Combate ao coronavírus

Novo medicamento anunciado pelo Ministério da Ciência ‘pode ser uma coisa promissora’

Avaliação é do coordenador da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa, para quem há uma resposta heróica dos pesquisadores no combate à pandemia no Brasil

Antoninho Perri/Unicamp
Antoninho Perri/Unicamp
Venancio: a reação da comunidade científica foi muito positiva e a quantidade de protocolos cresceu bastante, já recebemos mais de 400 protocolos de pesquisa sobre a covid

São Paulo – Todos os protocolos de pesquisa para medicamentos que possam combater o coronavírus ou tratar a covid-19 passam por avaliação da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep), do Conselho Nacional de Saúde (CNS). Desde que, em 31 de janeiro, foi anunciada emergência sanitária mundial pela Organização Mundial da Saúde (OMS), mais de 400 protocolos de pesquisa de medicamentos já passaram pela Conep.

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Um deles foi divulgado nesta quarta-feira (15) pelo ministro da Ciência, Tecnologia e Comunicação, Marcos Pontes. O medicamento foi sintetizado por cientistas brasileiros do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), em Campinas (SP). E o resultado da pesquisa teria sido de 94% de eficácia em testes in vitro por 48 horas.

Agora, o medicamento, cujo nome não foi divulgado, seguirá para testes clínicos com 500 pacientes internados com covid-19 em sete hospitais: cinco do Rio de Janeiro, um de São Paulo e outro de Brasília.

Medicamento promissor

Para o médico Jorge Venancio, coordenador da Conep e membro suplente do Conselho Nacional de Saúde, parece ser uma coisa promissora. “Passou na Conep, foi aprovado ontem, discutido em Câmara e tudo”, relata.

“Houve uma primeira solicitação de pendências, que foram respondidas. A Câmara avaliou que eram satisfatórias as respostas e aprovou o projeto nessas bases. Parece uma coisa promissora. O resultado de bancada foi muito bom, pelo que foi relatado. Agora tem que ver a pesquisa com seres humanos, que às vezes repete a bancada e às vezes não. Não é uma coisa segura, ainda”, explica o médico, que também integra o Conselho Consultivo da Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz.

“O entusiasmo de buscar uma solução nossa, brasileira, é muito positivo, mas nós temos de ter cautela até ter os resultados clínicos. Acho inclusive que a posição do ministério (da Ciência), de não ter divulgado a substância, faz parte dessa cautela necessária nesse momento, para não provocar uma corrida à medicação antes de ter uma comprovação da eficácia dela”, afirma.

Heróicos pesquisadores

Venancio considera que diante de uma situação tão grave quanto a imposta pela pandemia do coronavírus, a ciência está entre as principais alternativas para encontrar uma solução. “Está se buscando desesperadamente caminhos para encontrar essa saída”, diz, destacando que a ciência precisa desesperadamente de recursos.

“O fato de ter sido cortada uma série de verbas para essa área, de uma forma quase selvagem, é um desastre e seguramente está atrapalhando muito a possibilidade de que a resposta agora fosse mais eficiente”, avalia.

“Nós deveríamos estar tendo um financiamento da pesquisa, especialmente nessa área da covid, muito maior da parte tanto dos órgãos federais, quanto dos órgãos estaduais que também foram vítimas da política de contenção de despesas: Fapesp, CNPQ, Capes. Tudo isso foi muito atingido”, lamenta. “Apesar disso, estamos tendo uma resposta heroica dos pesquisadores. Merecem todos os elogios nessa situação. Deveriam ter tido muito mais apoio nesse trabalho.”

O médico comentou, ainda, sobre a fabricação pelo Exército de 2,2 milhões de comprimidos de cloroquina, mesmo diante do fato de não haver comprovação científica sobre a eficácia desse medicamento no combate ao coronavírus. “Não chega a ser um grande problema. Porque se isso não for usado eventualmente contra a covid-19 – porque não está ainda comprovado, não se tem certeza se tem efeito real ou não –, vai ser usado na malária, no lúpus, nas doenças reumáticas”, diz. “Utilidade esses comprimidos vai ter de qualquer maneira, não vejo maior problema de fabricar. De uma certa maneira é até um fortalecimento da indústria pública de medicamentos, tão abandonada anteriormente.”

Ética na crise

Apesar da pressa em encontrar a cura para a doença causada pelo coronavírus, a Conep mantém sua atenção ao respeito de todos os parâmetros éticos e científicos. “Temos cobrado bastante na Conep esses critérios”, relata Jorge Venancio. “Têm chegado alguns protocolos bastante insuficientes. Em poucos casos não temos aprovado, em outros temos colocado uma série de pendências. Alguns protocolos mais simples têm sido aprovados de primeira. Mas tem sido frequente cobrarmos correções nos projetos de pesquisa.”

A aprovação à pesquisa com humanos se dá somente quando a Comissão avalia que os direitos e o respeito à pessoa que está participando da pesquisa está sendo garantido. “Claro que tudo isso se dá numa situação dramática e tem de ser levado em consideração também. Porque a ética na pesquisa tem de ser pesada com balanço entre risco e benefício”, afirma o médico. “Quando se tem uma situação em que a pessoa tem um risco de prejuízo muito grande não estando na pesquisa, e se ela entrando na pesquisa tem possibilidade de redução desse risco, isso é favorável a ela. E nessas circunstâncias a pesquisa pode ser feita.”

Venancio explica que diante da pandemia não estão sendo exigidas coisas formais, cartoriais. “Não é momento para isso. Estamos procurando garantir questões essenciais, ou seja, que a pessoa possa tomar uma decisão consciente de participar da pesquisa, sabendo quais são os riscos que aquela pesquisa coloca e quais são os riscos que ela pode oferecer. Isso é uma coisa que temos cobrado bastante dos pesquisadores, que fique bem claro no termo de consentimento de cada pesquisa. É questão fundamental para que a pessoa possa tomar uma decisão consciente de participar ou não da pesquisa.”


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