Cresce número de cidades com planos de metas, mas implementação enfrenta resistências

Em cidades em que não há planos de metas ou eles não funcionam, sociedade civil organizada monitora as ações de prefeituras

Resistência a programa de metas é resultado da falta de cultura de planejamento público, dizem especialistas (Foto: Sxc.hu)

São Paulo – Nos últimos três anos, 16 cidades brasileiras adotaram leis que exigem de seus prefeitos a apresentação de um programa de metas para a gestão. Os chefes do poder Executivo têm, em geral, 90 dias, após a posse, para apresentar metas de governo. Apesar de representar um avanço na transparência das contas públicas, a iniciativa enfrenta resistência nas prefeituras.

A ideia, no curto prazo, é que os políticos transformem as promessas apresentadas durante a campanha eleitoral em metas, com prazos para colocar em prática. “O Executivo vai ter 90 dias para transformar promessas em metas e metas em compromissos com o desenvolvimento sustentável, combate à miséria, à desigualdade social, preservação ambiental…”, explica Oded Grajew, integrante da Rede Nossa São Paulo, uma das principais defensoras dos planos de meta.

Em uma perspectiva de mais longo prazo, além de obrigar o Executivo a planejar melhor a gestão pública e trabalhar com transparência, o mecanismo também deve mudar a mentalidade dos políticos durante a campanha eleitoral. “Proponho fazer um registro das promessas dos candidatos bairro por bairro para depois comparar com o plano de metas”, sugeriu o padre Ticão, pároco de uma Igreja da zona leste de São Paulo, durante balanço do plano de metas de São Paulo. 

São Paulo foi a primeira cidade brasileira a aplicar o conceito inspirado na cidade de Bogotá, capital da Colômbia. A exigência de um plano de metas para o chefe do Executivo da capital paulista foi aprovado em fevereiro de 2008, com uma emenda à Lei Orgânica do município. O prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab (ex-DEM) assumiu o cargo em 2009 com essa incumbência.

Apesar de ter apresentado o plano, ele não se mostra muito preocupado com sua execução. O balanço do segundo ano do plano de metas, apresentado na quarta-feira (6) mostrou que apenas 10,7% das metas apresentadas em 2009 pelo prefeito foram cumpridas. O prefeito, convidado para o balanço que ocorreu na quarta-feira (6), não compareceu à atividade, nem enviou representantes da prefeitura paulistana.

Além da capital paulista, Capivari, Mirassol, Barra Bonita, Taubaté, Penápolis, Araraquara, Ribeirão Bonito, Ilhabela e Itapeva, todas no estado de São Paulo, aderiram à exigência de um plano de metas para as prefeituras.

No estado do Rio de Janeiro, Teresópolis e Niterói adotaram planos de metas. Na cidade do Rio, um projeto tramita na Câmara dos Vereadores. O prefeito Eduardo Paes (PMDB), mesmo sem a obrigatoriedade, apresentou uma plano estratégico e realizou duas prestações de contas. Na Bahia, Eunápolis e Ilhéus adotaram e em Minas Gerais,  Formiga e Ouro Branco. 

Sem a mínima ideia

Apesar de estarem em vigor em várias cidades, os planos de metas enfrentam a resistência dos gestores e a falta de cultura de planejamento público, apontam especialistas ouvidos pela Rede Brasil Atual.

Para o diretor executivo do Instituto Ilhabela Sustentável, Carlos Nunes, “as prefeituras não têm a mínima ideia do que é um plano de metas e não estão preparadas”. Mesmo com dificuldades, ele sustenta que os planos de metas são essenciais e deveriam ser estendidos para todas as cidades. “O plano de metas deveria abranger todo o Brasil”, aponta.

Em Ilhabela, litoral norte de São Paulo, a lei de metas foi aprovada em 2008 e no ano seguinte, o prefeito Toninho Colucci (PPS), ao assumir o mandato, pediu mais tempo para se preparar. “Esse governo disse ‘não estou preparado mas me comprometo a fazer em 180 dias’”, descreve Nunes.

O Legislativo tentou manter a imposição dos 90 dias e o prefeito entrou na Justiça para barrar a lei. Ao final, com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin), o prefeito conseguiu derrubar a lei de plano de metas. Em junho de 2010, mesmo sem a obrigatoriedade, o prefeito apresentou um esboço de plano de metas.

Um dos problemas na elaboração dos programas de metas, segundo Nunes, é a falta de preparo dos gestores públicos para entender a diferença entre meta e indicadores. “Meta tem de ter número para quantificar quanto atingiu e não atingiu”, explica. Agora, o instituto trabalha para que uma nova lei possa ser aprovada e a lei das metas seja restabelecida.

Em Ribeirão Bonito (SP), município a 260 quilômetros da capital, a cidade já sofreu com a cassação de dois prefeitos e quatro vereadores. O projeto que cria a lei de metas foi aprovado em meados de 2008 e em março de 2009, o prefeito Paulo Veiga (PPS) apresentou um plano de metas para a cidade.

Uma análise mais apurada de especialistas da ONG Amigos Associados de Ribeirão Bonito (Amarribo) detectou que o documento da prefeitura não continha exatamente um plano de metas. Desde abril de 2009, o plano passa por um processo de reformulação. Segundo a prefeitura, será criado um grupo multisetorial para acompanhamento do plano de metas.

Mudança

Participação popular reduz fraudesPara Grajew, da Rede Nossa São Paulo, há gestores que têm dificuldade de compreender o funcionamento do plano de metas, por se tratar de elementos que não fazem parte da cultura de gestão pública no Brasil. Mas há gestores que apenas não querem se comprometer. “Ele sabe que aquela promessa é só de campanha”, cita. Independentemente do motivo, ele acredita que o quadro vai mudar. “Os prefeitos vão ter de reaprender, mudar e se comprometer com a lei de metas”, aponta.

Na análise de Nunes, do Instituto Ilhabela Sustentável os planos de metas abrem “uma nova era” na administração pública. “O prefeito é como um presidente de empresa que tem contrato temporário. Depois de quatro anos ele deixa a empresa e ela tem de continuar”, exemplifica. “O administrador público é temporário, mas a cidade e os recursos são nossos.” Ele questiona se, numa empresa familiar, a direção seria dada a qualquer um. “Por que daríamos a cidade para qualquer um então?”, provoca.

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