Efeito colateral

Para ‘doar’ remédios a programa de Doria, Alckmin reduz impostos de farmacêuticas

Sindicato dos Farmacêuticos critica edital de chamamento para laboratórios 'doadores', que prevê medicamentos perto do fim da validade e transferência de custos ao poder público

Arquivo/Anvisa

Por meio da “doação” à população, farmacêuticas ficarão livres do custo da incineração

São Paulo – O secretário municipal da Saúde de São Paulo, Wilson Pollara, publicou nesta quinta-feira (16), no Diário Oficial da Cidade de São Paulo, termo de doação de medicamentos à prefeitura. Trata-se de regras e procedimentos para a suposta doação de remédios por 12 laboratórios farmacêuticos.

No último dia 8, Doria anunciou a doação de 165 tipos de medicamentos em falta nas farmácias. E afirmou que por dois meses o estoque seria abastecido com 381 milhões de doses doadas, que custariam R$ 120 milhões se fossem comprados.

Embora tenha alardeado a parceria como resposta do setor empresarial ao apelo da gestão municipal, sem contrapartida, ele disse no mesmo dia que o governo de Geraldo Alckmin reduziria a alíquota do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) nas categorias incluídas no acordo emergencial, atualmente de 12% a 18% sobre o valor.

O Sindicato dos Farmacêuticos no Estado de São Paulo (Sinfar-SP) faz críticas ao edital. Por meio de nota oficial, aponta problemas que vão dos riscos à saúde até questões que colocam dúvidas sobre a legalidade da parceria. 

Prazo de validade quase no fim

Segundo o Sinfar-SP, o edital prevê que os medicamentos tenham, “preferencialmente”, validade superior a seis meses.  “Se houver propostas com doações de medicamentos cuja validade é inferior a este período, a Secretaria Municipal de Saúde irá recebê-los?”, questiona o sindicato.

A entidade observa que a população corre o risco de receber medicamentos cujo prazo de validade não permitirá seu consumo. Isso favorece as indústrias, uma vez que os medicamentos vencidos ou próximos ao vencimento devem ser incinerados, o que representa custos para as indústrias. Porém, a proposta de Doria transfere a carga para a prefeitura de São Paulo. “Ou seja, mais custos para a população paulistana”, aponta o sindicato dos farmacêuticos.

E mesmo no caso de medicamentos cuja validade é de seis meses, conforme aponta, deixa de ser comercialmente viável até mesmo para a indústria, para as farmácias e drogarias. “O remédio pode vencer antes da conclusão do tratamento. Por que terá, então, valor para a população que adquire esse medicamento via rede pública?”, questiona a entidade.

Benefícios tributários para o doador?

Além de questionar os benefícios tributários para as empresas “doadoras”, o Sinfar-SP fala em falta de transparência quanto aos critérios para seleção e atração dessas empresas. Afinal, a administração pública está subordinada aos princípios de impessoalidade, legalidade e publicidade dos atos públicos.

E aponta: o Edital de Chamamento Público pela Secretaria Municipal de Saúde informa que a empresa Cristália Produtos Químicos Farmacêuticos Ltda. protocolou uma proposta entregando as doações da indústria. E a partir desse protocolo, a prefeitura convoca os demais interessados em participar do processo.

“Por que, então, o chamamento público não foi feito antes de anunciar as 12 empresas parceiras, no dia 8 de fevereiro? E se o edital prevê a entrega de envelopes fechados e a confidencialidade – com base no princípio da impessoalidade dos atos públicos – com as propostas para participarem do projeto, por que a Cristália apresentou sua proposta antes da publicação do edital?”, questiona.

As mudanças anunciadas por Doria na distribuição de medicamentos têm sido criticadas por usuários do serviço público, trabalhadores, movimentos sociais, parlamentares e especialistas em direito da saúde. Além da parceria emergencial, há a proposta de extinção das farmácias existentes nas Unidades Básicas de Saúde (UBSs). Os medicamentos passariam a ser distribuídos em farmácias de grandes redes comerciais.

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