Lei que regula greve do funcionalismo público pode enfraquecer movimentos, temem servidores

Projeto tramita em comissão do Senado e pretende alterar lei atual, que tem a iniciativa privada como modelo

São Paulo – A regulamentação da greve dos servidores públicos, tal como a definição dos serviços essenciais a serem prestados à população durante as paralisações, pode ser decidida em ordem terminativa na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado. O Projeto de Lei Substitutivo (PLS 83/2007), de autoria do senador Paulo Paim (PT-RS), determina que devem permanecer em funcionamento em esquema de plantão os serviços de urgência médica, necropsia e liberação de cadáveres, atividades de segurança pública e serviços de controle aéreo.

Em entrevista à Rede Brasil Atual, Paim declarou que o projeto visa definir uma legislação que garanta o direito de os servidores paralisarem os serviços, como instrumento de pressão para obter melhores condições de salário e de trabalho. “Este é o objetivo, manter o pleno direito de greve de todos os servidores públicos, mantendo os plantões”, disse. A relatora do PLS, Ana Amélia (PP-RS), suprimiu parte da proposta original que vedava a interferência do Poder Judiciário nas greves, por ser inconstitucional.

O senador rebateu críticas de que algumas regulamentações podem enfraquecer o movimento dos grevistas. Segundo ele, a única restrição apresentada no texto é de que tenham plantões de emergência, característicos dos serviços essenciais. “Não se pode fechar todo ele e mandar todo mundo embora. Digo como um sindicalista”, ressaltou. Ele defende que a manutenção dos serviços é da “consciência coletiva”, e usou a prática de uma refinaria como exemplo. “Você não pode fechar uma (instalação), caso contrário ela explode com certeza”, disse. O cumprimento das determinações, segundo Paim, não restringe o pleno direito de greve.

Em 2007, o Supremo Tribunal Federal reconheceu em unanimidade o direito de greve dos servidores em crítica direta à morosidade das decisões do Congresso sobre o tema. Atualmente, é aplicada aos casos de paralisação do funcionalismo público a lei nº 7.783 de 2009, que regulamenta as greves da iniciativa privada, determinando ao menos 30% das operações nos serviços essenciais. No entanto, a legislação própria para o serviço público foi defendida por alguns ministros, como Ricardo Lewandowski, por considerarem a necessidade da adaptação da lei de acordo com as características dos exercícios.

Cumprindo as determinações

No âmbito federal, existe impasse sobre a regulamentação. A Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal (Condsef), que se posiciona de modo ferrenho sobre a falta de vontade política na valorização dos cerca de 800 mil trabalhadores que a entidade representa, é contra a determinação dos serviços pelos parlamentares. “A regulamentação da greve para os serviços essenciais tem que ser feita pelos trabalhadores, e não pelo Estado”, defendeu Sérgio Ronaldo, diretor da confederação.

“Enquanto não for regulamentada a greve não há de se falar de restrições. Os trabalhadores que têm que decidir sobre quais serviços serão mantidos. A determinação disso não ajuda nada no debate”, enfatizou.

Teria de haver uma contrapartida “tanto para o direito da greve, tanto para a liberdade para que os trabalhadores a realizem”, segundo Ronaldo. A premissa do texto, que ainda segue a linha de cerceamento dos trabalhos prestados e do contingente em funcionamento – assim como o estipulado para a iniciativa privada -, restringiria as relações trabalhistas e inibiria o processo de negociação para alguns setores.

Os servidores da saúde estadual de São Paulo argumentam que o esquema de manutenção dos serviços essenciais já é prestado durante as greves. Benedito Augusto de Oliveira, presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Saúde no Estado de São Paulo (SindSaúde), destacou que a entidade preza pelo cuidado durante seus atos de protesto em campanha salarial. “Quando se faz greve, você tem uma escala mínima. Claro que, em um hospital, você não vai parar o serviço dos acamados”, pontuou. Para ele, a responsabilidade do servidor é de continuar um percentual de operações mesmo em mobilização, sob o risco de óbito dos pacientes.

Enfermeiros, médicos, técnicos e funcionários do Hospital das Clínicas, de São Paulo, decidiram entrar em greve por dois dias em junho ante o impasse nas negociações com o governo paulista. “O que para efetivamente são os serviços ambulatoriais, que são as consultas pré-marcadas que são pré-agendadas e são prejudicadas ao correr da greve. Ou não, porque as vezes tem gente que marca consulta e, com greve ou sem greve, o cara não é assistido”, ironizou. Eles seguem em campanha salarial, mesmo após anúncio de reajuste para a saúde paulista, em acompanhamento da reestruturação do plano de carreira.

Segundo Paula Leite, presidente da Federação dos Trabalhadores da Administração e do Serviço Público Municipal no Estado de São Paulo (Fetam/CUT), a entidade comemorou “e muito” o avanço da matéria no Congresso. “A obtenção de adesão à greve, desde que de forma pacífica, é permitida pelo projeto. Isso torna ainda nulo todo ato de repressão ou discriminação a servidor que decidir pela adesão ao movimento”, disse.

O texto proíbe também a demissão de servidores e funcionários grevistas, provocada pelo movimento em si. Quanto aos abusos dos trabalhadores em greve que porventura sejam cometidos, devem ser submetidos à legislação penal.

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