Análise

Os meses que virão

A preservação dos empregos e negociações coletivas que garantam o poder aquisitivo terão importante influência para sustentar a demanda interna e a reação brasileira à crise

Os resultados do Produto Interno Bruto (PIB) para o primeiro trimestre confirmaram algumas projeções e avaliações que vinham sendo feitas sobre a economia brasileira nos últimos meses. Houve queda de 0,8% comparado ao quarto trimestre do ano passado, que por sua vez havia caído 3,6% em relação ao anterior. Com as duas baixas seguidas, a economia brasileira registrou tecnicamente uma recessão. Dois fatores explicam o mau início de 2009: os tombos da indústria e do investimento privado. O consumo das famílias e do governo cresceu e impediu que o PIB caísse mais. O setor de serviços também, ainda que modestamente, em linha com a sustentação do consumo.

Até o terceiro trimestre de 2008 estávamos crescendo a taxas próximas de 6% ao ano. Apenas na década de 1970 tivemos resultados semelhantes.

A indústria foi fortemente atingida pelo canal de exportação e pelo encolhimento brutal do crédito. O comércio mundial, após um longo período de crescimento a taxas expressivas, deve apresentar retração em 2009. Diante de um quadro de incertezas sobre a crise mundial, a decisão tomada pelas empresas foi paralisar ou cortar investimentos programados. Foi isso que o PIB do primeiro trimestre mostrou.

Ficou claro, também, que as medidas adotadas pelo governo federal tiveram forte impacto e evitaram que a atividade econômica apresentasse queda maior. A redução de impostos (Imposto de Renda, IPI, IOF, entre outros), as medidas para retomada da liquidez dos bancos, o papel dos bancos públicos na concessão de crédito, o reforço dos investimentos do PAC, da Petrobras e de outras estatais, somados, contribuíram para sustentar a atividade econômica.

Adicionalmente, as massas de rendimentos e de salários encontram-se em patamares superiores aos do ano passado e contribuem para a sustentação dos níveis de consumo das famílias. No plano das negociações coletivas, as informações do Dieese apontam na direção da reposição da inflação e até de pequenos aumentos reais nas datas-base. Tudo indica que o ajuste de custos das empresas tem se dado pelo corte de postos de trabalho.

A diminuição dos juros alivia as finanças públicas e pressiona para baixo as demais taxas do mercado. Por isso, precisa continuar

Por sermos uma economia relativamente fechada (a soma de exportações e importações representa cerca de 25% do PIB), a queda do comércio externo afeta-nos com intensidade menor que a países com grau de abertura maior. Não surpreende, portanto, que nações como Alemanha, Coreia do Sul e a própria China tenham sofrido mais com a retração do comércio mundial.

Não está descartada a retomada do crescimento, mesmo que lentamente, nos próximos meses deste ano. O aumento do salário mínimo, o papel dos programas sociais, o aumento das parcelas do seguro-desemprego, o emprego público, entre outros fatores, constituem uma rede importante de sustentação dos níveis de renda da população brasileira – e portanto do consumo e das atividades econômicas. A preservação de postos de trabalho e a celebração de negociações coletivas que garantam o poder aquisitivo dos assalariados terão importante influência para sustentar a demanda interna.

Contudo, dois fatores preocupam e podem dificultar a retomada do investimento privado e do consumo com maior intensidade: as taxas de juros ainda elevadas (tanto a taxa básica como na ponta do crédito, aos consumidores e empresas) e a apreciação do real frente ao dólar.

Os juros básicos (Selic) foram reduzidos de 13,75% para 9,25% nos últimos seis meses. Essa diminuição resulta em alívio para as finanças públicas e pressiona para baixo as demais taxas do mercado financeiro. Por isso, com a inflação em queda, precisa continuar nas próximas reuniões do Copom. O dólar mais barato, embora não represente risco no curto prazo, pode levar o país a enfrentar problemas no médio e longo prazo, com o retorno do déficit externo, sobretudo após a retomada do crescimento. E pode se tornar fonte de dor de cabeça para os futuros governos.

Sérgio Mendonça é economista. Foi diretor técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socieconômicos (Dieese) de 1990 a 2003, do qual atualmente é supervisor técnico