Na USP, ato pró-Dilma destaca diferença de projetos

Segundo Marilena Chauí, José Serra não tem 'respeito pela dignidade do sagrado e pelo ecumenismo religioso'

Ato na USP reuniu grande número de estudantes, professores e funcionários em apoio à candidatura Dilma Rousseff (Foto: Alci Matos/Divulgação)

São Paulo – A diferenciação de projetos políticos e a construção de uma força suprapartidária para eleger a candidata do PT à Presidência da República, Dilma Rousseff, dominou os discursos na noite da segunda-feira (25), na capital paulista. O ato convocado por professores universitários, estudantes e intelectuais reuniu perto de 2 mil pessoas, no prédio da História e Geografia da USP, e foi marcado por sérias críticas à política educacional do governo do PSDB e à campanha eleitoral do candidato José Serra, classificada de “obscura” e “obscena”.

Primeiro a discursar, o filósofo e professor universitário Vladimir Pinheiro Safatle  alertou o público para as consequências da incapacidade de perceber as diferenças entre os projetos do PT e do PSDB para o futuro do país. “Isso indica a incapacidade de pensar sobre política”. O pesquisador criticou a aliança do PSDB no segundo turno com setores mais reacionários da igreja e da direita e avisou: “o Brasil pode esperar o pior”. “O candidato para se impulsionar fez alianças com setor mais reacionário da igreja e da direita”, detectou.

Na mesma linha, Heloísa Fernandes, filha de Florestan Fernandes, relatou que se seu pai estivesse vivo, certamente estaria na USP para marcar posição pró-Dilma. “Se vivo fosse ele estaria no meu lugar falando para vocês”, afirmou em meio a aplausos do público.

Heloísa lembrou o que cada candidato disse publicamente sobre os movimentos sociais e que suas manifestações demonstram a diferença entre projetos. Ela analisa que Dilma demonstrou respeito pela ação e pelas pautas dos movimentos sociais, enquanto Serra avalia que o movimento social não pode ter atuação política. “Se Serra vencer será sem orgulho. Dilma, se vencer, será a primeira mulher presidente do Brasil e terá muito do que se orgulhar”, citou.

Lizete Arelaro, diretora da Faculdade de Educação da USP, enfatizou a dificuldade de José Serra, ex-prefeito e ex-governador de São Paulo, em lidar com a educação e com os movimentos sociais ao lembrar da invasão do campus da universidade pela Polícia Militar em 2009. “Eu gostaria de lembrar que o primeiro ato de José Serra quando foi prefeito de São Paulo foi terceirizar creches, a cultura, esporte e saúde”.

A diretora também criticou as ações da Secretaria Estadual de Educação que distribuiu “jornalzinho” e apostilas orientando como os professores deveriam se portar em sala de aula, com indicação de frases e comportamentos. “O professor entra na sala de aula, diz bom dia e sorri”, cita a professora universitária. Para Lizete, o governo Serra foi marcado por privatizações “por dentro” do estado.

Celso Antonio Bandeira de Mello, professor de Direito da Pontificia Universidade Católica (PUC-SP) criticou o que chamou de “baixeza e campanha vil”, do PSDB. Para Mello, os veículos de comunicação da grande mídia comercial só souberam rosnar e destilar ódio, baixeza e indignidades contra Dilma.
O professor deu ênfase ao sofrimento de Dilma durante a ditadura. “Ela deu testemunho com seu sangue, sua coragem, seu amor na luta contra a ditadura.”

 

Sem luz

Gilberto Bercovici, professor da Faculdade de Direito da USP, lembrou a falta de recursos das universidades federais no governo Fernando Henrique Cardoso. “As federais não tinham dinheiro para pagar a conta de luz”, descreveu. Ele denuncia que há políticos que têm desprezo pela universidade pública, “embora posem de intelectuais”. Bercovici também criticou o “obscurantismo ressuscitado dos porões da direita brasileira”, durante a campanha eleitoral. 

Newton Lima, ex-reitor da Universidade Federal de São Carlos (UFScar) citou sua experiência à frente da UFScar, durante a gestão de FHC, quando faltavam recursos para pagar as contas e para investimentos em expansão das atividades. Lima também condenou a lei que impediu a expansão das escolas técnicas no governo tucano.

Para ele, a gestão de Fernando Henrique na educação foi marcada pela submissão ao Banco Mundial que “pedia que deixasse de investir em pesquisa e tecnologia” e privatizasse a educação.

Esforço suprapartidário

O professor e escritou Alfredo Bosi discursou em nome do suprapartidarismo e condenou a desmemória extraordinária da população. Segundo Bosi, Dilma “pagou duas vezes o preço pela causa democrática”. A primeira vez quando foi presa e torturada durante a ditadura militar e agora, pela segunda vez, quando “marqueteiros venais e a imprensa marrom do papel couché” passaram a atacá-la sistematicamente. Ele acredita que Dilma “encarna um projeto social forte e dinâmico”.

Bosi também foi enfático nas críticas quanto ao uso da religião com motivação eleitoral. “A direita está abusando da crença religiosa e convertendo em moeda de troca eleitoral. É uma prática ignóbil do sentimento sagrado”, disparou. Ele analisa que as demonstrações de conservadorismo revelam que liberais só permanecem no centro enquanto não são confrontados. No momento da disputa política, eles “derrapam para a direita”. 

O senador Eduardo Suplicy participou do ato e emocionou a plateia ao descrever o depoimento de Dilma Rousseff, em 2008, quando era ministra-chefe da Casa Civil e foi convocada pelos partidos de oposição ao governo para falar sobre possível levantamento de gastos pessoais de FHC e a ex-primeira-dama Ruth Cardoso.

Além de justificar que o levantamento era pedido do Tribunal de Contas e não ação política, Dilma atestou sua coragem, segundo Suplicy, ao ser coagida pelos deputados sobre a veracidade de seu depoimento e contar que na ditadura foi presa e torturada aos 19 anos e mentiu para que amigos não fossem mortos. Dilma afirmou que o fato ocorreu durante a ditadura e que na democracia, a verdade dos fatos deve prevalecer. “Naquela ocasião eu não falei tudo que eu sabia, porque seria a morte dos meus companheiros. Hoje estamos vivendo numa democracia e o que eu falo é a verdade”, narrou com voz embargada Suplicy sobre o depoimento de Dilma, que ela acompanhou pessoalmente.

O senador fez um forte apelo aos militantes do PT para que a reta final da campanha transcorra em paz. “Vamos criar um clima de paz e democracia pra valer”.

Integração de programas

A filósofa e professora universitária Marilena Chauí defendeu os programas sociais do governo Lula e condenou as críticas ao Bolsa-Família. “O PSDB diz que são esmolas.”

Para a filósofa, os programas sociais criaram um novo panorama em que as mulheres são protagonistas. Ao serem as titulares de programas sociais, as mulheres cuidam da família e com o que sobra trabalham em cooperativas, melhoram a situação não só de quem está à sua volta mas de toda uma comunidade, ensina. “As mulheres ocuparam um lugar na história como nunca dantes no Brasil”, afirmou.

Marilena enfatizou a conexão entre os programas do governo federal. “Há integração nas ações sociais, no plano econômico e na educação”, explica. A principal mudança implantada por Lula, ela avalia que foi a forma de ver o país e os brasileiros. “O governo mudou a direção do olhar do Brasil.”

A filósofa destacou a importância das eleições de 31 de outubro para o futuro do país e especialmente na área educacional e tecnológica. “A diferença nas áreas de ciência e tecnologia são impressionantes no governo Lula”. Mas, lamentou a posição conservadora de alguns professores da USP. “Com todas essas mudanças é espantoso conversar com os professores da USP”.

Marilena alertou o público para uma possível articulação de ações violentas para incriminar o PT nos últimos dias do pleito e comparou o caso a um novo episódio “Abílio Diniz agora”.

Na visão da professora universitária, a campanha tucana passou do deboche do primeito turno para a obscenidade do segundo turno. Ela também criticou os santinhos distribuídos pelo candidato José Serra com a imagem de Jesus Cristo associada à sua campanha. “Nenhum respeito pela dignidade do sagrado e pelo ecumenismo religioso”, disparou.

“Isso é obsceno em termos da nossa memória. Quando eu vi José Serra trazendo pela porta da frente com pompa e cerimônia a Opus Dei e a TFP (a Sociedade Brasileira de Defesa de Tradição, Família e Propriedade) que foram os dois grandes pontos da ditadura militar, isso é uma afronta, um escárnio da nossa memória”, encerrou aplaudida de pé pela plateia.

O professor Antonio Candido enviou nota em que apoia o governo Lula por manter o país nos trilhos. Dalmo Dallari não compareceu, mas em sua mensagem citou que viajando pelo país é possível ver “como a mudança no campo dos direitos humanos é gigantesca”.

Adolfo Hansen, Flávio Aguiar de Berlim, Laura de Mello e Souza tiveram suas declarações de voto lidas para a plateia.

 

Leia também

Últimas notícias