Política

Debate deve servir para educação política, não como programa de auditório

Começou a safra de debates políticos na televisão. Serão 12 ao todo, seis entre os presidenciáveis e outros seis entre os candidatos aos governos estaduais. Para o jogo democrático saudável, […]

Começou a safra de debates políticos na televisão. Serão 12 ao todo, seis entre os presidenciáveis e outros seis entre os candidatos aos governos estaduais. Para o jogo democrático saudável, é pouco ou muito? Depende de como se olha a questão.

Para o bem da democracia quanto mais debates melhor. Pena que eles só ocorram às vésperas das eleições. Deveriam estar na telas todos os dias, sem muitas regras e amarras, dando voz às diferentes visões de mundo. Assim se cultiva a formação política da sociedade dando aos seus integrantes a possibilidade de decidir por conta própria.

Como esse tipo de debate altamente controlado só ocorre a cada quatro anos, o resultado é tímido. Na maioria dos casos, candidatos folclóricos ganham mais destaque do que aqueles com algo de sério a dizer. O debate, nesses casos, produz um desserviço à democracia.

O resultado são piadas disseminadas através das redes sociais ou, o que é pior, vídeos criando situações falsas de perguntas e repostas para prejudicar um ou outro candidato. Ao que se soma a criminalização da política, prática habitual da mídia. A consequência é o descrédito com as eleições revelado pelos altos índices de abstenções e de votos brancos e nulos. Para não falar nos votos em Cacareco ou Tiririca.

Neste ano, a situação piorou. Sem a presença de Lula, líder em todas as pesquisas de opinião, exclui-se do público a possibilidade de entrar em contato com a defesa de experiências concretas, vividas por ele em oito anos de mandato. E também das criticas que forçosamente viriam dos seus adversários. Ai o jogo se tornaria um pouco mais emocionante.

Em eleições mais remotas, sem tantas regras, viam-se debates acalorados, com o público podendo avaliar também as condições emocionais dos candidatos quando colocados em situações difíceis. Ficou famoso o bate-boca entre Franco Montoro e Reynaldo de Barros, candidatos ao governo de São Paulo em 1982.

E a indignação de Leonel Brizola aos ataques de Paulo Maluf, interrompendo-o repetidamente com a expressão “filhote da ditadura”, na disputa presidencial de 1989. Naquela época, os microfones ficavam abertos para todos os candidatos o tempo todo, os ânimos se exaltavam e o debate esquentava.

Ao mediador ou mediadora só restava pedir calma.

Claro que as discussões acaloradas tiravam o foco do conteúdo das falas. Algum tipo de contenção era necessária. Mas o engessamento atual também não ajuda. Cada candidato fala o que quer no tempo reduzido que tem. A maioria faz perguntas aos adversários apenas para na réplica ou na tréplica dizer o lhe interessa.

Os debates hoje servem mais para fornecer pautas aos jornais dos dias seguintes, estimular provocações nas redes sociais e fornecer material para ser usado nos horários de propaganda eleitoral no rádio e na TV. Candidatos exibirão trechos que considerem bons nos debates e mostrarão gafes ou incoerências dos seus adversários.

Uma reforma política de verdade incluiria a questão dos debates, com uma reformulação geral do modelo atual. A começar pelos contratos de concessão dos canais de TV, dos quais deveria constar a realização frequente de programas de debates políticos, fora do período eleitoral.

Aos partidos caberia enviar seus representantes para apresentar criticas e propostas. Seria um serviço pedagógico de fortalecimento da cidadania.

Os debates deveriam ser pensados como fatores de educação política e não como programas televisivos em busca de audiência. Para isso uma primeira providência seria a mudança de horário.

Um debate que começa no fim da noite e entra pela madrugada exclui parcela considerável da população necessitada de acordar cedo no dia seguinte. Política é coisa séria, merece o chamado horário nobre.

Desde 2014 insisto que os debates não podem continuar sendo filtrados pelos interesses da mídia comercial. Deveriam ser produzidos e realizados por emissoras públicas, a partir do momento em que elas voltassem a existir no Brasil.

E realizados em espaços públicos, num campus universitário por exemplo, como ocorre nos Estados Unidos. Ou em um grande ginásio de esportes, com a presença de público, como foi o caso do debate sobre a saída ou não do Reino Unido da União Européia promovido pela BBC em Wembley, há dois anos.

São medidas necessárias para que os debates deixem de ser meros programas televisivos, assemelhados aos de variedades, e se tornem serviços públicos eficientes. Infelizmente ainda estamos longe disso.

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