Falta de transparência

Governo Bolsonaro tira do ar site com total de mortes pela covid-19 no Brasil

“A tentativa autoritária, desumana e antiética de dar invisibilidade aos mortos pela Covid-19 não prosperá”, diz em nota Conselho de Secretários de Saúde

Rovena Rosa/EBC
Rovena Rosa/EBC
Mudança nos critérios adotados pelo Ministério da Saúde é contestada por secretários

São Paulo – Sem qualquer aviso prévio, o Ministério da Saúde alterou a forma de divulgar os dados relativos à pandemia de coronavírus e retirou do ar o site com os números atualizados que incluíam o total de mortes por covid-19. Até as 15 horas deste sábado (6), a página apresentava somente o aviso anunciando eque estava em manutenção.

A partir de agora, o ministério não vai mais informar o total de casos e óbitos decorrentes da covid-19 do país, nem os números por estado. Antes, havia a divulgação diária de uma lista com o total de casos e mortes registradas nas últimas 24 horas, com divisão por cada estado e a somatória das ocorrências.

Em entrevista à jornalista Bela Megale, de O Globo, o ainda não empossado secretário da Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos da pasta, Carlos Wizard, justificou a mudança alegando que os dados atuais são “fantasiosos ou manipulados”.

“Tinha muita gente morrendo por outras causas e os gestores públicos, puramente por interesse de ter um orçamento maior nos seus municípios, nos seus estados, colocavam todo mundo como covid. Estamos revendo esses óbitos”, disse ele.

As estatísticas, no entanto, apontam para uma realidade distinta. reportagem publicada pelo portal Uol na quinta-feira (4) mostra que o número de óbitos decorrentes de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) no Brasil cresceu 20 vezes no período compreendido entre 16 de março e 3 de junho, em relação ao ano passado. Os dados são baseados nas declarações de óbito registradas nos cartórios do país.

Em 2019, foram 349 mortes que tiveram SRAG como causa registrada no período analisado. Já em 2020, são mais de 20 vezes o número anterior, 6.994 óbitos.

“Sabemos que as mortes por SRAG podem ter como causa diferentes vírus respiratórios. O [coronavírus] SARS-CoV-2 é mais um dessa lista. Entretanto, olhando os números e as características entre um ano e outro, a única diferença plausível é a presença do novo coronavírus”, avaliou ao portal o epidemiologista Fabrício Augusto Menegon, professor do Departamento de Saúde Pública da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).

Omissão de mortes relacionadas à covid-19 é ‘perigoso e letal vexame’

O presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, se manifestou por meio do Twitter a respeito da mudança. “O Ministério da Saúde não adverte mais. Acéfalo e militarizado, presta-se ao papel de empoeirar e retardar informações sérias sobre a pandemia, apenas para satisfazer o apetite conspiratório do presidente e sua batalha pessoal contra a imprensa livre. Um perigoso e letal vexame.”

O Conselho Nacional de Secretários da Saúde (Conass) também repudiou “com veemência e indignação” o que considerou serem “levianas afirmações” de Carlos Wizard.

“Ao afirmar que Secretários de Saúde falseiam dados sobre óbitos decorrentes da Covid-19 em busca de mais ‘orçamento’, o secretário, além de revelar sua profunda ignorância sobre o tema, insulta a memória de todas aquelas vítimas indefesas desta terrível pandemia e suas famílias”, diz a nota.

O texto aponta ainda que Wizard “menospreza a inteligência de todos os brasileiros” e ofende secretários, médicos e profissionais de saúde. “A tentativa autoritária, desumana e antiética de dar invisibilidade aos mortos pela Covid-19 não prosperá.”


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