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Cremesp recua e diz que chamadas de vídeo com internados por covid-19 não estão proibidas

Conselho de Medicina de São Paulo culpou a imprensa por divulgar informações do parecer que claramente proibia a realização de chamadas de vídeo

governo de Goiás
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Chamada de vídeo entre pacientes com covid-19 internados e seus familiares é considerada fundamental para a recuperação

São Paulo – O Conselho Regional de Medicina de São Paulo (Cremesp) voltou atrás e emitiu nota informando que o Parecer n° 131045/21 não proíbe a realização de chamadas de vídeo entre pacientes com covid-19 internados em unidades de terapia intensiva (UTI) ou emergência e seus familiares. Segundo o conselho, o parecer é apenas uma resposta a uma consulta de um profissional. No entanto, não emitiu nenhum documento oficial que garanta a realização das videochamadas, já que o parecer faz referência a outros documentos que proíbem a prática. O Cremesp ainda culpou a imprensa pela repercussão do caso.

“O Cremesp esclarece que o Parecer n° 131045/2021 não proíbe a realização de vídeochamadas por pacientes em UTI, uma vez que um parecer se trata de uma opinião, emitida a partir de uma dúvida enviada por qualquer pessoa ao conselho, servindo apenas como orientação, uma vez que não possui a mesma força que as leis ou resoluções para proibir ou permitir determinada conduta. O Cremesp não tem poder legal para proibir algo do tipo por meio de parecer e, mesmo se tivesse, não o faria, pois reconhece a importância da tecnologia para conectar familiares e pacientes”, diz a nota.

Nas redes sociais, o infectologista e diretor do Sindicato dos Médicos de São Paulo, Gerson Salvador, criticou a posição do Cremesp e apontou que o parecer causa insegurança nos profissionais de saúde. “Se o conselho reconhece a extrapolação de sua competência, emita um documento suspendendo os efeitos do primeiro, porque dada a organização das unidades, a oposição dos médicos na posição de responsáveis técnicos, a partir desse parecer, pode sim inviabilizar as videochamadas. E agradeçam a imprensa livre por apontar o erro grosseiro que joga contra a humanização do cuidado e a missão do conselho, que é garantir uma prática médica ética a serviço da sociedade”, afirmou.


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A consulta sobre as chamadas de vídeo fazia referência direta à situação atual, questionando se, “considerando a restrição de visitas hospitalares a pacientes internados”, haveria algum impedimento ético em promover uma interação entre os doentes e seus familiares. Também questionava se o procedimento poderia ser aplicado a pacientes sedados. Além de considerar que não haveria qualquer benefício aos sedados, o Cremesp estendeu a proibição a todos os pacientes “em sala de emergência e UTI”, sendo “vedadas as filmagens ou fotos nestas situações”.

Profissionais de saúde, a Academia Nacional de Cuidados Paliativos (ANCP) e a Associação de Medicina Intensiva Brasileira (Amib) criticaram a resolução. “Os conselheiros do Cremesp não fazem nada sobre os médicos que dão show em redes sociais e imprensa divulgando mentiras sobre a covid-19. Estão ocupados atrapalhando o mínimo de contato que os pacientes em emergências ou UTI podem ter com seus familiares. Lamentável”, criticou Salvador.

O médico sanitarista e mestre em Saúde Pública Felipe Daiko, que coordenou as equipes multidisciplinares e implantou os projetos de humanização dos três hospitais de campanha montados na cidade de Santo André, no ABC paulista, em 2020, destacou que a decisão do Cremesp trabalha contra a recuperação dos pacientes. “Posso afirmar que as chamadas de vídeo na ala de UTI (de pacientes com covid-19) foram fundamentais para o tratamento das pessoas internadas. Impedi-las é um erro grotesco”, afirmou.

A ANCP e a Amib externaram o retrocesso que a decisão do Cremesp de proibir chamadas de vídeo entre pacientes internados com covid-19 e seus familiares representa, contrariando um movimento adotado em redes de saúde em todo o país e que precede a pandemia do novo coronavírus.


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“Não se pode considerar violação do direito de imagem e do sigilo médico, a permissão para que uma esposa veja e fale com seu marido, ou que uma mãe consiga conversar e ver seu filho por meio de vídeo, desde que adotados os protocolos de segurança digital e que aquele contato seja realmente particular entre os presentes. A dignidade humana não deixa de existir quando uma pessoa está em coma. A visita virtual é uma forma de resgate desta dignidade, ameaçada pela imposição do isolamento naquele que se encontra em processo ativo de morte ou severamente enfermo”, avaliaram  as organizações.

Para as organizações, ainda que corretamente preocupado com a proteção da confidencialidade e autonomia do paciente, o parecer do Cremesp traz como consequência que pacientes sedados, em coma, em sala de emergência ou UTI só terão chances de contato com seus familiares se sobreviverem (e com boa cognição), de maneira a poder consentir expressamente com o contato virtual. “E, no caso específico de pacientes com Covid-19, cujas taxas de mortalidade permanecem elevadas, o parecer expõe um número expressivo de familiares ao prospecto de não poder se despedir de seus enfermos”, destacam.

“As UTI no Brasil têm avançado na direção do reconhecimento da importância de que o cuidado crítico seja centrado no paciente e por consequência também nos familiares. O exemplo mais emblemático da construção dessa maior parceria entre profissionais, pacientes e familiares vinha sendo a ampliação das visitas de familiares a seus enfermos, com muitos hospitais adotando a possibilidade de visitas estendidas em regime de 24 horas. O grande encorajamento à adoção de políticas de facilitação do acesso dos familiares às UTIs decorre da documentação de uma série de benefícios colhidos, tais como redução de conflitos, melhores desfechos clínicos dos pacientes (mesmo os sedados)”, dizem as organizações.


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