Saúde

Financiamento, gestão e recursos humanos são os principais desafios do SUS

Administradores apontam baixo financiamento, de 3,7% do PIB, como aspecto mais grave. Investimento per capita é metade do registrado na Argentina e em Cuba, e um sexto do disponível na Espanha

Tânia Rêgo/ABr

A atenção básica à saúde, que atua na prevenção de doenças, está entre os avanços do SUS nesses 25 anos

São Paulo – O Sistema Único de Saúde (SUS), que está completando 25 anos, tem três grandes desafios a superar: a adequação do financiamento, o amadurecimento de um modelo de gestão e a ordenação de recursos humanos para o sistema. “É preciso amadurecer a compreensão de uma maneira republicana de compartilhar a responsabilidade pública da saúde, na qual União, estados e municípios criem organismos para gerir o setor em regime de colaboração e não de concorrência”, alertou ontem (14) o vice-presidente do Conselho de Secretários Municipais de Saúde do Estado de São Paulo (Cosems-SP) e secretário em Bauru, José Fernando Casquel Monti, durante palestra em debate promovido pela Federação do Comércio do Estado de São Paulo (Fecomercio), na capital paulista.

De acordo com ele, o aspecto mais grave é o subfinanciamento: o governo investe 3,7% do PIB, um terço a menos que a média internacional, que é de 5,5% conforme a Organização Mundial da Saúde (OMS). Enquanto o gasto per capita no Brasil é de US$ 348, na Argentina chega a US$ 671, no Chile, a US$ 504, em Cuba, a US$ 675 e na Espanha, a US$ 1.917. Para piorar a situação, o investimento federal vem sendo reduzido nas últimas décadas. Em 1980, dos gastos com saúde, 80% vinham da União. Hoje correspondem a 42%. Os municípios, que arrecadam muito menos que a União, acabam arcando com a maior parte. A maioria deles aplica muito mais do que os 15% que a lei manda investir. Pela legislação, a União deve investir o valor do ano anterior corrigido pela variação do PIB, mas não há percentual definido.

A esperança dos gestores é a aprovação de um projeto de lei de iniciativa popular que tramita no Congresso. Em agosto, o Movimento Saúde+10, que reúne mais de cem entidades em defesa de mais recursos para a saúde, entre as quais CUT, Ordem dos Advogados do Brasil e Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), entregou em torno de 1,8 milhão de assinaturas pedindo o repasse integral de 10% da receita corrente bruta da União.

O texto considera receitas correntes brutas a totalidade das receitas, ou seja, tributárias, de contribuições, patronais, agropecuárias, industriais, de serviços, de transferências correntes e de outras receitas correntes. Estabelece, ainda, que é vedada a dedução ou exclusão de qualquer parcela de receita vinculada à finalidade especifica ou transferida aos demais entes da Federação a qualquer título.

Mais profissionais

Outros desafios, segundo Monti, é o amadurecimento de uma gestão tripartite do sistema, que hoje é fragmentada, e a formação de recursos humanos orientada pelo próprio SUS. “Não conseguimos ainda na saúde criar terminais de autoatendimento como fizeram os bancos. Ainda precisamos de pessoas para atenderem pessoas. E pessoas bem qualificadas”, destacou.

Para cada mil habitantes, o Brasil tem 1,7 médico, 0,9 enfermeiros e 1,2 dentista. Além de insuficientes, estão mal distribuídos, concentrados nas regiões mais ricas dos estados mais desenvolvidos. A carência de profissionais é explicada também pela alta rotatividade e precarização do trabalho. “O SUS precisa ser protagonista na ordenação dos recursos humanos para a saúde”, defendeu.

Apesar das limitações, o SUS obteve muitos avanços desde a sua criação, a começar pelo reconhecimento da saúde como direito do cidadão e dever do Estado, numa concepção abrangente, de assistência integral à saúde de todos.

Na prática, proporcionou a expansão da cobertura à assistência, em especial na atenção básica, que inclui o programa nacional de imunização, um dos maiores do mundo e maior do que o oferecido em muitos países mais ricos que o Brasil, a evolução dos indicadores de saúde, como a redução da mortalidade infantil e materna, a efetivação do controle social, com conselhos paritários, e a transformação da sociedade pela saúde.

“Temos hoje mais de 30 mil equipes de saúde da família em 85% dos municípios brasileiros, que atendem a 98 milhões de pessoas, que permitiu um aumento de 450% no acesso ao sistema de saúde. Graças ao SUS, o país é o segundo que mais realiza transplantes de órgãos em todo o mundo. São coisas significativas.”

O presidente do Cosems-SP lembrou que todos esses avanços ocorreram um contexto de envelhecimento da população e da mudança do perfil epidemiológico do país, com aumento expressivo da incidência das Doenças Crônicas não Transmissíveis (DCNT), como obesidade, diabetes, doenças cardiovasculares, das mortes por causas externas, como acidentes de trânsito e homicídios, além do recrudescimento de algumas doenças infectocontagiosas, como a dengue.

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