Secretaria Nacional do Idoso vira esperança para debater desaposentação

Previdência não reconhece prática de pedir revisão do benefício por tempo trabalhado após aposentadoria, mas decisão no STF pode dar novo rumo ao debate

Cerca de 70 mil casos sobre desaposentação tramitam na Justiça; pedidos pontuais já obtiveram êxito (Foto: Antônio Cruz/Agência Brasil)

São Paulo – Prometida pelo governo federal em março, a Secretaria Nacional do Idoso virou a esperança de associações e sindicatos para levar adiante o debate sobre a desaposentação, mecanismo de revisão do valor da aposentadoria para quem retorna ao mercado de trabalho. Embora o Ministério da Previdência seja contra o conceito da desaposentação com o argumento de risco às contas do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), mais de uma vez representantes da pasta admitiram que o fator previdenciário, criado em 1998 pelo governo de Fernando Henrique Cardoso, transformou-se em um problema.

Inicialmente, o argumento era de que, com o aumento da expectativa de vida da população, seria necessário criar um novo mecanismo que equacionasse a questão, estimulando que a apresentação do processo de aposentadoria ocorresse mais tarde. A fórmula leva em conta idade, tempo de contribuição e expectativa de vida, mas teve efeito colateral indesejado: muitos trabalhadores continuaram a se aposentar na mesma idade, mas, ao receberem um benefício mais baixo, se viram forçados a continuar no mercado.

Para o presidente do Sindicato Nacional dos Trabalhadores Aposentados e Pensionistas da CUT, Epitácio Luiz Epaminondas, o Luizão, o tema tem de ser esmiuçado em debates na Secretaria do Idoso, antiga reivindicação das entidades e ainda sem data definida para ser criada. “O que o INSS faz hoje com o que recebe das pessoas que já estão aposentadas e continuam trabalhando? Então, precisa fazer um estudo com os pormenores para podermos entender como isso funciona”, disse.

O debate sobre a revisão contempla a renúncia do benefício anterior e com valor inferior, solicitando uma nova aposentadoria que contabilize as novas contribuições. Procurado, o Ministério da Previdência afirmou por meio da assessoria que não comentará questões ligadas à desaposentação porque a pasta não reconhece o mecanismo.

Antonio Santo Graff, diretor da Confederação dos Aposentados e Pensionistas do Brasil (Cobap), aposta na disposição do governo para discutir os assuntos de interesse dos aposentados na secretaria. Além da desaposentação e do fim do fator previdenciário, ele aponta a necessidade de debater uma regra para o reajuste dos benefícios acima do salário mínimo. “Com certeza é um assunto a ser debatido dentro da secretaria”, disse. O grupo técnico de trabalho formado para destrinchar os temas entre o Ministério da Previdência, Secretaria-Geral da Presidência e sindicatos dos aposentados foi reativado, e a próxima reunião será no dia 17 de maio.

Atualmente são mais de 500 mil aposentados que ainda trabalham com carteira assinada, segundo o INSS. De acordo com dados do último Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de 2010, a população com faixa etária entre 60 e 99 anos soma 11% do total (20,5 milhões) – homens idosos representam 5% e mulheres, 6%. Dez anos antes, os idosos representavam 8,6% da população (14,5 milhões). Com o aumento da expectativa de vida e a redução da taxa de natalidade, estima-se que até 2020 o percentual de idosos no país chegue a 13%.

(Fonte: Sinopse dos Resultados do Censo 2010)

Dois casos podem criar jurisprudência para cerca de 70 mil ações semelhantes na Justiça, e estão aguardando apreciação no Supremo Tribunal Federal (STF) – que reconheceu em 2011 a importância do tema e o incluiu na pauta de julgamentos deste ano. O Recurso Extraordinário (RE) 661256 chegou a ter seu julgamento iniciado em 2010, mas foi suspenso por um pedido de vista do ministro Dias Toffoli. Até o momento, o quadro tem um voto a favor da desaposentação. O INSS, que calcula impacto de R$ 2,8 bilhões por ano com todas as revisões, aguarda o resultado para aplicar em suas decisões.

Alguns casos já obtêm êxito na Justiça, independentemente da referência do Supremo. No início do mês, a Justiça Federal da Bahia determinou ao INSS a revisão do benefício de J.A.R (com a identidade protegida a pedido do próprio), auditor fiscal que se aposentou em 1991, mas voltou à ativa três anos depois ao passar em um concurso público. O caso foi “emblemático”, de acordo com a advogada que defendeu o auditor, Rafaela Carvalho. “Ele quis anular a sua aposentadoria, que vinha recebendo desde 1989, então entramos com pedido de desaposentação”, disse. A sentença era favorável desde o início, segundo ela. “A Justiça só confirmou”, disse. O INSS chegou a recorrer da decisão inicial, dada pelo Tribunal de Justiça da Bahia no ano passado. Porém, o juíz da 12ª Vara Federal no estado, Carlos Alberto Gomes, determinou a desaposentação ao auditor pelo regime próprio de previdência dos servidores federais.

As decisões judiciais são divididas, segundo Rafaela. A polêmica maior em torno do tema se deve a um fenômeno ocorrido no início dos anos 1990, quando a Previdência passou por um período de instabilidade. Temendo as mudanças repentinas dos critérios para a apresentação do pedido de aposentadoria, uma grande quantidade de trabalhadores pediu o benefício proporcional ao tempo de serviço, mas continuou trabalhando. Hoje, muitos dos que optaram pela garantia do benefício reclamam na Justiça a anulação da aposentadoria anterior. “Eles argumentam que, com o que contribuíram até hoje, já daria uma aposentadoria integral. Este caso é o mais polêmico, porque a maioria dos juízes entende que o pedido de aposentadoria proporcional foi a escolha do contribuinte”, disse a advogada. Dos casos semelhantes defendidos pelo grupo, somente 40% tiveram sucesso.

Para o advogado previdenciário Pedro Dornelles, a decisão favorável seria uma inovação não só para a aposentadoria por tempo de contribuição. “Por exemplo, se uma pessoa está aposentada por invalidez e tem contribuição, pode optar pelo melhor benefício. Seria uma vantagem para todos os segurados, preenchidos os requisitos para aquele benefício”, disse.

A medida também é estudada no Congresso com a tramitação dos projetos de lei 91, de 2010, de autoria do senador Paulo Paim (PT-RS), e 2686, de 2007, do deputado Cleber Verde (PRB-MA). Os parlamentares afirmam que, com a possibilidade de se desaposentar, o segurado amenizaria os efeitos do fator previdenciário, mecanismo criado em 1998 durante o governo Fernando Henrique Cardoso com objetivo de desestimular a aposentadoria precoce do trabalhador. O governo já admitiu que a atual fórmula do fator – que leva em conta a idade, tempo de contribuição e expectativa de vida – penaliza o contribuinte por diminuir o valor do benefício para quem se aposentou com menos idade.