Editorial

Ódio, desinformação, desconstrução da política e hipocrisia

Onda conservadora absorvida pelo Congresso Nacional se deve, em parte, ao ódio à política promovido pelos meios de comunicação; e em parte porque muita gente ainda terceiriza seu senso crítico

LUIS MACEDO/CÂMARA DOS DEPUTADOS

Paulo Pereira da Silva e Eduardo Cunha lideraram a aprovação do PL 4.330 na Câmara

Campanhas empresariais em defesa do Projeto de Lei 4.330 alegam que ele estimulará a especialização, que trará segurança jurídica às empresas. E criará empregos. Para a maioria das organizações de trabalhadores, é o avesso de tudo isso. Locadoras de mão de obra passam longe de proporcionar treinamento e condições de trabalho que as empresas dão a seus contratados diretos. Tanto que a cada dez mortos por acidente de trabalho, nove são terceirizados.

“Segurança jurídica”, oras, já existe. Está na CLT e nos acordos coletivos que conseguem melhorá-la. Se cumprir o que está escrito ali, não há insegurança. Mas quem não quer cumprir vive tentando mudar a lei para legitimar suas manobras.

Quanto ao emprego, o que os cria é economia aquecida, povo com poder aquisitivo para fazer planos, viajar, estudar, poupar. Se a finalidade da empresa é gastar menos, ao se liberar a terceirização de atividade-fim ela dará um pé no traseiro do máximo de funcionários que puder e porá terceirizados no lugar. Ou seja: se esse projeto passar, criará empregos mais precários. Antes, causará a extinção do trabalho decente.

Repare que a principal liderança legislativa a acelerar a aprovação do PL 4.330, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, trabalha também para que a Casa ande com a proposta que reduz a maioridade penal. Se cadeia fosse sinônimo de paz, os níveis de violência deveriam ter despencado nos últimos 20 anos, quando a população carcerária passou de 145 mil para mais de 700 mil pessoas. Cunha tenta, ainda, votar uma reforma política que não cura a mais grave doença do sistema político: as doações empresariais em campanhas. O Congresso trabalha com a pauta da hipocrisia.

O predomínio desse onda conservadora se deve, em parte, ao ódio à política promovido pelos meios de comunicação tradicionais; e em parte porque muita gente terceiriza seu senso crítico. Esquece até de em quem votou ontem, não tendo como aferir se errou agora para acertar amanhã. Depois de tantas conquistas nos últimos 30 anos, deveríamos ter aprendido que a defesa do trabalho decente, a ampliação de direitos, a construção de uma cultura de paz e o aprimoramento da democracia passam pela política. Aquela que se pratica na urnas. E hoje, necessariamente, se exercita nas ruas.