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Deltan deu palestra remunerada para empresa investigada na Lava Jato

Em 2016, procurador recebeu R$ 33 mil por uma palestra em resort de luxo no evento de empresa de informática delatada por um lobista na Lava Jato, além de intermediar a compra de seus softwares pelo Ministério Público

Arquivo EBC
Arquivo EBC
Deltan Dallagnol afirma não saber de denúncia contra empresa de informática por corrupção e aceita ser contratado para palestra, além de intermediar compra de softwares pelo Ministério Público

São Paulo – Nova reportagem da série Vaza Jato – publicada pelo The Intercept Brasil, em parceria com outros veículos de imprensa – mostra que o procurador Deltan Dallagnol foi pago para dar palestra a uma empresa investigada por corrupção pela Lava Jato, operação em que ele comanda a força-tarefa do Ministério Público Federal em Curitiba. Dallagnol recebeu R$ 33 mil da Neoway, uma companhia de tecnologia, quando ela já estava citada numa delação premiada de 2017 que acusava Cândido Vaccarezza, ex-líder de governos petistas na Câmara, de envolvimento em negociatas envolvendo a BR Distribuidora. Vaccarezza deixou o partido depois de não conseguir se reeleger em 2014.

Deltan também aproximou a Neoway, que vende softwares de análise de dados, de outros procuradores. A intenção era comprar produtos da empresa, mesmo estando ela em um processo por corrupção, para uso da Lava Jato. Ele chegou a gravar um vídeo para a empresa, enaltecendo o uso de produtos de tecnologia em investigações.

Um entusiasmado Deltan anunciou aos outros procuradores, em 5 de março de 2018, que havia sido contratado para fazer a

reprodução

Recibo dado a Deltan Dallagnol por palestra ministrada na Neoway, empresa que denunciada por corrupção e ele investigava no âmbito da Lava JAto

palestra para a Neoway e comemorou enviando uma mensagem no grupo Incendiários ROJ. O coordenador da força-tarefa aproveita para já fazer publicidade da empresa e cita seu dono, Jaime de Paula – que também é citado na delação. “Olhem que legal. Sexta vou dar palestra para a Neoway, do Jaime de Paula. Vejam a história dele: https://endeavor.org.br/empreendedores-endeavor/jaime-de-paula/. A neoway é empresa de soluções de big data que atende 500 grandes empresas, incluindo grandes bancos etc.”

O procurador da República Júlio Noronha, também integrante da Lava Jato, então sugeriu que Deltan buscasse marcar uma reunião com o dono da Neoway para tratar de produtos para um projeto da Procuradoria chamado de Laboratório de Investigação Anticorrupção, o LInA. “Top Delta!!! De repente, se conseguir um espaço para conversarmos com ele e tentarmos algo para trazer uma solução para agregar ao LInA, seria massa tb!”, disse Noronha.

Deltan concordou e afirmou que iria procurar agradar o empresário. “Exatamente. Isso em que estava no meu plano. Vou até citar ele na palestra pra ver se sensibilizo kkkk”.

‘Contato bom’

A palestra foi realizada quatro dias depois. Deltan deu sua versão do que seria combater a corrupção num evento chamado Data Driven Business, realizado no Costão do Santinho, um badalado – e caro – resort em Florianópolis. A estratégia traçada por ele funcionou: no fim daquela mesma noite, ele procurou os colegas noutro grupo, chamado LInA – Coordenação, para marcar a reunião com os representantes da empresa. “Caros podem receber a Neoway de bigdata na segunda para apresentar os produtos???? Ou quarta?”

O procurador afirmou que a companhia cogitava fornecer produtos gratuitamente. “Como fiz um contato bom aqui valeria estar junto. Eles estão considerando fazer de graça. O MP-MG está contratando com inexigibilidade.”

The Intercept/Reprodução

Trecho da conversa em que Deltan Dallagnol admite conduta antiética

Foi só quatro meses após ter vendido sua palestra para a Neoway – e já em meio às negociações para a aquisição de produtos da empresa – que Deltan abriu o Telegram e disse aos procuradores que havia descoberto a citação à empresa na colaboração premiada do lobista Jorge Luz apenas naquele momento. “Isso é um pepino pra mim”, afirmou, então. Era 21 de julho de 2018.

Ainda assim, o procurador só escreveu à corregedoria do Ministério Público Federal para prestar “informações sobre declaração de suspeição por motivo de foro íntimo” quase um ano depois, quando o processo foi desmembrado no STF e uma parte foi remetida à Lava Jato de Curitiba.

Mas a Neoway já havia aparecido em documentos oficiais em duas ocasiões. A primeira vez foi no rascunho da proposta de delação de Luz, cujo documento foi criado em março de 2016, de acordo com os metadados. A segunda noutro documento, criado em abril de 2017, que continha novos depoimentos do lobista. Ambos foram enviados ao grupo de Telegram do qual Dallagnol fazia parte.

Além disso, convenientemente o procurador deixou de mencionar ao corregedor que nos grupos de Telegram, que não eram uma ferramenta oficial do MPF, ela apareceu pela primeira vez em 22 de março de 2016 – ou seja, quase dois anos antes da palestra.


Leia a reportagem completa no The Intercept Brasil

 

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