Negligência em São Paulo

Pacientes do Hospital M’Boi Mirim esperam até quatro horas em ambulância por atendimento

Trabalhadores do Samu denunciam que já houve casos de tentativa de agressão contra motorista que denunciou demora no atendimento a paciente em estado crítico como omissão de socorro

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Sindsep diz que é responsabilidade da Secretaria Municipal de Saúde determinar que a OSS Cejam tome todas as providências necessárias para a plena estruturação da Política Nacional de Atenção às Urgência

São Paulo – Doentes e acidentados que chegam ao Hospital Municipal Dr. Moysés Deutsch (M’Boi Mirim), na zona sul de São Paulo, trazidos pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) e ambulâncias contratadas, chegam a esperar até quatro horas pelo atendimento de emergência naquela unidade de saúde. De acordo com profissionais do Samu, a situação tem causado atraso de ambulâncias solicitadas para outras emergências e colocado em risco a vida de muitos pacientes. 

A denúncia vem sendo acompanhada pelo Sindicato dos Servidores Municipais de São Paulo (Sindsep) que encaminhou o caso para o Conselho Municipal de Saúde cobrando esclarecimento da prefeitura paulistana. A entidade aponta que a deficiência do atendimento vem se agravando meados de abril e que a média de espera para autorizar a entrada na emergência de um paciente que chega de ambulância varia de 40 minutos a quatro horas. 

Há mais de um ano o Hospital do M’Boi Mirim é administrado pelo Centro de Estudos e Pesquisas Doutor João Amorim (Cejam), em parceria com o Hospital Albert Einstein. O coordenador da Região Sul 1 da entidade, Douglas Cardozo, conta que “antigamente, quando as ambulâncias do Samu ou de transferências chegavam ao hospital, o paciente era classificado dentro da ambulância, desembarcado e aguardava dentro do hospital”. Esse fluxo, no entanto, foi alterado, de acordo com o dirigente do Sindsep. 

‘Ninguém toma providências’

“A entrada do pronto socorro passou a ser no fundo do hospital, onde a ambulância estaciona. Aí o profissional da ambulância vai e comunica à emergência o estado do paciente. Um profissional da enfermagem vai até a viatura, faz uma avaliação rápida do paciente e poderá autorizar ou não o imediato desembarque. Enquanto não é autorizada a entrada, a equipe do Samu ou da ambulância de remoção é quem fica responsável por ‘cuidar’ da pessoa. Teve casos em que o hospital demorou até 4 horas para autorizar”, descreve. 

Segundo confirmou ao sindicato um trabalhador do Samu, – que não quis se identificar por medo de represálias –, atualmente no hospital, “enquanto um profissional não classificar a situação do paciente e não autorizar sua entrada, ele fica dentro da ambulância”. O procedimento padrão, no entanto, prevê a chegada da ambulância, o desembarque do paciente, a classificação de risco dentro do pronto socorro, o preenchimento da ficha e, por fim, o atendimento pela equipe do hospital. 

Uma das denúncias mais recente, do último domingo (4), indica que uma vítima de colisão entre carro e moto em Paraisópolis, comunidade da região, chegou ao Hospital M’Boi Mirim por volta das 11h20 e somente após uma hora e quarenta minutos de espera dentro da ambulância, começou a ser atendida pela emergência da unidade. “Todos os dias acontece isso e ninguém toma providência”, reclama um servidor que também denunciou o caso sob condição de anonimato. 

Pacientes em risco

As denúncias chegaram a ser levadas à direção do hospital. Mas ela somente reconheceu o problema após um caso, relatado em 13 de novembro, levar a um conflito entre colegas da emergência para preservar a vida da paciente.

“Chegamos no domingo, 13 de novembro, às 19h13, no Hospital do M´Boi, com uma paciente em estado crítico e ela começou a ser atendida às 21h37. Socorrida em suporte avançado, a pessoa precisava de outros recursos que somente um hospital tem. Conversei com a equipe, que informou que havia superlotação e a paciente não seria atendida naquele momento e que a paciente deveria aguardar na ambulância”, detalhou um profissional do Samu.

O trabalhador entrou em contato com a Polícia Militar para denunciar o caso como omissão de socorro. A ocorrência foi atendida, no entanto, pela Guarda Civil Metropolitana (GCM). Os agentes não deram razão para a denúncia e ficaram ao lado da equipe do Cejam. O samuzeiro então desembarcou a paciente e ingressou com a maca no pronto socorro, onde passou a ser atacado verbalmente por um enfermeiro que chegou a tentar ainda agredi-lo fisicamente. Ele conseguiu, contudo, que a paciente fosse atendida na emergência. Logo em seguida, o profissional denunciou as agressões à ouvidoria da Organização Social de Saúde (OSS) e à direção do hospital. 

Descumprimento da política de Estado

Cardozo diz que já houve casos de pacientes que tiveram rebaixamento dentro da ambulância devido à demora. “O estado de um paciente se agravou, segundo os trabalhadores nos relataram, e o socorrista teve que fazer as manobras de ressuscitação na ambulância, na porta do hospital. Há também pacientes acidentados com politraumatismo que foram mantidos dentro da ambulância por muito tempo até que o hospital admitisse a entrada”. A lotação da unidade também teria relação com o fechamento do pronto-socorro do Hospital Municipal do Campo Limpo. O atendimento foi paralisado em setembro, quando a unidade de saúde entrou em reforma.

A secretária de Trabalhadoras e Trabalhadores da Saúde do Sindsep e integrante do Conselho Municipal de Saúde, Flavia Anunciação, destaca que é responsabilidade da Secretaria Municipal de Saúde determinar que a OSS Cejam tome todas as providências necessárias para a plena estruturação da Política Nacional de Atenção às Urgências instituída pelo Ministério da Saúde. 

“A Cejam não pode, em hipótese alguma, mudar uma Política de Estado conforme sua vontade”, contesta.

O que diz a Secretaria Municipal de Saúde

A RBA questionou a pasta, sob gestão do prefeito Ricardo Nunes (MDB), sobre a denúncia dos trabalhadores do Samu. Em nota enviada nesta quarta (7), a SMS informou que apura as ocorrências citadas pela reportagem para “resposta imediata”.

“A pasta informa que o Hospital Municipal Dr. Moysés Deutsch (M’Boi Mirim) é referência para a atenção primária da região Sul de São Paulo, atendendo, em média, 450 pacientes ao dia no pronto-socorro. A unidade realiza classificação de risco conforme avaliação do enfermeiro na chegada à unidade, sendo utilizado protocolo de Manchester, que prioriza o atendimento conforme a gravidade de cada caso. A metodologia é referência para triagem e priorização do atendimento dos pacientes que chegam ao hospital, garantindo assim a assistência imediata para os pacientes que apresentam sinais de maior gravidade”, afirmou a secretaria.

Com informações de Cecília Figueiredo, do Sindsep

Redação: Clara Assunção


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