Mais Médicos

Especialistas elogiam propostas para redução do déficit de médicos no país

Prefeituras reiteram que faltam médicos. Já entidades de classe se queixam de que obrigatoriedade do serviço no SUS é 'manobra que favorece a exploração da mão de obra'

Faltam médico em 10 mil equipes de saúde da família em todo o pais

São Paulo – Setores ligados à saúde avaliaram como positivas as medidas anunciadas ontem (8) pelo governo federal para enfrentar a falta de médicos no país, que incluem a ampliação de vagas nos cursos de Medicina das faculdades federais e privadas, a proposta de tornar obrigatório o atendimento no sistema público por dois anos para aqueles que ingressarem na faculdade a partir de 2015, bem como a contratação de médicos brasileiros e estrangeiros para atuarem no serviço de atenção básica.

Para o presidente do Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems), Antonio Carlos Figueiredo Nardi, o programa Mais Médicos vai além de uma resposta aos clamores da população que foi às ruas pedindo melhorias na saúde pública. “É o enfrentamento a uma grave situação. Nesse momento, em todo o país, 10 mil equipes de saúde da família estão sem médico”, afirmou.

Segundo Nardi, ao contrário do discurso corporativista de entidades médicas de que não faltam médicos no Brasil e que esses profissionais estão mal distribuídos, a falta é grande. “O Provab comprova que faltam, sim, medicos no país”, disse. Conforme dados do Programa de Valorização do Profissional da Atenção Básica (Provab), do Ministério da Saúde, mais da metade (55%) dos municípios que solicitaram médicos não conseguiram sequer um médico para atuarem em suas áreas. Das 2.867 prefeituras que recorreram ao programa federal para preencher suas vagas, 1.581 não conseguiram atrair nenhum. Assim, apenas 29% da demanda nacional por 13 mil médicos foi atendida.

Para a presidenta do Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (Cebes), a médica Ana Maria Costa, o governo acerta ao anunciar as medidas. “Temos uma parcela muito grande de médicos, em especial nas pequenas cidades das regiões Norte e Nordeste, porque não temos – e nunca tivemos, uma política de fixação de médicos.” O mais perverso, segundo ela, é que a falta desses profissionais é maior justamente nos municípios mais carentes, com menores Índices de Desenvolvimento Humano (IDH), nos quais a população é mais pobre.

Na visão dela, a medida, emergencial, deve ser calçada com outras medidas estruturantes que resolvam o problema de maneira definitiva. Entre elas estão planos de cargos e salários para os servidores do setor, que nunca foram feitos, e a discussão de uma proposta de serviço civil. Adotada já em vários países, consiste na obrigação do profissional de se dedicar ao sistema público de saúde por dois anos, depois de formado.

“Precisamos mudar a lógica das escolas que formam os médicos, inclusive as públicas, financiadas com recursos públicos, que formam profissionais para atender aos interesses do mercado, e não às necessidades da população”. Ela ressalta ainda que, além de médicos, faltam outros profissionais de grande importância para a saúde, como enfermeiros, dentistas, auxiliares de enfermagem, fisioterapeutas, nutricionistas.

Uma das principais medidas do Mais Médicos é a ampliação do ciclo de graduação, de seis para oito anos, para que os últimos dois sejam dedicados ao serviço obrigatório no SUS. A remuneração será garantida pelo governo, que espera colocar a medida em prática em 2015 para que no começo da próxima década 21 mil médicos sejam incorporados ao atendimento básico. As diretrizes serão definidas pelo Conselho Nacional de Educação e ainda carecerá de aprovação pelo Congresso Nacional, que hoje receberá a medida provisória do Mais Médicos.

Em nota, as entidades de classe criticaram a decisão do governo afirmando que desrespeita a “cautela imprescindível” ao bom exercício da medicina. A Associação Médica Brasileira, a Associação Nacional de Médicos Residentes, o Conselho Federal de Medicina e a Federação Nacional dos Médicos emitiram comunicado conjunto horas após o anúncio do programa reiterando a posição contrária à vinda de médicos estrangeiros e à mudança no ciclo de formação.

“Trata-se de uma manobra, que favorece a exploração de mão de obra. Não se pode esquecer que os estudantes já realizam estágios nas últimas etapas de sua graduação e depois passam de três a cinco anos em cursos de residência médica, geralmente em unidades vinculadas ao SUS”, dizem. “Também não se pode ignorar que o formato de contratação de médicos – sem garantias trabalhistas expressas, com contratos precários e com uma remuneração não compatível com a responsabilidade e exclusividade – são pontos que merecem críticas.”

Ontem, durante a cerimônia no Palácio do Planalto, a presidenta do Conselho Nacional de Saúde, Maria do Socorro de Souza, elogiou a coragem do governo, mas pediu valorização das carreiras da área de saúde como um todo, e não apenas dos médicos, e cobrou um debate público sobre a criação de fontes de custeio, prejudicadas com a decisão do Congresso de aprovar a extinção da Contribuição Provisória sobre Movimentações Financeiras (CPMF).

Ana Maria reforça a necessidade de mais recursos para a saúde pública. “Precisamos acabar definitivamente com o argumento falacioso de que o problema da saúde é a gestão. Temos problemas de gestão, claro, mas para resolvê-los também é necessário mais recursos.”

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