Pedido de socorro

‘Água chegou no pescoço’: médicos clamam por ajuda em meio a colapso

Campanha para unir influenciadores no esforço ao combate à pandemia alerta que a solução imediata é o isolamento social e o uso de máscaras. “Não adianta mais leito de UTI e respiradores”, admitem

Diego Vara/EBC
Diego Vara/EBC
Professores da FMUSP entregaram ao novo ministro da Saúde manifesto em contraposição à gestão de Bolsonaro que levou ao atual caos sanitário e colapso nos hospitais

São Paulo – Médicos e gestores do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC-FMUSP) divulgaram vídeo nas redes sociais alertando que a unidade de saúde está em colapso como toda a estrutura hospitalar do estado de São Paulo. Em uma tentativa de concentrar esforços para combater a pandemia de covid-19, os profissionais do HC deram início a campanha #CanceleACovid, pedindo a influenciadores e formadores de opinião que se engajem na promoção de medidas como o isolamento social e o uso de máscaras. 

De acordo com o presidente do Instituto Coalizão Saúde e do conselho do Hospital Albert Einstein, Claudio Lottenberg, “esse tipo de linguagem, uniformização, entendimento e participação fará a diferença” para que a população “se conscientize da gravidade do momento”.

Levantamento divulgado na terça-feira (23) pela TV Globo e portal G1 aponta que, em média, quatro vidas são perdidas todos os dias, desde 1º de março, na espera por um leito de UTI na região metropolitana de São Paulo. Ao todo, 101 pessoas morreram aguardando por uma vaga e outras 767 permanecem na espera na Grande São Paulo. 

‘Água chegou no pescoço’

“A água chegou no pescoço. Estamos em uma segunda onda muito difícil”, resume a diretora de infectologia do Hospital das Clínicas, Nassara Levin. O alerta dramático, que abre o vídeo da campanha, é seguido pela advertência da infectologista Ho Yeh Li. “Estamos vivenciando o pior momento dessa pandemia. De tal forma que a gente não consegue mais ampliar para atender pacientes com covid ou com outras doenças”, destaca. 

O CEO do HC, Antonio José Pereira, o Tomzé, também observa que o país tem aproximadamente 3.200 mortes diárias e “iremos para um exponencial disso. Não temos limite”. “Não adianta mais leitos de UTI e mais respiradores, logicamente tudo isso é plausível, mas, neste momento, temos apenas uma solução imediata, a solução das pessoas continuarem em casa, usarem álcool em gel e máscaras.”

Também participam do vídeo o professor e infectologista Esper Kallas e o diretor da Faculdade de Medicina da USP e presidente do Conselho do HC, Tarcísio Barros. Os especialistas apelam aos influenciadores que os ajudem a angariar apoio e comuniquem as medidas de isolamento. Apesar das dificuldades de se cumpri-las sem um auxílio efetivo por parte do governo federal, elas são imprescindíveis para frear a pandemia.

Não existe tratamento precoce

O pedido de socorro dos profissionais de saúde reforça que a situação é de fato desesperadora. Ainda ontem, o presidente do Hospital Albert Einstein, Sidney Klajner, fez um pronunciamento público, divulgado nas redes sociais do centro médico, defendendo que as medidas de prevenção e vacinação “são as únicas chances que nós temos para vencer a pandemia. Precisamos voltar a preservar a vida, deixando de ser um país que, infelizmente, vem cultivando a morte”. 

O cirurgião também pediu à população “que não ignorem as recomendações baseadas na ciência que continuam sendo fundamentais”. E criticou, sem citar nomes, autoridades que defendem o uso de medicamento sem eficácia comprovada, como cloroquina e ivermectina, que fazem parte do rol de remédios listado no chamado kit-covid. “Se apegaram a fake news que disseminam tratamento de prevenção. Sendo que não há, até agora, qualquer medicamento, chá, ou receita caseira que evite a contaminação pelo vírus”.

“Quem já pegou pode pegar novamente e às vezes até de modo mais grave. Além disso, pacientes que se recuperaram da doença apresentam sequelas, como alterações cardiovasculares, neuropsiquiátricas, perdas nutricionais e musculares, inclusive morte”, acrescentou Klajner. 

Manifesto dos professores

Na manhã desta quinta (25), o novo ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, se reuniu com 72 professores titulares da Faculdade de Medicina da USP para criar “uma ambiência favorável para que as coisas avancem”, segundo o jornal Folha de S. Paulo. Queiroga foi ao encontro acompanhado do também ministro da Educação Milton Ribeiro. Os dois, em coletiva de imprensa, falaram brevemente em uma gestão de saúde “ao lado da ciência, ouvindo a acadêmica”. Após mais de um ano do governo Jair Bolsonaro contestar as principais medidas adotadas para controlar o vírus em todo o mundo. 

Do lado de fora do complexo do HC da USP, estudantes protestavam com cartazes cobrando vida, pão, vacinas e educação.

Em função da movimentação, os professores da FMUSP decidiram elaborar um manifesto, em contraposição à gestão presidente Bolsonaro que levou ao atual caos sanitário. O documento é centrado na necessidade de coordenação entre os entes federativos, assim como uma comunicação alinhada, transparência de todos os dados, adoção do distanciamento social como política prioritária, combate às notícias falsas e a medicamentos sem comprovação científica, além da vacinação universal e gratuita

Redação: Clara Assunção