Colapso do sistema

Precisamos de uma guinada no caminho que nos levou ao abismo, diz sanitarista

Pesquisadora Lucia Souto, da Fiocruz, critica falas do novo ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, e defende isolamento radical para conter a pandemia

Alex Ribeiro/Fotos Públicas
Alex Ribeiro/Fotos Públicas
A transmissão continua num patamar muito elevado, o que exige que o Ministério da Saúde, os governadores, os governos estaduais, as Secretarias de Saúde dos estados e municípios, mantenham um alerta muito forte

São Paulo – Para a médica sanitarista e pesquisadora da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) Lucia Souto, presidenta do Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (Cebes), as primeiras declarações do novo ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, “deixaram muito a desejar”. Queiroga apontou para a continuidade das políticas promovidas pelo seu antecessor, general Eduardo Pazuello, no combate à pandemia. Segundo a sanitarista, é necessário uma guinada no caminho adotado até o momento, que está nos levando “para o abismo”.

“A população brasileira está cansada, esgotada. É quase uma tortura diária a qual a população está sendo submetida”, afirmou Lucia, em entrevista ao Jornal Brasil Atual, nesta quinta-feira (18). Além do colapso do sistema de saúde, há um risco iminente de colapso do sistema funerário. Além disso, os profissionais de saúde estão “esgotados”, destacou a especialista.

Nesta quinta-feira (17), a média móvel diária de mortes pela covid-19, calculada nos últimos sete dias, atingiu 2.170 pessoas por dia – três óbitos a cada dois minutos. Diante desse quadro, a sanitarista diz que para dar uma guinada na situação são necessárias medidas radicais de isolamento social, até que as vacinas produzidas pela Fiocruz e pelo Instituto Butantan cheguem à população.

As entidades que compõem o Pacto pela Vida, bem como o Fórum Nacional de Governadores, clamam por uma política articulada de combate à pandemia, sob coordenação do ministério da Saúde. Além disso, também exigem medidas para a aceleração do processo de vacinação.

No entanto, diante gravidade da situação, o Ministério Público Federal (MPF) teve que entrar com ação para barrar uma campanha do governo federal com o slogan “O Brasil não pode parar”. Sem embasamento científico, a Justiça do Rio de Janeiro barrou a divulgação dessa campanha. “É uma coisa assustadora”, disse a médica sanitarista, já que seriam necessárias ações de conscientização sobre a importância do isolamento, e não o contrário.

Leitos e auxílio

Assim como o Fórum dos Governadores, Lucia também criticou o atraso nos repasses de verbas federais a estados e municípios para o custeio dos gastos com a atenção básica em saúde. De acordo com o governador do Piauí, Wellington Dias (PT), os recursos programados para janeiro serão repassados somente no mês que vem, o que dificulta ainda mais os planos de ampliação de leitos hospitalares e de UTI.

A médica sanitarista também cobrou para uma efetiva guinada na situação “medidas robustas” de proteção social. Seja para as famílias que estão desassistidas, seja para as pequenas e médias empresas que também estão sofrendo com a crise. “Não dá para ser esse auxílio de R$ 150. A população está passando fome. Precisamos de medidas de apoio à atividade econômica. Muitos pequenos e médios empresários precisam de apoio também. É uma situação absolutamente extraordinária.”

Cronograma das vacinas

Em meio à tragédia sanitária, Lucia comemorou a entrega, nesta quarta (17) do primeiro lote com 500 mil doses de vacinas Oxford-AstraZeneca produzidas pela própria Fiocruz. A estimativa é que serão entregues, ainda este mês, 3 milhões e 800 mil doses. A partir de abril, serão produzidas cerca de 6 milhões de doses por semana, totalizando 100,4 milhões de doses até julho.

Contudo, até esse momento, é necessário combinar a vacinação com medidas preventivas, para deter a atual “escalada” no número de casos e mortos pelo novo coronavírus. “Nesse momento, mesmo com essa boa notícia, ainda leva um tempo para que essas vacinas cheguem até as pessoas. Essas vacinas que estão chegando precisam ser combinadas com medidas radicais de isolamento social”, destacou a especialista.

Assista à entrevista

Redação: Tiago Pereira – Edição: Helder Lima


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