Terra em Transe

Bolsonaro inaugura aeroporto Glauber Rocha sem citar o nome do homenageado

Sem a presença do governador e da filha de Glauber, homenageado no evento, Bolsonaro ignorou o principal nome do Cinema Novo, mas atacou ambientalistas, comunistas e socialistas

Reprodução
Reprodução
Cena de "Deus e o Diabo na Terra do Sol", uma das obras-primas de Glauber: um homenageado não citado

São Paulo – Glauber Rocha, certamente o mais conhecido cineasta brasileiro, acaba de ser homenageado ao dar nome do aeroporto de Vitória da Conquista, no interior baiano, onde nasceu 80 anos atrás, em 14 de março de 1939. A inauguração da obra, nesta terça-feira (23), foi cercada de polêmica, depois que Jair Bolsonaro fez declarações ofensivas aos nordestinos na semana passada, que tentou consertar hoje, afirmando “amar” a região e que o país é unido. Mas em seu breve discurso, de pouco mais de 6 minutos, não fez sequer uma referência a Glauber, que ganhou a homenagem. Paloma Rocha, filha do cineasta, decidiu não ir ao evento, assim como o governador da Bahia, Rui Costa (PT), e o presidente da Assembleia Legislativa, Nelson Leal (PP).

Na semana passada, ainda antes da declaração sobre os “paraíbas”, um termo pejorativo para se referir aos nordestinos, Paloma Rocha escreveu em rede social e protestou contra o governo. “Quero esclarecer que repudio o ato do Presidente Bolsonaro, pois considero um oportunismo político com o uso indevido do nome de meu pai e mais um golpe contra a cultura e o cinema brasileiro que se encontra ameaçado pela censura e pela extinção da Ancine . Esta obra foi idealizada no governo Lula e realizada pelo atual Governo do Estado da Bahia”, afirmou.

A frase infeliz do presidente provocou onda de repúdio pela região, fazendo o próprio governador cancelar sua ida ao evento de inauguração do aeroporto. Costa também comentou uma queixa de Bolsonaro sobre ausência da Polícia Militar no local, afirmando que o Exército havia fechado o aeroporto. “Ele não vai pôr os pés na rua, pra quê ele quer PM lá dentro?”, afirmou à rádio BandNews FM, sobre o que considerou mais um “factoide” do presidente. “Se a pessoa está com tamanho receio, porque está com alta taxa de reprovação, fique em seu gabinete. Está bloqueada a passagem pelo Exército. A PM ia escoltar ele do avião até o terminal de passageiros?”

No evento, Bolsonaro disse que “ama o Nordeste” e colocou um chapéu de vaqueiro na cabeça. Afirmou que não estava em Vitória da Conquista, na Bahia ou no Nordeste, mas no Brasil, e que não havia “distinção entre nós”. Lamentou a ausência do governador e declarou que a obra era custeada “com dinheiro do povo brasileiro”, sem referência aos governos anteriores. Também apresentou para enaltecer o ex-governador Antônio Carlos Magalhães e afirmar que o atual prefeito de Salvador, ACM neto, poderá ocupar mais adiante “a honrosa cadeira” da Presidência da República.

Pessoas conhecidas

Ao reafirmar sua intenção de transformar Angra dos Reis em uma “Cancún”, Bolsonaro criticou os “xiitas ambientalistas” e atacou organizações não-governamentais. Disse não ter preconceito, mas “profunda repulsa por quem não é brasileiro”. Sobrou tempo para falar que não discrimina partidos, embora repudie “o socialismo e o comunismo”.

Um dos principais representantes do movimento conhecido como Cinema Novo, o diretor de filmes como Deus e o Diabo na Terra do Sol, O Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro, Terra em Transe e Idade da Terra morreu em agosto de 1981, aos 42 anos, de infecção generalizada. Em 2014, a Comissão Estadual da Verdade do Rio de Janeiro divulgou documentos das Forças Armadas que mostravam espionagem contra Glauber e outros, apontando indícios de que haveria intenção de assassinar o cineasta.

Outro baiano famoso quase passou ignorado pelo atual presidente da República. No último dia 6, quando morreu João Gilberto, a pedidos Bolsonaro disse lamentar a perda, dizendo que se tratava de “uma pessoa conhecida”, referindo-se a um dos “pais” da Bossa Nova.

Leia também

Últimas notícias