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Viagem sem roteiro pela África e as muitas lutas de suas mulheres

Documentarista brasileira viaja sozinha por cinco países e pela história de muitas mulheres. Tão Longe É Aqui, de Eliza Capai, traz o choque e o entendimento entre culturas diferentes

Divulgação

Vendedoras, meninas, professoras, camponesas, advogadas…Histórias de vida tão diversas quanto surpreendentes

“Querida filha. Minha filha querida, pela primeira vez, cruzo o Atlântico. Do Brasil para a África. Sigo sozinha com uma mochila, uma câmera, microfone, fazendo umas reportagens. Nunca tinha embarcado para tão longe. Não planejei muito, saí sem roteiro. Eu quero dividir contigo o que fui encontrando.”

Em 2010, às vésperas de completar 30 anos, a jornalista e documentarista brasileira Eliza Capai passou sete meses viajando sozinha pela África. O documentário Tão Longe É Aqui, lançado no mês das mulheres, é o resultado dessa imersão em um continente de histórias. O longa-metragem realizado por meio de financiamento coletivo é uma espécie de road-movie em que Eliza conta as impressões que ia tendo sobre a vida das mulheres que encontrou enquanto perambulava por Marrocos, Cabo Verde, Mali, Etiópia e África do Sul.

“Muitas vezes, era difícil imaginar viver como aquelas mulheres com quem eu conversava. Pouco a pouco, a incompreensão que nascia do choque entre universos tão diferentes – poligamia, meninas com clitóris cortados, leis punitivas para o sexo antes do casamento – gerou uma crise: encarei meu próprio preconceito, minha própria cultura machista”, afirma a diretora, que durante todo o filme parece combater suas próprias noções pré-concebidas do que era ou deveria ser a África.

reprodução
Capa de Tão Longe É Aqui

No Mali, um dos países mais pobres do mundo, conhecido pela prática da mutilação genital feminina e pelo direito (dos homens) à poligamia, Eliza se abate e se sente culpada. “Eu realmente detesto a arrogância de vir a uma outra cultura e dizer ‘Isso é bom. Isso não é bom’ Mas é difícil de compreender”, assume a uma de suas entrevistadas, que responde com uma serenidade majestosa. “Eu penso que é apropriado que cada sociedade faça sua própria análise. Não há modelo perfeito da situação da mulher. É verdade que as mulheres têm problemas – na África, assim como na Europa e no Brasil. As situações são diferentes e eu acho que chegou a hora de dar a palavra às próprias mulheres. A gente não pode emancipá-las por elas, assim como não pode querer o desenvolvimento da África sem a participação dos africanos”, rebate a malinesa Awa Meite.

Vendedoras, meninas, professoras, camponesas, advogadas, mulheres com Aids, marcadas pelo divórcio em um país muçulmano, lésbicas. Pelo caminho, Eliza deparou com histórias de vida tão diversas quanto surpreendentes, que deixam claras as barreiras culturais entre a diretora e as entrevistadas, mas que, acima de tudo, evidenciam a cumplicidade entre mulheres. Afinal, todas sabem onde dói cada ferida, seja ela causada por palavras ou chibatadas.

Tão Longe É Aqui pode ser assistido em www.taolonge.com