentos de testemunhas nos inquéritos policiais – foram abertos oito para investigar supostos ilícitos cometidos durante a greve –, embora descrevam a presença de alguns dos trabalhadores nos locais apontados pela empresa, afirmam não ter presenciado qualquer episódio de violência ou depredação. “A simples presença de uma pessoa no local em que houve a prática de um ato grave não pode ter o efeito de se fazer presumir a participação nesse ato”, ressaltou.

O magistrado também reafirmou que a companhia errou ao enviar dois telegramas aos trabalhadores: o primeiro, dizendo que estavam demitidos, e o segundo, apresentando os motivos da dispensa. “Admitir que a empregadora o completasse, a qualquer tempo, tentando convalidá-lo, retiraria a força da exigência de fundamentação, permitindo que a empresa dispensasse seus empregados sem motivo justificado e deixasse para buscar motivação posteriormente, apenas quando provocada a fazê-lo.”

Histórico

O despacho de ontem (30) retoma os argumentos apresentados pelo juiz Melosi Sória em decisão anterior, que já havia readmitido dez metroviários em 27 de agosto – e cujo teor a RBA tinha adiantado em reportagem publicada em 23 de julho com base em documentos oficiais do Metrô. Ofícios enviados pela empresa ao Ministério Público logo após a paralisação já demonstrava a inconsistência das denúncias.

A argumentação do juiz mais uma vez desconstrói o discurso do governador e candidato à reeleição Geraldo Alckmin (PSDB), para quem a greve teria sido “violenta” e os metroviários teriam “depredado” estações, impedido a circulação dos trens, invadido cabines e bloqueado a entrada de trabalhadores durante a paralisação. O Sindicato dos Metroviários sempre rechaçou as acusações, alegando que o Metrô não teria como provar nenhuma delas.

A falta de evidências é tão grande que até mesmo o juiz, mesmo após analisar imagens do circuito interno de vigilância, prevê que as demissões serão todas revertidas. “Concluo que há grande probabilidade de acolhimento, na decisão final, do pedido de declaração de nulidade das dispensas.” Ainda em junho, devido à fragilidade das demissões, o Metrô foi autuado pelos fiscais da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego (SRTE) de São Paulo por práticas antissindicais.

Um dos 23 readmitidos, Allan Rodrigues diz que ficou esperançoso depois que a Justiça publicou decisão favorável a dez companheiros, em agosto. “Fiquei bastante contente de ser readmitido, porque fui demitido por uma coisa que não fiz”, sustenta, lembrando que foi acusado de segurar portas de um trem na estação Santa Cecília, na Linha 3-Vermelha. “Não cheguei no horário que estava ocorrendo e fiquei apenas no mezanino da estação, nem encontrei o pessoal que estava lá.”

“Quando abri meu WhatsApp, tinha um monte de mensagem. Aí soube que tinha voltado”, conta o agente de estação Celso Borba, que também foi readmitido pela recente decisão. “Alckmin nos chamou de arruaceiros, mas não houve nenhuma folha de papel rasgada no Metrô durante a greve.” Celso, que foi acusado de fechar portas na estação Brás, atitude que nega, afirma ter ficado feliz com a decisão judicial. “Inclusive porque é uma vitória da categoria”, anota. “Mas ainda vamos buscar os outros sete que ainda precisam voltar ao trabalho. Ninguém fica para trás.”

Demissões

Dos 42 metroviários demitidos durante a greve da categoria, em junho, apenas sete ainda não foram reintegrados por liminar. No entanto, ainda podem conseguir de volta seus empregos quando a Justiça do trabalho apreciar o mérito das demissões. Na decisão de ontem, o juiz Thiago Melosi Sória lembrou que três deles não foram desligados do Metrô: em vez de perderem imediatamente seus empregos, como os demais, tiveram seus contratos suspensos.

Portanto, apesar de não estarem trabalhando nem recebendo salários, não poderiam ser “readmitidos” por uma liminar. A situação “especial” desses três funcionários se deve ao fato de serem dirigentes sindicais: Paulo Pasin é presidente da Federação Nacional dos Metroviários (Fenametro), Alex Fernandes é secretário-geral e Dagnaldo Pereira, diretor do Sindicato dos Metroviários de São Paulo.

“Somente podem ser dispensados por justa causa após julgamento dos processos de inquéritos judiciais. Assim, não houve ainda dispensa dos empregados cuja reintegração se pede”, anotou o magistrado. “Essa dispensa somente pode ocorrer após provimento judicial que julgue precedentes os pedidos formulados pela empregadora nos inquéritos já propostos.”

Os outros quatro trabalhadores que ainda não foram readmitidos pela Justiça acabaram excluídos da liminar porque o juiz Melosi Sória não conseguiu ver nas justificativas apresentadas pelos advogados do sindicato indícios de que as demissões foram ilegais.

Um deles é o agente de estação Bruno Bezerra, acusado pelo Metrô de “impedir a entrada do operador de trem na cabine (composição A11), interrompendo a circulação de trens”, na estação Paraíso, que interliga as linhas 1-Azul e 2-Verde, às 7h de 7 de junho. De acordo com o magistrado, uma testemunha ouvida em inquérito policial “afirmou que ele impedia o acesso à cabine de controle do trem e somente após muita conversa permitia o ingresso do operador na cabine”.

O depoimento de colegas também impediu a imediata readmissão da condutora Celina Maranhão. “As testemunhas confirmaram que a trabalhadora efetivamente impediu o fechamento da porta do trem, tentou impedir o acesso do operador à cabine e depois a invadiu, dando comandos em seu painel”, escreveu o juiz Melosi Sória, deixando a decisão final sobre sua demissão para o julgamento do mérito processual. “Embora exista aparente vício formal em sua dispensa, é necessário que se analise também a extensão da gravidade dos atos de que foi acusada, o que somente poderá ocorrer com a conclusão da instrução processual que ainda está em curso.”

Vídeos

Os agentes de estação Gabriel Amorim e Luís Fernando Salles também terão de esperar o término do processo para saber se voltarão – ou não – a trabalhar no Metrô. “O vídeo dos fatos ocorridos na estação Brás permite identificar os trabalhadores praticando conduta de impedir o fechamento das portas do trem”, determinou o magistrado, lembrando, porém, que as evidências são aparentes e que não há qualquer testemunho contra os metroviários.

“Não há prova testemunhal de que os trabalhadores efetivamente seguraram as portas do trem e o vídeo permite identificar apenas dois trabalhadores aparentemente realizando esse ato”, continua Melosi Sória. Gabriel e Luís Fernando foram acusados pelo Metrô de terem “impedido a circulação de trens” na estação Brás, na linha 3-Vermelha, às 6h do dia 6 de junho, junto com outros sete funcionários – todos inocentados pelo juiz.

A advogada do Sindicato dos Metroviários de São Paulo, Eliana Ferreira, anuncia que recorrerá da decisão que não readmitiu os quatro trabalhadores. “Ainda não tivemos acesso aos vídeos e, em dois casos, o juiz se baseou na declaração unilateral de testemunhas”, afirma. “Isso não quer dizer que eles não serão readmitidos. Ainda haverá audiências, contraprovas, mas precisamos ter acesso aos materiais para saber o que fazer.”

Dizendo-se “feliz” com as 23 readmissões, Eliana conta que vai esperar a publicação da decisão – o que deve ocorrer amanhã (2) – para decidir quais serão os próximos passos. “Estamos pensando em impetrar um mandato de segurança pedindo a reconsideração da liminar.”

Procurado, o Metrô não respondeu às perguntas da RBA.