Mudanças no PNBL são vistas com cautela

Entidades esperam que saída de Rogério Santanna não confirme temores de que Plano Nacional de Banda Larga perderá força e o papel de democratização do acesso

São Paulo – A saída de Rogério Santanna do comando da Telebrás e a demora na decolagem do Plano Nacional de Banda Larga (PNBL) jogam incertezas sobre o projeto de universalização do acesso à internet de alta velocidade, que deveria chegar a 30 milhões de domicílios até 2014.

Apesar da previsão de conectar as primeiras cem cidades até o fim de 2010, o PNBL entra no sexto mês de 2011 sem chegar a qualquer município. A Telebrás, gestora do plano, não recebeu qualquer centavo dos R$ 1 bilhão previstos inicialmente para este ano, e ainda sofreu cortes no orçamento, dispondo agora de R$ 300 milhões para utilizar até dezembro.

Celso Schroeder, integrante da coordenação executiva do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação, tem a expectativa de que a saída de Santanna não signifique a vitória do setor privado, que ficaria responsável integralmente pela universalização do acesso à banda larga. “Estamos cautelosos de que tenha havido uma mudança efetiva, certamente em função das pressões políticas e econômicas sobre o governo. Esperamos que essas mudanças não signifiquem capitular esse sistema em torno de uma lógica de negócios.”

Ricardo Fritsch, coordenador-geral da Associação Software Livre, prefere manter a cautela até que sejam dados sinais concretos de mudança por parte do governo. Ele indica que a inclusão digital, com a chegada de banda larga de qualidade e em quantidade a todos os municípios brasileiros, segue como meta. “Como associação, nos colocamos do lado da expectativa. Defendemos o mesmo objetivo de antes, ou seja, que tenhamos PNBL.”

No setor, há dúvidas sobre se a saída de Santanna representa uma troca por um desgaste político com o ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, ou é fruto de pressão das grandes empresas de telecomunicações. O próprio ex-presidente, em conversa com jornalistas, ponderou que as duas questões existiram. “À medida que o trabalho do PNBL ia se aproximando dos interesses das empresas de telecomunicações do Brasil, a minha relação com o ministro foi se deteriorando, acho que há uma relação quase direta aí”, afirmou, segundo o portal Telesíntese.

Ambos

Os sinais dados após a saída de Santanna também indicam que os dois motivos estiveram conectados. O governo promete liberar os recursos contingenciados até aqui, ao mesmo tempo em que dá sinais de que prefere estimular o setor privado a entrar diretamente na concorrência. A fala mais explícita neste sentido foi a do novo presidente da Telebrás, Caio Bonilha, uma mudança que foi expressa inclusive nos termos empregados. “A Telebrás não pode competir com nossos clientes (os provedores de internet). Vai estimular a sua qualificação”, registrou o Teletime.

A queda de braço de Santanna teve início muito antes que ele assumisse a Telebrás. Ao lado de movimentos que lutam por democratização do acesso, ele gostaria que a estatal pudesse chegar ao consumidor final, proposta que chegou a ter força na reta final do governo Lula, mas acabou derrubada por pressão das teles. Por fim, ficou acertado que a empresa trabalharia no varejo apenas nos municípios em que não houvesse qualquer interesse privado. O governo passou, então, a estimular pequenos provedores.

Agora, as grandes empresas, em especial a Oi, têm se oferecido para fazer a conexão final em troca de incentivos fiscais e tributários. Paulo Bernardo indica que o governo se dará por satisfeito com o oferecimento de uma conexão de um megabite por segundo (1 mbps) a R$ 35 mensais. Para isso, aposta que os estados abrirão mão de arrecadação do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).

Corre risco de não se resolver, com isso, um dos motivos-chave para a existência do PNBL. Mesmo nas grandes cidades, a concorrência é pouca, o que afeta a qualidade do serviço. Fritsch lamenta que as telecomunicações brasileiras tenham se desenhado de uma maneira desigual e de serviço insuficiente, e avalia que isso criou diferenças grandes entre os que têm acesso a estes direitos e os que não têm. “Por exemplo, em termos de serviços de governo eletrônico que possam chegar a cidadãos. Alguns podem fazer seus serviços pela rede, outros precisam se deslocar até uma instituição pública, muitas vezes ir até outra cidade.”

Schroeder acrescenta que o governo não deve recuar na ideia de que a banda larga se insere dentro de uma série de medidas que visam à democratização da comunicação, importantes para a educação e a inclusão social. “Precisamos definições de Estado para que a partir disso a sociedade possa se mover em torno delas. Não se pode apresentar e recuar o tempo todo. Precisamos um debate de fundo sobre esses temas.”

Plano de metas

A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) enfim aprovou o 3º Plano Geral de Metas de Universalização (PGMU), estabelecido pela primeira vez quando da privatização do setor, durante o governo Fernando Henrique Cardoso.

A discussão foi feita sob grande pressão das teles, que não querem aceitar o estabelecimento de metas audaciosas para o atendimento da população pelos serviços de telefonia fixa, pública e privada, e móvel. 

O ministro das Comunicações informou que os detalhes serão fornecidos nos próximos dias. Por ora, Bernardo adiantou que deve haver licitação para as faixas de frequência que poderão oferecer telefone e internet à área rural. Estuda-se também realizar a licitação das faixas destinadas à quarta geração da telefonia celular.