Conclat: Campanhas salariais nos anos 1970 iniciaram rearticulação sindical

Realizada há 30 anos, Conferência da Classe Trabalhadora em Praia Grande foi fruto do fortalecimento do movimento de trabalhadores, alcançado ainda durante a ditadura no país

Capa de cadernos da primeira Conclat, realizada na Praia Grande, em 1981. Mobilização de trabalhadores ocorreu sob tensão (Foto: Fundo Beatriz Bargieri/Acervo CSBH-FPA)

São Paulo – De certa forma, a história da primeira Conferência Nacional da Classe Trabalhadora (Conclat) começou em 1977, segundo relato de Hugo Perez, então presidente da Federação dos Urbanitários de São Paulo e atualmente assessor político da Força Sindical. Naquele ano, os empresários haviam realizado o Congresso Nacional das Classes Produtoras (Conclap), atiçando o movimento sindical, que já se organizava em campanhas salariais, turbinadas pela revelação de que houvera manipulação de dados oficiais da inflação de 1973. Convocado para ser orador da turma de um curso do Ministério do Trabalho perante o presidente Ernesto Geisel, o sindicalista falou sobre a necessidade de os trabalhadores também realizarem seu congresso. “Ele (Geisel) não falou uma palavra”, lembra Hugo. “E a palavra ‘congresso’ rolou por meses.”

Começaram as conversas e reuniões. Um dia, o dirigente foi chamado a comparecer ao Ministério do Trabalho, com Aluysio Simões de Campos, ex-delegado regional do Trabalho em São Paulo. “Um aristocrata, só falava com a sobrancelha arqueada”, descreve Hugo. O recado era claro, segundo ele. “O senhor vai parar com as reuniões ou eu intervenho na federação”, teria dito o representante do governo. Nada aconteceu e, alguns meses depois, estourou a primeira greve, dando início a uma longa sequência – que desembocaria na Conclat, mesmo com todas as divergências de pontos de vista.

Série reconta 30 anos de sindicalismo

A partir desta sexta-feira (19) até a próxima terça-feira (23), a Rede Brasil Atual publica uma série de reportagens sobre a Conclat e seus efeitos sobre o sindicalismo brasileiro. A história do movimento de trabalhadores ficou marcada pelo momento, seguido da criação de centrais sindicais, seu reconhecimento recente, durante o governo Lula.

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De volta ao Brasil após dez anos de exílio, José Ibrahim, ex-presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Osasco, tinha a missão de organizar a recepção às delegações estrangeiras. “Todos foram alertados que vivíamos um processo de abertura, mas ainda não estávamos em um país democrático. Havia um esquema de segurança, mas tudo correu bem. Estávamos ainda com bastante tensão, porque a parada ainda não estava decidida”, conta Ibrahim, referindo-se a ações da chamada linha dura do regime. “Eu mesmo quase fui preso de novo. Escapei porque dormi na casa da (atriz e ex-deputada) Bete Mendes, em uma reunião sobre a criação do PT”, afirma o dirigente, hoje na União Geral dos Trabalhadores (UGT).

Participaram da Conclat 11 delegações de entidades internacionais. Ibrahim lembra que portugueses e espanhóis ainda conviviam com resquícios de longas ditaduras (Salazar e Franco, respectivamente). “O pessoal me dizia: vocês ainda têm uma longa caminhada pela frente.”

Foto original: Fundação Perseu Abramo