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Comissão do Senado quer Ciência sem Fronteiras como política de Estado

Comissão recomenda continuidade do programa, a garantia de recursos mínimos para honrar os encargos já assumidos, conceder novas bolsas e que o programa se torne política de Estado e não de governo

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Relatório do Senado recomenda que programa contemple a pós-graduação e que busque recursos em parcerias com a iniciativa privada

São Paulo – A Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática (CCT) do Senado defende que o programa Ciência sem Fronteiras (CsF) seja efetivado como política de Estado. Para isso, apresentou em dezembro o Projeto de Lei do Senado (PLS) 798, resultante da avaliação de políticas públicas desenvolvidas pela comissão ao longo de 2015.

Pelo projeto, o Ciência sem Fronteiras torna-se instrumento para a formação e capacitação de pessoal altamente qualificado em universidades, instituições de educação profissional e tecnológica, e centros de pesquisa estrangeiros de excelência, bem como para atrair para o Brasil jovens talentos e pesquisadores estrangeiros igualmente qualificados em áreas do conhecimento prioritárias. As ações empreendidas serão complementares às atividades de cooperação internacional e de concessão de bolsas no exterior desenvolvidas pelas agências federais de fomento à pesquisa.

Em seu relatório de avaliação, a comissão elenca 17 recomendações aos gestores do programa. A primeira delas é a continuidade do CsF apesar das dificuldades fiscais. Para isso, pede a garantia de recursos mínimos para honrar os encargos já assumidos e conceder novas bolsas.

Entre outras mudanças recomendadas pelos senadores estão a diversificação das fontes de financiamento, com a inserção de novos parceiros do setor privado, a prioridade à de pós-graduação e não de graduação, como é hoje, nas modalidades doutorado pleno, doutorado sanduíche, pós-doutorado e mestrado na concessão das bolsas no exterior.

Eles defendem ainda a introdução de critérios de equidade na concessão das bolsas para evitar que aspectos socioeconômicos afastem os melhores estudantes, mais incentivos para a vinda de professores e pesquisadores estrangeiros de renome para as universidades e centros de pesquisa brasileiros e mais ações envolvendo os diversos setores da administração pública para eliminar ou reduzir os entraves burocráticos para a entrada de professores e pesquisadores estrangeiros no âmbito do CsF.

O Ciência sem Fronteiras foi criado em 2011 pelo governo federal para incentivar a formação acadêmica no exterior. Os alunos brasileiros recebem ajuda financeira para estudar em universidades de outros países. De acordo com o Ministério da Educação, até o final de 2014 foram concedidas 101.446 bolsas de estudo. Destas, 78% foram para graduação sanduíche (parte no Brasil e parte no exterior). O total gasto com o programa de 2012 a novembro de 2015 foi de cerca de R$ 10,5 bilhões.

A maioria das bolsas foi concedida para as áreas de engenharia e demais tecnológicas, especialmente em universidades dos Estados Unidos.

Físico defende mais critério na avaliação do Ciência sem Fronteiras e menos cortes no financiamento da pesquisa nacional

Professor do Instituto de Física da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e pesquisador na área de óptica quântica, como para obtenção de dispositivos para computação quântica, o físico Luiz Davidovich é da opinião que, antes de mais nada, o programa Ciências sem Fronteiras seja avaliado de maneira rigorosa.

“Comissões e conselhos do Ministério da Educação e da Ciência, Tecnologia e Inovação, como Capes e CNPq, com representação do governo e da comunidade científica, devem avaliar o programa, seus resultados, falhas e principalmente as fontes de financiamento”, afirma o cientista.

Conforme aponta, o CsF não deve competir com outras políticas, antigas já, como as bolsas concedidas por agências financiadoras como a Capes, vinculada ao Ministério da Educação, e CNPq, ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, que trouxeram grande contribuição ao país.  “Praticamente metade dos recursos para financiar o CsF vem do Fundo Nacional para o Desenvolvimento da Ciência e Tecnologia. Não é missão desse fundo financiar programas voltados à graduação. São recursos que estão fazendo falta em pesquisas voltadas às áreas de saúde, comunicação, biotecnologia.” 

Para o físico, que é também diretor da Academia Brasileira de Ciências (ABC), o O CsF tem grande número de estudantes de graduação, com gastos elevados, no qual estão o pagamento de taxas nas universidades do exterior, em especial dos Estados Unidos e da Inglaterra. “É uma despesa muito grande. Desde o início, o Brasil já gastou R$ 9 bilhões. Claro que um programa custoso deve ser avaliado com critério; sua continuidade deve ser avaliada de maneira cuidadosa, sobre o que já foi conseguido. É necessário um estudo das necessidades reais, dos estudantes que têm condições de fazer esse programa e fontes de recursos adequados.” 

Ele chama atenção para os cortes no financiamento do setor, que está colocando em risco instituições conhecidas, redes de pesquisa que levaram muitos anos para se estabelecer nas áreas de saúde, de comunicação, energia, biotecnologia, que podem ser fortemente atingidas.

“Esperamos poder revertê-los. A rede de internet nacional teve corte da ordem de 50%, o que prejudica as conexões e links dessa rede. Então é preciso critério na decisão sobre a continuidade dos programas, se vamos ter recursos para continuar mandando 80 mil, 100 mil estudantes para o exterior.”

A saída, segundo ele, podem ser parcerias com a iniciativa privada. “Há experiências bem-sucedidas em outros países. É possível, sim, fazê-las sem que se desvirtue o interesse público. Isso desde que haja regras bem definidas, claras, controle social.”

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