Para pesquisador, impacto urbano de mudança no Código Florestal é subestimado

São Paulo – A ineficiência das políticas públicas de ocupação do solo será fortemente agravada caso o Congresso aprove mudanças no Código Florestal. Márcio Ackermann, geógrafo e técnico agrícola, avalia […]

São Paulo – A ineficiência das políticas públicas de ocupação do solo será fortemente agravada caso o Congresso aprove mudanças no Código Florestal. Márcio Ackermann, geógrafo e técnico agrícola, avalia que o impacto das alterações no meio urbano vem sendo subestimado nas discussões em curso na Câmara.

O próprio relator do substituto ao Projeto de Lei 1.876, de 1999, o deputado federal Aldo Rebelo (PCdoB-SP), parece desconhecer que seu texto mexe com a vida nas cidades. Em entrevista recente ao jornal Folha de S. Paulo, o parlamentar afirmou que seus assessores lhe asseguraram que não haverá qualquer alteração nessa questão.

A realidade é bem diferente. O projeto tão ansiado pela bancada de representantes do agronegócio permite a ocupação de encostas de morros com inclinação de até 45 graus, o que na prática avaliza a existência de riscos de deslizamento. Outra alteração importante diz respeito à redução da preservação de mata ciliar, que é a vegetação de margens de rios. O corte pela metade da área de mata é visto como um risco de aumento de erosão e de inundações.

Ackermann considera que tragédias como a ocorrida este ano no Rio de Janeiro podem ser registradas com mais frequência caso o Congresso aprove o PL 1.876. “A bancada ruralista não está preocupada em aperfeiçoar o Código Florestal. Querem eliminar restrições”, avalia o autor do livro A Cidade e o Código Florestal, que será lançado neste sábado (12) na capital paulista.

A obra é fruto do trabalho desenvolvido no Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) e mostra a falta de políticas públicas que levem a sério o problema da ocupação de lugares protegidos. Ao longo de sua pesquisa, Ackermann percorreu várias Áreas de Preservação Permanente (APPs) do estado de São Paulo com ocupação humana.

De acordo com o atual Código Florestal, APPs são todas as áreas protegidas por ter função de preservação de recursos hídricos, paisagem, estabilidade geológica, biodiversidade e proteção do bem-estar da população. A ocupação delas é regida por resolução de 2006 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), que pode autorizar exceções sempre que se configure interesse público ou social – há uma série de situações previstas pelo Conama.

O problema é que a ocupação urbana ignorou a existência da maior parte das APPs. A pesquisa de Ackermann mostra que metade dos moradores de favelas da cidade de São Paulo está em áreas de preservação. “Caso se deixe a questão apenas com os setores ecológicos, acaba-se alienando o papel do homem como parte da natureza. No entanto, quem ocupa a margem de uma represa, por exemplo, não foi até lá porque quis, é tão vítima quanto a vegetação degradada”, avalia.

Além disso, as APPs urbanas não estão ocupadas apenas por segmentos mais pobres. Parte da região da Avenida Paulista, um dos pontos mais caros do país, é uma APP de topo de morro, importante para a infiltração de água. O resultado da ocupação irregular é que a chuva que cai por ali não é devidamente drenada, aumentando a possibilidade de inundação em bairros mais baixos. 

Ackermann não defende, evidentemente, que áreas como a da Paulista sejam desocupadas, mas que a tecnologia seja utilizada para resgatar a função inicial da APP. Ele entende que é perfeitamente possível promover a convivência de ocupação urbana e preservação. Seria preciso, nesse caso, que cada município fizesse um levantamento das áreas de preservação existentes e qual o estágio atual de cada uma. “Se tem um mapeamento das APPs, atualizando constantemente, já que a dinâmica urbana é muito acelerada, pode-se priorizar as adequações necessárias, como por onde começar programas habitacionais.”

Em um caso como o da Paulista, seria possível pensar em obrigar os edifícios a construir uma caixa de retenção pluvial, que funcionaria como um grande reservatório que seria liberado gradativamente após o fim da chuva. “Vai amenizar os efeitos das enchentes sem precisar gastar bilhões em piscinão. Isso pode ser associado com a questão tributária: ou a edificação faz as alterações necessárias ou tem um acréscimo de imposto.”

Lançamento de A cidade e o Código Florestal

Autor: Márcio Ackermann
Editora: Plêiade
Data: sábado (12), das 15h30 às 18h30
Local: Livraria Martins Fontes – Avenida Paulista, 509. São Paulo
Informações: 2167-9900

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