São Paulo

Fiscalização se antecipa para evitar novos casos de trabalho escravo entre haitianos

Ministério do Trabalho na capital analisa documentos de 90 empresas que empregam migrantes caribenhos no estado. 'Queremos orientá-las para evitar problemas', dizem auditores

Avener Prado/Folhapress

Haitianos em abrigo da prefeitura no centro de São Paulo. SRTE quer evitar problemas trabalhistas

São Paulo – “A mão de obra está muito ruim por lá”, diz Vivian Benzi, 35 anos, representante de uma empresa de montagem de feiras e eventos em Ribeirão Preto (SP). “O pessoal bebe muito, não gosta de pegar no batente.” Insatisfeitos com o desempenho de funcionários, os donos do negócio estavam à procura de alternativas quando viram na TV uma reportagem sobre a Missão Paz, iniciativa da Igreja Nossa Senhora da Paz, no Glicério, centro de São Paulo, informando sobre a grande quantidade de haitianos em busca de trabalho no Brasil.

“Resolvemos experimentar”, conta Vivian. Os empresários viajaram mais de 300 quilômetros até a capital e contrataram 11 deles. Como estavam todos documentados, “graças a Deus”, foram levados para o interior e registrados em carteira. Hoje, moram em alojamentos oferecidos pelo próprio empregador, enquanto não conseguem imóvel para alugar. “Está dando certo.”

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Entre janeiro e junho, mais de cem empresas do estado de São Paulo, sobretudo da região metropolitana, fizeram o mesmo caminho dos empreendedores ribeirão-pretanos: estavam precisando de mão de obra, souberam do afluxo de migrantes haitianos em busca de emprego na capital e se deslocaram até a Missão Paz para contratá-los.

São negócios de todos os tipos e tamanhos: construção civil, alimentação, hotelaria, indústria, limpeza, escritórios, propriedades rurais, que contrataram desde 70 haitianos até um só. A procura acendeu uma luz de alerta nos ficais da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego de São Paulo (SRTE-SP), que decidiu organizar um mutirão para orientar empresários sobre direitos e deveres implícitos na contratação de estrangeiros.

“É a primeira vez que fazemos notificações preventivas conjuntas de empresas que usam mão de obra de imigrantes”, explica Renato Bignami, auditor fiscal do trabalho e coordenador do grupo de combate ao trabalho escravo da SRTE-SP. “Fizemos por causa do risco.”

Em 5 de agosto, as equipes da superintendência realizaram o primeiro resgate de haitianos vítimas de trabalho escravo em São Paulo: 12, numa oficina de costura do Brás, centro da capital. Não foram os primeiros do país. Antes, haviam sido registrados casos no Acre e Minas Gerais, por exemplo. “Vínhamos pensando em realizar esse trabalho preventivo mesmo antes do primeiro caso aqui na capital. É uma população vulnerável, como qualquer migrante econômico. Por isso, é importante termos agilidade na regularização e fornecimento de documentos.”

A ação da SRTE-SP não teve objetivo de “colocar terror” sobre os empresários. “Queremos tirar um raio X do que aconteceu naquele período em que os haitianos chegaram massivamente na cidade, alertar os empregadores de que não podem fazer o que quiserem com esses trabalhadores só porque são haitianos e mostrar que iremos fiscalizar, para evitar problemas”, pontua Bignami. “Mas não queremos que os empregadores pensem que contratar haitianos é um problema. Não queremos criar essa discriminação.”

Aproximadamente 90 empresas paulistas que usam mão de obra haitiana atenderam ao chamado dos auditores ficais e se dirigiram à SRTE ontem (11) e anteontem (10) para apresentar documentos e receber orientações. “Pedimos registro de funcionários, folhas de pagamento, controles de jornada e outros documentos sobre prevenção de riscos e segurança no trabalho”, explica Sérgio Aoki, membro da equipe de combate ao trabalho escravo. “Algumas empresas apresentaram problemas de documentação e devemos pedir-lhes novos esclarecimentos, mas, no geral, está tudo bem.”

O próximo passo, dizem os auditores, será levar orientações aos voluntários da Missão Paz, que acolhe haitianos. “É um trabalho de altruísmo sem precedentes o que eles fazem na igreja”, classifica Aoki. “Queremos ajudá-los a repassar informações mais precisas tanto aos empresários como aos migrantes.”

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