SUS em perigo

Pressionado, secretário de Doria recua e agora afirma que não fechará farmácias do SUS

Depois de meses se esquivando, Wilson Pollara diz que não acabará com as farmácias das UBSs. Segundo diretor do Sindicato dos Farmacêuticos, recuo é consequência de mobilização popular

EDSON HATAKEYAMA/PMSP

Farmácias do SUS estavam sob risco diante da intenção de Doria em distribuir remédios na rede privada

São Paulo – “As farmácias das Unidades Básicas de Saúde não serão fechadas. Ponto.” Foi assim que o secretário municipal de Saúde, Wilson Pollara, afirmou, pela primeira vez de modo taxativo, que a gestão do prefeito de São Paulo, João Doria (PSDB), não irá fechar as farmácias do Sistema Único de Saúde (SUS) existente dentro das Unidades Básicas de Saúde (UBS), em meio à elaboração do plano Remédio Rápido.

A afirmação de Pollara foi dada durante audiência pública realizada nesta quarta-feira (5), na Comissão de Saúde, Proteção Social, Trabalho e Mulher da Câmara de São Paulo. A intenção de fechar as farmácias das UBS vem sendo denunciada desde fevereiro por sindicatos e trabalhadores da rede de saúde da capital paulista.

Segundo Deodato Rodrigues, membro da comissão executiva do Conselho Municipal de Saúde e diretor do Sindicato dos Farmacêuticos no Estado de São Paulo (Sinfar-SP), o recuo do secretário é consequência da mobilização nos últimos meses dos trabalhadores e usuários do SUS.

“Houve uma grande manifestação quando o secretário foi numa reunião do Conselho Municipal de Saúde, a população se envolveu com isso, semana passada entregamos no Ministério Público um abaixo-assinado com cerca de 100 mil assinaturas. Todos esses fatos fizeram com que ele repensasse a ideia inicial”, avaliou Deodato.

Apesar da negativa de Pollara de que as farmácias das UBS serão fechadas, o diretor do Sinfar-SP disse que o secretário precisa “combinar isso com o prefeito”, considerando que Doria segue dando declarações que dão a entender uma intenção oposta.

Para a vereadora Juliana Cardoso (PT), integrante da Comissão de Saúde, as respostas do secretário Pollara durante as três horas de audiência pública foram “vazias”. Juliana destacou que, embora tenha dito que não fechará as farmácias das UBS, o secretário municipal de Saúde deixou questões sem resposta.

“Ele diz que não vai fechar, mas então qual a fórmula para o abastecimento das farmácias? Por que mesmo tendo orçamento a entrega ainda não é colocada em prática? Não pode faltar medicamento nas unidades básicas de saúde”, afirmou a vereadora. Segundo Pollara, as UBS hoje estão com 85% dos medicamentos previstos.

Juliana Cardoso ponderou que mesmo nunca tendo colocado “no papel” a intenção de fechar as farmácias, as entrevistas concedidas por Wilson Pollara e o prefeito João Doria indicam essa intenção, além da própria agenda de reunião de ambos. “Eles só se reúnem com empresários. Em nenhum momento chamaram os sindicatos e o Conselho Municipal de Saúde para dialogar sobre isso. Nosso medo é que ele faça algo passando por cima da própria legislação para colocar as empresas privadas dentro do SUS e isso é péssimo”, criticou, lembrando que antes da audiência desta quarta, Pollara já havia cancelado sua participação em duas oportunidades. “Hoje, depois de um mês e meio, ele vem, mas com falas vazias.”

Atendimento do paciente

Depois de Wilson Pollara afirmar, logo no início da audiência pública, que não irá fechar as farmácias do SUS, o atendimento prestado pelos profissionais das farmácias públicas foi um dos temas mais discutidos no encontro.

Em sua intervenção na audiência, Silvia Storpirtis, professora da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo (USP), enfatizou os serviços de orientação prestados pelos farmacêuticos das UBS, que auxiliam os pacientes sobre o uso dos medicamentos. “A dispensação não é a simples entrega dos medicamentos”, ponderou a docente.

Outros trabalhadores do sistema de saúde se manifestaram no mesmo sentido. O tom unânime era que, mesmo não ocorrendo o fechamento das farmácias do SUS, se os medicamentos passarem a ser entregues nas redes privadas, como é a intenção da gestão Doria, tais estabelecimentos não atuam com o mesmo cuidado em relação ao paciente.  

“As farmácias privadas dão pouca assistência farmacêutica, ao contrário do sistema público, que pode melhorar, mas é muito mais completo”, afirmou Deodato, do Sinfar-SP, enfatizando que o sindicato exige o cumprimento de lei aprovada em 2014, que coloca a farmácia como “um estabelecimento de saúde e não simplesmente de comércio”.

Segundo ele, para que isso seja posto em prática nas farmácias privadas é preciso uma série de adaptações, incluindo um consultório farmacêutico, para que o profissional não seja simplesmente um “entregador de caixinha”.

“É essa assistência que lutamos para que seja implementada em todas as farmácias do país, como é em outros países avançados do mundo onde não se vende um anti-inflamatório se não for na presença do farmacêutico. Queremos que a população realmente seja assistida e não seja simplesmente uma consumidora de medicamentos, como se fosse comprar bala ou qualquer outro produto.”

Privatização do Samu

Durante a audiência, Pollara também negou que o governo municipal tenha a intenção de privatizar o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu), conforme denúncia que vinha sendo feita por servidores. 

O secretário reconheceu a intenção de unificar o número de chamada do Samu e do Grupo de Atendimento às Urgências (Grau), mantido pelo governo do estado, para, segundo ele, não haver duplicidade de atendimento. 

Ele disse que o Samu tem atualmente 280 ambulâncias, mas apenas 80 delas circulam pela cidade prestando atendimento à população. Segundo Pollara, a razão é a falta de recursos. Questionado por trabalhadores, o secretário de Doria se comprometeu em se reunir com os profissionais do serviço para discutir os caminhos para melhorar o atendimento de urgência.

 

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