ERA DIGITAL

‘Big Techs’ ajudam a aumentar a desigualdade no mundo

“Assistimos uma tendência de transformar, cada vez mais, trabalhadores em prestadores de serviço, em uma relação de trabalho frágil e permanentemente instável”, aponta dossiê sobre avanço tecnológico e capitalismo

DIVULGAÇÃO
DIVULGAÇÃO
De acordo com o estudo, o principal desafio para os movimentos, organizações populares é superar as narrativas ideológicas hegemônicas da economia de dados

São Paulo – O Instituto Tricontinental de Pesquisa Social lançou, na última quarta-feira (3), o dossiê Big Techs e os desafios atuais para a luta de classes, trazendo uma reflexão, entre outros temas, sobre a desigualdade no direito ao acesso à internet somado à dinâmica do capitalismo. O documento também expõe a preocupação permanente com o uso de dados para fins de repressão, controle e vigilância.

As Big Techs citadas no estudos são as grandes companhias de tecnologia, como Google, Apple, Facebook, Amazon e Microsoft. O estudo alerta sobre o fato de as maiores corporações da atualidade serem do ramo da tecnologia, tornando o tema essencial para compreender as dinâmicas do capitalismo nos dias de hoje.

O documento anda analisa estas transformações no capitalismo recente e suas implicações para a organização das lutas populares, para além das questões de segurança digital ou da disputa das narrativas nas redes sociais, refletindo sobre diferentes perspectivas com o objetivo de formular a construção de um entendimento comum sobre esta temática.

Luta de classes na era digital

De acordo com o estudo, é preciso analisar a economia de dados como um componente central do capitalismo contemporâneo, que busca consolidar critérios básicos para sua expansão.

O dossiê aponta que o livre mercado de dados, a financeirização econômica, a transformação de direitos em mercadorias, a redução dos espaços públicos e a concentração de recursos são marcos do sistema capitalista que refletem no setor tecnológico, ampliando ainda mais as desigualdades.

“Não podemos nos dar ao luxo de sermos tecnofóbicos, de negar a importância das tecnologias e seus potenciais para a luta. Ao mesmo tempo, não podemos acreditar que a tecnologia em si resultará em avanços para a classe trabalhadora organizada. O desenvolvimento tecnológico não acontece de forma autônoma da organização social na qual está inserida. O componente da luta de classes é a baliza para nossa apropriação dos conhecimentos científicos e para a construção de alternativas tecnológicas viáveis”, diz o texto.

A combinação da economia de dados e financeirização também tem transformado o mundo do trabalho, de acordo com o estudo, que chama a atenção para a “uberização” do emprego, traduzida em trabalhos precarizados. “Assistimos uma tendência de transformar, cada vez mais, trabalhadores em prestadores de serviço, em uma relação de trabalho frágil e permanentemente instável”, afirma o dossiê.

“Assistimos a um aprofundamento do processo neoliberal de globalização que descentralizou a produção por meio de filiais e terceirizações, com a finalidade de tornar menos localizáveis as formas de controle e gerenciamento do trabalho. Aos poucos, empresas internacionais oligopolizadas tomam conta do trabalho informal, organizando, regulando e definindo o que é trabalho”, pontua a análise.

‘Self-made man’

O estudo do Instituto Tricontinental aponta que ascensão das Big Techs é acompanhada de uma “grande ofensiva ideológica”, baseada no individualismo, no discurso empreendedor e na negação da política. Um dos mitos criticados é o do empreendedorismo, que preconiza o sucesso apenas como resultado do esforço e competência individuais.

“Sob esta ideologia do ‘empreendedor digital’ não é explicado seus vínculos com os capitais financeiros e especulativos, que investem milhões na criação e expansão dessas empresas. Vende-se a imagem de que os indivíduos começaram ‘do nada’, e não relatam o fato de que já possuíam financiamentos milionários que, em última instância, resultaram na apropriação privada de conhecimentos e tecnologias públicas construídas coletivamente e com muitos recursos públicos. Os US$ 500 mil que Zuckerberg conseguiu para começar o Facebook foram possíveis apenas pelas conexões com a elite do capital financeiro e especulativo”, aponta a análise.

Ainda segundo o dossiê, embora modernas no âmbito da sofisticação e escala das tecnologias empregadas, as Big Techs representam “o atraso civilizatório no que tange à flexibilização do trabalho e redução de direitos, a ofensiva avassaladora sobre recursos naturais, a centralização e concentração de capitais e o poder das corporações privadas acima dos espaços públicos, além de outros processos que caracterizam as soluções capitalistas para suas crises”.


Leia também


Últimas notícias