Para Conselho de Psicologia, Brasil volta ao tempo dos manicômios

Verona, do Conselho Federal de Psicologia: “Funcionamos à revelia do Estado” (Foto: Valter Campanato/Arquivo ABr) São Paulo – O Conselho Federal de Psicologia (CFP), que encaminhou na segunda-feira (26) um […]

Verona, do Conselho Federal de Psicologia: “Funcionamos à revelia do Estado” (Foto: Valter Campanato/Arquivo ABr)

São Paulo – O Conselho Federal de Psicologia (CFP), que encaminhou na segunda-feira (26) um relatório às Nações Unidas com 66 casos de violações de direitos humanos em hospitais psiquiátricos e clínicas entre 2002 e 2010, espera que a ONU contribua no avanço das políticas públicas para o setor no Brasil. O presidente do CFP, Humberto Verona, critica o financiamento público das comunidades terapêuticas e afirma que o País está regredindo na reforma psiquiátrica e voltando ao tempo dos manicômios.

O relatório do CFP foi entregue à representante do Brasil no Subcomitê para Prevenção da Tortura da Organização da ONU, Margarida Pressburger. O documento descreve situações de tortura, maus tratos, privação de liberdade e quatro casos de morte ocorridas em hospitais psiquiátricos e clinicas.

“Funcionamos à revelia do Estado, que possui uma lei que propõe a extinção dos manicômios e ainda não cumpriu essa determinação. São lugares sem a participação dos familiares, verdadeiras caixas pretas que favorecem a violação de direitos”, afirma o presidente do CFP.

Para Humberto Verona, as denúncias vão contribuir para a elaboração de um documento oficial da ONU sobre as diferentes situações de tortura institucionalizada que ocorrem no país, sobretudo, no sistema carcerário. O relatório tem como fontes familiares de pessoas com transtorno mental, usuários de serviços e pessoas que tiveram internação compulsória em comunidades terapêuticas, que relataram os casos por meio do Observatório de Saúde Mental.

Na avaliação de Verona, a divulgação do relatório da ONU poderá acelerar o avanço da consolidação de políticas públicas no setor. “Quando um organismo internacional apresenta para o mundo o relato de uma situação que é ignorada pela maioria das pessoas, a repercussão mexe com aqueles que têm responsabilidade de gestão ou no Judiciário”, afirma. Segundo ele, o levantamento da ONU deverá ser divulgado em cerca de três meses.

SUS

O relatório também foi entregue ao Ministério da Saúde e à secretaria geral da Presidência da República. “As denúncias estão sendo entregues às autoridades que prometem apurar, mas seria necessário um mecanismo de apuração das denúncias mais efetivo, em nível nacional, já que as violações ocorrem de forma persistente sem nenhum tipo de punição”, destaca Verona.

Além desses casos de agressão, denúncias recentes também indicam violações de direitos humanos dos usuários de drogas atendidos em comunidades terapêuticas. O CFP critica as comunidades terapêuticas, que são classificadas como uma “versão moderna dos antigos manicômios”. “A maioria trabalha com internação compulsória, por isso falamos que é o retorno do manicômio. As pessoas são retiradas do convívio social e muitas delas morreram sem nunca mais voltar. Essas comunidades são instituições de isolamento das pessoas, com baixíssimos resultados em longo prazo”, diz o presidente do CFP.

Verona vê um retrocesso na Reforma Psiquiátrica Antimanicomial, através da atual proposta do governo federal de financiamento público para as comunidades terapêuticas. “Nós questionamos a proposta de repasse de dinheiro público pois estas casas são orientadas de acordo com concepções religiosas e não dão conta da complexidade da situação. A maioria faz um tratamento moral e não profissional. Os aparelhos de saúde devem ser públicos e abertos, com profissionais capacitados”, defende.

Segundo o CFP, não há pesquisas sobre a eficácia dessas comunidades. “Elas centram suas ações na temática religiosa e na internação e permanência involuntárias, frequentemente desrespeitando tanto a liberdade de crença quanto ao direito de ir e vir dos cidadãos. Não há, portanto, justificativas técnicas para seu financiamento pelo SUS”, indica o relatório do CFP.

No Rio Grande do Sul, quatro casos de violação foram registrados – um em Alegrete, um em Rio Grande e dois em Guaíba. Conforme a presidente da comissão de direitos humanos do Conselho Regional de Psicologia (CRP), Luciana knijink, as denúncias dos municípios são encaminhadas, de acordo com cada caso, tanto para o Ministério Público quanto para os Conselhos Municipais de Saúde ou outros conselhos profissionais. Ela explica que o CRP não intervém diretamente nos casos, somente em relação às instituições de saúde que tiverem psicólogos atuando de forma irregular, que são submetidos ao conselho de ética da entidade.

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