Bactéria causadora da meningite está mais resistente a antibióticos

Enquanto a mídia fala apenas sobre a Gripe A, doença faz vítimas em todo o mundo e também em várias regiões brasileiras

(Foto: Reuters/Chaiwat Subprasom)

Neisseria meningitidis. Esse é o nome da bactéria responsável pela maior parte dos casos de meningite que só no primeiro semestre deste ano já tinha matado mais de duas mil pessoas e infectado outras 56 mil apenas na África. Longe dos holofotes da mídia voltados para a Gripe A, o governo da Etiópia contabilizou 147 casos da doença que matou pelo menos 20 etíopes entre os dias 17 e 21 de julho. Esse microorganismo e suas variantes fazem vítimas também em favelas indianas, prisões do Irã, e estão por trás de surtos que surgem em várias partes do Brasil, como Salvador, São Luis e São José do Rio Preto, entre outras cidades.

Outro motivo que desperta a atenção de médicos e cientistas quanto à Neisseria vem do Instituto Adolfo Lutz, de São Paulo. É lá que a pesquisadora Maria Cecília Outeiro Gorla, do laboratório de bacteriologia, constatou recentemente que, no Brasil, a bactéria está cada vez menos sensível à ação de antibióticos como a penicilina e a ampicilina.

No período de 2006 a 2008, ela e seus colegas examinaram 1.096 cepas e concluíram que a resistência à penicilina passou de 13,5% em 2006 para 15,1% no ano passado. No caso da ampicilina, a variação foi similar, de 13,4% para 15,1%. “Esse resultado mostra que, embora os dois antibióticos possam ser usados para o tratamento de meningites bacterianas, seriam necessárias doses maiores para combatê-las”, diz Maria Cecília Outeiro Gorla.

Segundo ela, o aumento da resistência à penicilina também vem sendo registrada em outros países. Nos Estados Unidos é de 4%, na França chega a 30% e na Turquia a 70%. Embora o estudo não tenha observado queda de sensibilidade das cepas às cefalosporinas de terceira geração – drogas modernas e sintéticas derivadas da penicilina, também usadas no tratamento de meningites bacterianas. No entanto, Maria Cecília adverte que o aumento da resistência pode representar uma tendência e por isso exige constante monitoramento.

Entre os fatores que explicam o resultado da pesquisa estão a prescrição indiscriminada de antibióticos e, em alguns casos, a utilização inadequada de fármacos mais novos e de maior espectro. As cepas sensíveis morrem com o medicamento. Porém, outras insensíveis, mais fortes, transmitem seus genes para outras bactérias. Daí a multiplicação de organismos resistentes.

Segundo a pesquisadora do Adolfo Lutz, outro ponto importante do estudo é chamar a atenção da população quanto ao uso de antibacterianos sem receita médica. “Ao tomá-los por conta própria, em doses inadequadas, a pessoa está fortalecendo as bactérias nocivas de seu organismo. O pior é que elas são transmitidas para outras através da tosse e dos espirros, por exemplo, disseminando-as”, diz. Apesar de todo antibiótico trazer uma tarja vermelha em sua embalagem, na prática é vendido sem receita médica em qualquer farmácia. Por isso a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) estuda medidas para controlar a venda desse grupo de medicamentos.

O infectologista Gustavo Johanson, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), lembra que a resistência aos antibióticos de micróbios causadores de vários tipos de doença vem aumentando também no ambiente hospitalar. “A médio e longo prazo poderemos ter microorganismos mais resistentes, o que exigirá internações mais longas e o uso de fármacos mais caros e mais tóxicos”, diz.

Para controlar essa resistência, é preciso mapear o perfil de sensibilidade dos organismos que atingem hospitais e população, ou seja, analisar o efeito do medicamento sobre eles. No final de julho, a Rede Nacional de Monitoramento da Resistência Microbiana em Serviços de Saúde (Rede RM) publicou os dados colhidos entre 2006 e 2008 em 97 hospitais voluntários. As informações podem ser obtidas por meio da Anvisa.

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