Acovardado

Doria suspende operação descida ao litoral, mas ignora pedidos de ‘lockdown’ na Grande São Paulo

Dezenove cidades da região metropolitana da capital pediram medidas rigorosas para conter a covid-19. Prefeitos da Baixada Santista definem mais restrições hoje

GovSP
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São Paulo – Mesmo com 91% das unidades de terapia intensiva (UTI) ocupadas e recordes diários de mortes e internações por covid-19, o governo João Doria (PSDB) ignorou os pedidos para a decretação de lockdown feitos por prefeitos de 19 cidades da Grande São Paulo. Segundo o vice-governador paulista, Rodrigo Garcia, a atual fase emergencial da quarentena é “equivalente a um lockdown” e é preciso aguardar o encerramento do período para analisar os resultados dela. No entanto, desde o dia 6 de março, quando teve início a fase vermelha em todo o estado, não houve nenhuma melhora na situação.

Ontem (18), o prefeito de Santo André, Paulinho Serra (PSDB), presidente do Consórcio Intermunicipal do ABC, anunciou o pedido por um lockdown na Grande São Paulo. Segundo ele, também participaram da decisão os prefeitos das 12 cidades do consórcio Alto Tietê. Eles querem a suspensão total das atividades por sete dias, inclusive com a interrupção dos transportes metropolitanos. A ocupação de UTI no ABC está em 89,7% e no Alto Tietê, em 92,2%.

“A gente se reuniu e decidimos solicitar a implementação de lockdown (a Doria), porque as medidas que individualmente são tomadas não vão surtir efeito sozinhas. Há um grande fluxo de pessoas nessas cidades que dependem economicamente da rotina da capital paulista e só uma intervenção unificada na região metropolitana e nos transportes metropolitanos poderia fazer o efeito que precisamos”, disse Serra.

Sem pulso

No entanto, na entrevista coletiva de hoje (19), nenhum anúncio foi feito no sentido de atender ao apelo dos prefeitos. O médico José Medina, membro do Centro de Contingência do Coronavírus de São Paulo, considera “muito complicada” a adoção do lockdown pelo governo Doria.

“Essa é uma medida que, para ser implementada, precisa ser muito bem pensada. Ela foi implementada nos países da Europa, que têm a dimensão de um estado brasileiro. Não conheço nenhum país em desenvolvimento em que ela tenha sido implementada. O lockdown pode implicar em uma quebra da cadeia de produção, pode levar a desabastecimento e instabilidade social”, afirmou.

Falta coordenação de Doria

A falta de coordenação nas ações entre o governo Doria, que hesita em decretar o lockdown, e as prefeituras, que alegam não terem condições de realizar a medida sozinhas, levou a uma confusão entre o governo do prefeito da capital, Bruno Covas (PSDB), as prefeituras da Grande São Paulo e as da Baixada Santista.

Sem diálogo, Covas decretou a antecipação de feriados de 2021 e 2022, criando um período de 10 dias, entre 26 de março e 4 de abril, sem nenhum dia útil. Com a saúde colapsada, a capital começou a registrar mortes de pacientes à espera de UTI e Covas espera que o feriadão que criou faça as pessoas ficarem em casa.

No entanto, os prefeitos da Baixada Santista temem o efeito contrário: a descida de milhares de pessoas rumo às praias do litoral paulista. “O decreto do município de São Paulo impacta diretamente os municípios da Baixada Santista, visto o turismo que tem a característica de uma segunda residência”, explicou o prefeito de Santos, Rogério Santos (PSDB).

Ele comentou que os prefeitos das cidades litorâneas devem definir hoje uma série de novas restrições para conter a pandemia na região. Há duas semanas, a Baixada Santista tinha 44% de ocupação de UTI para covid-19. Hoje, está com 80%.

Para amenizar a situação, o governo Doria determinou a suspensão da operação descida no sistema Anchieta-Imigrantes, quando oito faixas ficam reservadas para o maior fluxo de veículos. De hoje até 5 de abril, a medida estará proibida. O secretário de Estado de Logística e Transportes, João Octaviano, também mencionou que algumas faixas serão interditadas, para dificultar ainda mais o fluxo de veículos sentido litoral.

Agravamento da pandemia

A ocupação de UTI no estado de São Paulo está em 90,6%. São 26.941 pessoas internadas com covid-19, sendo 11.410 em UTI e 15.531 em enfermarias. Apenas ontem, 3.380 pessoas foram internadas no estado, sendo 1.755 só na Grande São Paulo. Outras 129 foram internadas na Baixada Santista.

Araçatuba, Araraquara, Bauru, Campinas, Grande São Paulo, Marília, Presidente Prudente, Ribeirão Preto, São José do Rio Preto e Sorocaba, estão com a ocupação de UTI acima de 90%. As demais regiões estão acima de 80%.

O mais preocupante é que dados do projeto UTIs Brasileiras, da Associação de Medicina Intensiva Brasileira (AMIB), mostram que a mortalidade pela covid-19 nas UTI chega a 50%. Em caso de pacientes intubados, chega a 72%. Esse resultado já aparece nas mortes por covid-19 registradas em São Paulo.

Pior momento

Após quatro semanas de aumentos consecutivos nas internações, o número de mortes diárias já superou o pico anterior da pandemia, com a média atual em 450 óbitos por dia. Apenas nos últimos três dias morreram 1.955 pessoas de covid-19. O governo Doria já admite que o estado pode chegar a 800 mortes diárias.

Vinte e cinco cidades paulistas já registraram mortes de pacientes que esperavam leitos de UTI. Oficialmente, foram registrados 91 óbitos nessas condições. Bauru (15), Taboão da Serra (14), Ribeirão Pires (8) e Franco da Rocha (8) foram os municípios com o maior número. A capital paulista registrou uma morte por falta de leitos de UTI, de um jovem de 22 anos, na zona leste.