Imunização contra a covid

Anvisa aprova registro da vacina da Pfizer, que ainda não tem acordo de compra fechado por Bolsonaro

Primeiro registro definitivo autoriza a importação de doses para o Brasil, mas também abre possibilidade de venda para a rede privada. Em paralelo, Câmara analisa MP que pode prejudicar imunização coletiva com “camarote da vacina”, segundo deputado

Tânia Rêgo/EBC
Tânia Rêgo/EBC
O Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos Estados Unidos informa que 99% das mortes reportadas nas últimas semanas são de pessoas que recusaram a se vacinar

São Paulo – A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) concedeu, nesta terça-feira (23), o registro definitivo no Brasil da vacina da Pfizer/BioNTech contra a covid-19. O imunizante é o primeiro a obter a autorização do tipo pela Anvisa para uso em massa no país, que até então tinha dado aval apenas para uso emergencial às vacinas da Coronavac e de Oxford/AstraZeneca. Com a aprovação, as doses da Pfizer já poderiam ser aplicadas no país, mas o imunizante ainda não está disponível. 

Isso porque o Ministério da Saúde não fechou acordo de compra com a farmacêutica. Em negociação desde o ano passado, o governo de Jair Bolsonaro tem se mostrado resistente à oferta da Pfizer. O laboratório chegou a oferecer 70 milhões de vacinas, com a entrega a partir de dezembro de 2020. Mas o Ministério da Saúde recusou a compra, alegando que seria uma conquista de “marketing, branding e growth” para a Pfizer e causaria “frustração em todos os brasileiros”, nas palavras do ministro, o general Eduardo Pazuello. 

Impasses na negociação

O chefe da pasta considerava ser pequeno o número de doses iniciais, estimadas em 2 milhões. O que, segundo compara o jornal Folha de S. Paulo, era um volume semelhante ao importado na mesma semana de janeiro das vacinas de Oxford em acordo com Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). O governo também contesta as exigências da Pfizer. O laboratório afirma em contrato que não se responsabiliza por qualquer efeito colateral, algo que o presidente Jair Bolsonaro também ironizou. “Se você virar um jacaré, é problema de você”, disparou, no final de 2020.

Já neste ano, Pazuello alegou que as negociações de compra não estavam encerradas, mas considerou as cláusulas previstas pela farmacêutica “impraticáveis” e “leoninas”. A Pfizer, contudo, alega que suas condições são as mesmas para todos os países. Elas tratam desde o repasse dos riscos e custos de efeitos colaterais às nações compradoras até a exigência de que o laboratório só aceita ser processado em tribunal nos Estados Unidos. 

Nesta segunda (22), o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG) se reuniu com representantes da Pfizer e da Jansen, do grupo Johnson & Johnson, para negociar os termos de compra.

Comercialização privada 

Agora, com o registro da Anvisa para uso amplo, fica autorizada a importação da vacina para o Brasil. Inclusive com a previsão de compra pelos governos e pela rede privada. A prerrogativa também faz parte da Medida Provisória (MP) 1.026/2021 que facilita a compra de vacinas e insumos para a imunização contra a covid-19. De acordo com O Estado de S. Paulo, o parecer da MP deve ser votado nesta terça pela Câmara dos Deputados. O texto inclui a autorização de venda ao setor privado, estabelecendo em contrapartida a doação de metade das doses ao Sistema Único de Saúde (SUS) enquanto durar a vacinação dos grupos prioritários. 

A possibilidade de aquisição privada já era aventada pelo próprio Bolsonaro. Em janeiro, o presidente enviou uma carta à AstraZeneca e à Pfizer autorizando a compra pela rede particular. As farmacêuticas recusaram a proposta, o que foi bem avaliado pelo Conselho Nacional de Saúde (CNS) e a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) à época. As entidades avaliam que a compra de vacinas por empresas é a “oficialização do fura-fila”. E pode prejudicar o enfrentamento da pandemia e a imunização coletiva. 

O médico e advogado sanitarista Daniel Dourado também condenou a proposta que volta à tona com o registro definitivo e a MP. Pelo Twitter, o especialista avaliou que “no cenário atual, os governos têm obrigação de comprar toda vacina disponível”, como defendeu em referência à aquisição de doses pelos estados e municípios do país. “Enquanto houver escassez de vacinas, com doses insuficientes para imunizar a população-alvo, o Estado brasileiro não pode permitir que vacinas sejam vendidas na rede privada. Toda vacina que estiver disponível deve ser incorporada ao PNI (Plano Nacional de Imunizações).”

MP autoriza ‘camarote da vacina’

O ex-ministro da Saúde e deputado federal Alexandre Padilha (PT-SP) também usou as redes sociais para criticar a MP 1.026, que apelidou como “camarote da vacina”. “Com ela um senhor de 70 anos, que pode pagar, vai tomar vacina antes de um senhor de 70 anos que não pode pagar”, destacou o parlamentar.

Padilha anunciou que uma emenda será apresentada à medida hoje, estabelecendo que a autorização emergencial da Anvisa tem que ser exclusiva para o Sistema Único de Saúde (SUS). Ainda segundo o deputado, a empresa que quiser comprar vacina terá de doar as doses para o SUS e as clínicas privadas só poderão vacinar depois que todas as metas forem cumpridas. “Precisamos pressionar o governo federal para trazer mais vacinas à população que está apta a recebê-las. E não liberar o camarote da vacina para só toma-la quem tem dinheiro para pagar a dose”.

“Até porque não adianta a pessoa se vacinar individualmente, achar que está protegida, sem garantir proteção coletiva para a comunidade”, completou o ex-ministro da Saúde.

Eficácia da vacina da Pfizer

Enquanto isso, o Ministério da Saúde ainda não divulgou uma previsão de compra da vacina da Pfizer. Em nota, a vigilância sanitária garantiu que o imunizante “teve sua segurança, qualidade e eficácia, aferidas e atestadas pela equipe técnica de servidores da Anvisa que prossegue no seu trabalho de proteger a saúde do cidadão brasileiro”. No ano passado, a farmacêutica identificou que a vacina mostrou ser 90% eficaz na prevenção da doença causada pelo novo coronavírus. 

Um estudo, recentemente publicado na revista científica The Lancet, apresentou que a primeira dose da vacina da Pfizer atingiu uma eficácia de 85% entre duas a quatro semanas após a aplicação. Os dados foram recolhidos em Israel que realiza uma campanha de imunização, desde o dia 19 de dezembro, e tem sido considerado o mais rápido em todo o mundo na vacinação em massa. 

Redação: Clara Assunção


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