sem limites

Governo Doria usa ‘leitos virtuais’ e mente para justificar nova flexibilização da fase de transição

Governo Doria alega que aumento da flexibilização aposta em segurança e alega que algumas regiões poderiam ir para fase verde, o que não é verdade

Governo do Estado de São Paulo
Governo do Estado de São Paulo
Patrícia Ellen e Doria, defenderam flexibilização baseada em um melhora ainda incipiente e que pode ser revertida rapidamente

São Paulo – O governador paulista, João Doria (PSDB), anunciou hoje (7) uma nova flexibilização e a prorrogação da fase de transição da quarentena no estado, até o dia 23 de maio. A partir de amanhã (8), o comércio e os serviços poderão funcionar das 6h até as 21h, com recomendação de que a lotação dos espaços seja limitada a 30%, mas sem qualquer punição para estabelecimentos que não cumprirem esse percentual. Para justificar o novo afrouxamento nas regras, o governo Doria destacou a importância do dia das mães, considerou leitos de unidade de terapia intensiva (UTI) desmobilizados como disponíveis e alegou que, se não mantivesse a fase de transição, algumas regiões poderiam passar às fases amarela ou verde, o que não é verdade.

A nova flexibilização de Doria aumenta em uma hora o funcionamento de todos os estabelecimentos, inclusive restaurantes, academias, teatros e cinemas, que são considerados locais de alto risco de contaminação pela covid-19. A ocupação máxima passou de 25% para 30%, mas continua sendo apenas uma recomendação. O toque de recolher segue valendo, mas agora será das 21h às 5h. Desde 24 de abril, a fase de transição permite o funcionamento de todo o comércio e os serviços, em períodos maiores do que os definidos nas fases laranja e amarela do Plano São Paulo.

Fase de transição

“Tivemos três semanas de fase de transição. Se comparar o pico de um mês atrás com o dia de hoje, temos uma evolução muito importante”, justificou o coordenador do Centro de Contingência do Coronavírus, Paulo Menezes.

O coordenador-executivo do Centro de Contingência, João Gabbardo, argumentou que a alta ocupação ainda registrada se deve a leitos de UTI que foram desmobilizados com a redução do número de internações, passando a atender outros casos de doenças. “Se usarmos como critério a nossa capacidade máxima (de leitos de UTI no pico de março/abril), estamos com uma ocupação de 70% no estado e 62% na grande São Paulo. Isso nos dá segurança e tranquilidade para que a gente possa avançar gradualmente, lentamente, com segurança”, justificou.


Governo Bolsonaro quer ‘passar a boiada’ da privatização do SUS

“Utilizando leito referenciado a ocupação média do estado seria de 70%. Já estaria preparado para avançar para fases mais flexíveis do plano. Muitas regiões apresentaram melhora significativa e já teriam indicadores equivalentes à fase amarela ou fase verde”, complementou a secretária de Desenvolvimento Econômico, Patrícia Ellen, defendendo a flexibilização da fase de transição proposta pelo governo Doria.

Realidade é outra

Embora tenha havido alguma redução nos índices de novos casos, internações e mortes, para justificar a flexibilização os auxiliares de Doria ignoram que os números seguem altos, em valores compatíveis com a fase vermelha em 15 das 17 regiões do estado. Além disso, não é verdade que haja regiões que pudessem passar para as fases amarela ou verde da quarentena, como disse Patrícia. As melhores situações são da Grande São Paulo e da Baixada Santista, mas ambas estariam, no máximo, na fase laranja.

Dados da evolução da pandemia de covid-19 em São Paulo mostram a gravidade da situação

No caso dos leitos de UTI para pacientes com covid-19, o número quase dobrou devido ao pico da pandemia se comparado a janeiro desse ano. Eram cerca de 8 mil leitos, no primeiro mês de 2021. Em 6 de março, já eram 9.700. E em 6 de abril, passaram a 14 mil. A redução mencionada por Gabbardo é real e hoje o estado tem 12.823 leitos de UTI específicos para covid-19. Porém, esse número acompanhou a demanda de pacientes internados. E que hoje ainda é muito superior ao que havia antes do pico. São 10.060 pacientes em UTI hoje, contra 5.254 em 6 de janeiro.


Ventilação, máscara, distanciamento e higiene das mãos: OMS atualiza protocolo contra a covid-19

Além disso, com o atendimento de outros pacientes vítimas de acidentes ou com graves problemas de saúde, é pouco provável que o número de leitos de UTI que o governo Doria quer considerar para justificar a flexibilização esteja disponível imediatamente se houver uma nova explosão das internações, como a registrada entre março e abril, quando o número de novas internações por dia chegou 3.399. Embora tenha havido uma queda significativa, hoje ainda são internadas mais de 2.200 pessoas com covid-19 por dia no estado.

Pandemia descontrolada

Situação semelhante ocorre com o número de novos casos. O índice de novos casos por 100 mil habitantes caiu de 439/100 mil para 393/100 mil no estado. Mesmo assim, o número ainda é bastante alto. Os parâmetros internacionais indicam pandemia descontrolada a partir de 100 novos casos por 100 mil habitantes. Além disso, esse número está ancorado nos dados da Grande São Paulo e da Baixada Santista, as regiões mais populosas do estado. Todas as demais regiões registram mais de 415 novos casos por 100 mil habitantes, sendo que 7 estão acima de 500/100 mil.

No que se refere às novas internações, índice que teve a maior queda em todo o estado, 8 das 17 regiões ainda registram mais de 70 internações por 100 mil habitantes. O parâmetro máximo do Plano São Paulo é de 60/100 mil. Outras cinco regiões estão com índices de fase laranja e quatro com parâmetros de fase amarela, nesse item. Nenhuma região tem índices para a fase verde, que é de menos de 30 internações por 100 mil habitantes.

Regras do Plano São Paulo comprovam que governo Doria mentiu sobre a situação

O estado de São Paulo segue, ainda, com uma média diária de mortes por covid-19 equivalente a 20% de todas as mortes por essa doença no país. Nesta semana, a média está em 543 pessoas mortas por dia, número ainda muito superior ao registrado até mesmo no pico do ano passado. O menor índice de mortes por 100 mil habitantes é o da região de Piracicaba: 15,3/100 mil. No entanto, o valor é quase o dobro do que a máxima utilizada no Plano São Paulo: 8/100 mil.

Sentimentalismo contra a ciência

Apesar da situação, o governo Doria não fez recomendações para que se evite festas ou confraternizações no dia das mães, embora a situação da vacinação ainda esteja distante de uma ampla cobertura da população. Questionado se, com essa situação, o comitê havia elaborado alguma estimativa de aumento de mortes em decorrência de aglomerações no dia das mães, tanto nas compras, quanto em eventos familiares, ou mesmo da flexibilização, Doria abandonou a ciência e apelou ao sentimentalismo.

“Quero deixar aqui um sentimento a favor da vida e não a favor da morte. Amanhã é véspera de dia das mães, domingo dia das mães. Uma data muito importante, sentimentalmente, espiritualmente. E também de homenagem. Vamos olhar também pelo lado do que representa uma data como essa diante de um momento tão difícil tão dramático. Não há o que estimar de mortes advindo disso, mas sim de vida de fraternidade, do momento de poder olhar nos olhos da sua mãe e fazer disso um momento de emoção”, afirmou.


Leia também


Últimas notícias