Em entrevistas à velha mídia, Palocci se diz alvo de conflito político

Ele negou haver crise no governo, ter arrecadado para campanhas eleitorais e promovido tráfico de influência. Pediu 'boa fé' à população pela dificuldade de provar algo que não fez

Palocci é acusado de conflito de interesses e suspeito de tráfico de influências a partir da informação de que aumento em 20 vezes seu patrimônio em quatro anos (Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil)

São Paulo – O ministro da Casa Civil, Antonio Palocci, concedeu as primeiras entrevistas após a revelação de seu aumento patrimonial nos últimos quatro anos. A opção foi por falar à velha mídia. Ele se disse “tranquilo e seguro” de que não praticou atos ilegais e descartou a possibilidade de o caso representar uma crise para o governo e para o país. Negou ter feito tráfico de influência e atuado junto a empresas ou negócios públicos. Disse ainda que não arrecadou recursos para campanhas eleitorais.

O impasse, desencadeado há 18 dias, foi estabelecido diante da revelação de que ele aumentou em 20 vezes o volume de seus bens enquanto manteve, durante o mandato de deputado federal por São Paulo, uma consultoria econômica, chamada Projeto. As entrevistas foram concedidas ao Jornal Nacional, da TV Globo, e à Folha de S.Paulo, nesta sexta-feira (3).

Parlamentares da oposição tentam, há quase três semanas, aprovar requerimentos de convocação do ministro para prestar informações sobre as atividades da empresa. Eles acusam conflito de interesses na condução de atividades particulares e a função pública, além de suspeitar de tráfico de influência.

A presidenta Dilma Rousseff teria, segundo informações veiculadas na imprensa, recomendado ao ministro celeridade nas explicações sobre o caso. A avaliação dentro do governo seria de que, quanto maior o tempo sem esclarecimentos, mais difícil seria superar o impasse.

Palocci reiterou informações apresentadas anteriormente em notas à imprensa. Desde a revelação, ele sustenta que a função social da empresa foi alterada antes de assumir o ministério, por recomendação da Corregedoria Geral da União. A revelação dos clientes estaria vedada, segundo ele, para não expor as empresas em um cenário de conflito político.

A respeito do aumento de arrecadação nos últimos meses de 2010, imediatamente antes de assumir a chefia da Casa Civil, Palocci também repetiu a versão anterior. Segundo ele, foram pagamentos adiantados por causa da rescisão de contratos de dois a cinco anos. O fim dos termos firmados foi necessário para a mudança de função social da consultoria. O ministro recusou-se a informar a arrecadação dos anos anteriores de atividade.

Na entrevista à Folha, Palocci disse não informado Dilma a respeito de seus clientes. “Não entrei em detalhes sobre os nomes dos clientes ou sobre os serviços prestados para cada um deles”, declarou. A íntegra será publicada apenas neste sábado (4).

Ao repórter Julio Mosquéra, do Jornal Nacional, o ministro sustentou ter mantido a empresa dentro do que rege a legislação. “Meu papel é cumprir as leis rigorosamente. Eu não teria porque nenhum cidadão tem, não estou acima da lei”, disse. “Tomei todas as providências (nesse sentido), os bens da empresa estão registrados em cartório em nome da empresa. E quando entrei no governo, entreguei todas as informações pertinentes à Comissão de Ética e à Corregedoria Geral da União.”

Sigilo e sem crise

Apesar de manter em sigilo a lista de clientes, ele declarou que a atividade realizada teve caráter público, já que a empresa foi registrada nos órgãos competentes e emitiu notas fiscais e pagou impostos como qualquer outra. “É uma atividade pública, mas os números da empresa eu gostaria de deixar reservado”, defendeu.

Para justificar essa opção, Palocci citou o episódio envolvendo a construtora WTorre. Depois de confirmar a contratação da Projeto, uma série de suspeitas foram levantadas contra a construtora, incluindo o favorecimento na restituição de tributos por meio da Receita Federal. Palocci rechaçou a hipótese de ter atuado junto ao órgão público e destacou os efeitos danosos à imagem da empresa contratante.

“Não se pode inferir a partir daí (restituição de valores pela Receita) que eu tenha atuado no caso”, condenou Palocci. “Não divulgo o nome de terceiros, que são idôneos e renomados, sou homem público, mas não tenho direito de expor essa empresa. Não posso expor contratos com empresas privadas renomadas em um contexto de conflito político.”

Ele afirmou, repetidas vezes, que não atuou junto a órgãos públicos nem em questões relacionadas a obras públicas. Entre os setores de atuação das empresas que o contrataram como consultor, estão “vários segmentos da indústria, serviços financeiros, bancos e empresas do mercado de capitais, principalmente que trabalham com investimentos e empresas de serviços em geral”.

Palocci não negou a informação apresentada pelo senador Eduardo Suplicy (PT-SP) que declarou que um dos clientes do ministro teria sido uma fusão entre grandes empresas. Esse tipo de operação envolve o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), mas ele declarou não ter se engajado nessa parte do processo. Se fosse necessária qualquer forma de interação com o poder público, disse Palocci, era necessária a contratação de outra empresa.

O uso do termo “crise” foi considerado como inadequado pelo ministro. “Não há uma crise, há uma questão em relação à minha pessoa. É uma coisa que cabe a mim, não é uma crise no país, nem do governo.” Ele vê “forte conteúdo político” na polêmica e afirmou nunca misturar outros temas de interesse do governo, especialmente em negociações com o Congresso Nacional, para se ver livre de dar explicações a respeito.

Palocci pediu “boa fé” da população brasileira para aceitar suas explicações e ser avaliado com Justiça. “É difícil provar algo que não fiz”, sugeriu. Ele citou o fato de órgãos como a Receita Federal e o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) não registrarem pendências em relação a sua empresa como fatos relevantes a respeito do caso e que corroboram sua inocência.