“Rio pode evitar que Olimpíadas sejam manchadas com exploração trabalhista”

São Paulo – Na semana que passou, sindicatos e organizações não governamentais reunidos na Campanha Play Fair (Jogue Limpo, em português) divulgaram relatório denunciando violações dos direitos humanos e trabalhistas […]

São Paulo – Na semana que passou, sindicatos e organizações não governamentais reunidos na Campanha Play Fair (Jogue Limpo, em português) divulgaram relatório denunciando violações dos direitos humanos e trabalhistas em fábricas que fornecerão artigos esportivos para as Olimpíadas de Londres.

O texto também faz recomendações ao Comitê Organizador dos Jogos do Rio de Janeiro, em 2016, para que os mesmos problemas — precarização, baixos salários, horas extras forçadas, restrições à liberdade sindical e condições insalubres — não voltem a acontecer.

O documento foi elaborado a partir de 175 entrevistas com trabalhadores de dez fábricas instaladas na China, Filipinas e Sri Lanka. Oito delas está produzindo para abastecer a Olimpíada de 2012 sob licença de marcas como Adidas, New Balance, The North Face, Nike e Speedo, entre outras, cujas etiquetas luzirão nos uniformes esportivos utilizados na capital inglesa a partir de 27 de julho.

Ashling Sheely, da Federação Internacional de Trabalhadores de Têxteis, Vestimentas e Couro (ITGLWF, na sigla em inglês), uma das entidades envolvidas na Campanha Play Fair, explica porque o sindicalismo internacional decidiu investigar a cadeia produtiva que abastecerá as Olimpíadas de Londres e afirma como o Brasil pode evitar que os Jogos de 2016 sejam manchados pelas violações aos direitos humanos. 

Por que vocês decidiram investigar as condições de trabalho nas fábricas que fornecerão material esportivo para os Jogos Olímpicos de Londres?

O Comitê Organizador diz que as Olimpíadas de Londres serão as mais sustentáveis da história. Por isso, quisemos investigar onde estavam sendo fabricados os produtos oficiais dos Jogos e se os direitos humanos dos trabalhadores estavam sendo respeitados.

O Comitê Organizador fez alguma coisa para evitar a prática de abusos contra os trabalhadores?

O Comitê assinou um código de condutas baseado em padrões éticos internacionais que preveem respeito à liberdade de associação, pagamento de salários mínimos e contratação formal. No entanto, Londres falhou em orientar os trabalhadores sobre seus direitos na maioria dos países. Apenas depois de nossas denúncias é que concordaram em prover essa orientação, mas só no Reino Unido e China. No Sri Lanka e Filipinas, os trabalhadores não conheciam seus próprios direitos. Assim, não poderiam exigir que fossem respeitados. O Comitê Organizador também instituiu um mecanismo para receber denúncias dos trabalhadores caso o código de conduta fosse violado. Mas não divulgaram nem traduziram o sistema. Por isso, não teve muita utilidade.

Quais os piores abusos praticados contra os trabalhadores?

As fábricas foram escolhidas ao acaso, porque não estávamos buscando exclusivamente os maus exemplos. Ainda assim, nenhuma fábrica possuía sindicatos, embora os trabalhadores tenham tentado organizar-se anteriormente. Nenhuma fábrica pagava salário mínimo. A maioria das fábricas usava trabalho precário para escapar das obrigações trabalhistas.

Como o Comitê Organizador das Olimpíadas do Rio de Janeiro, em 2016, podem evitar que os mesmos problemas aconteçam?

Uma das principais falhas do Comitê de Londres tem sido não divulgar a lista de onde estão sendo fabricados os produtos olímpicos. O Comitê do Rio deve ser transparente nas informações sobre a cadeia produtiva de seus fornecedores oficiais. Deve também superar Londres não apenas adotando um código de conduta, mas garantindo que todos os trabalhadores conheçam seus direitos e desenvolvendo um mecanismo mais robusto para monitorar as violações. As fábricas que produzem para as Olimpíadas devem pagar a todos os trabalhadores um salário mínimo e adotar uma postura receptiva aos sindicatos. Um primeiro passo para o Rio de Janeiro seria firmar acordos para que os sindicatos possam entrar nas fábricas e informar os trabalhadores sobre seus direitos, dando-lhes a possibilidade de sindicalizar-se sem que, com isso, sofram discriminação ou ameaças de demissão. 

Qual é a mensagem que a Campanha Play Fair quer transmitir com a publicação dos relatórios?

Queremos deixar claro que os ideais olímpicos de ética e respeito devem ser aplicados a todos, inclusive aos trabalhadores que fabricam os produtos oficiais dos Jogos. São os trabalhadores que fazem com que as Olimpíadas aconteçam. Logo, não podemos aceitar que trabalhem em condições degradantes. Convocamos às marcas mencionadas em nosso relatório, incluindo Adidas, Nike e New Balance, a engajar-se num diálogo social efetivo com os sindicatos para enfrentar as violações que revelamos na pesquisa.

A situação tem melhorado de uns tempos pra cá?

Produzimos relatórios sobre as condições de trabalho na cadeia produtiva das Olimpíadas de Pequim, em 2008. Estamos muito desapontados pelo fato de que, quatro anos depois, pouco tenha mudado. O Comitê Organizador do Rio de Janeiro tem a oportunidade de assegurar que os Jogos de 2016 não sejam manchados com a exploração dos trabalhadores.

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