Avanços e mazelas, o país 25 anos depois da constituinte

editorial

gerardo lazzari/rba

Anita, Lucélia e os filhos: pobreza e falta de políticas para assentamento em Corumbiara (RO)

Quem viu há de se lembrar. Quem não viu pode procurar. Ao promulgar a Constituição Federal, em 5 de outubro de 1988, após 20 meses e 320 sessões, o deputado Ulysses Guimarães lembrou do regime de exceção que terminara havia pouco tempo. “Temos ódio à ditadura. Ódio e nojo”, bradou, para em seguida “amaldiçoar” a tirania “onde quer que ela desgrace homens e nações”. Ao mesmo tempo, admitia que não era a Constituição perfeita, mas seria pioneira. Passaram-se 25 anos, o mais longo período de continuidade institucional, com tropeços, sustos, soluços, avanços e mazelas. O Brasil passou pela transição, consolidou a democracia, voltou a eleger seus governantes pelo voto direto – foram seis eleições presidenciais de lá para cá –, mesmo que os políticos sejam alvo de críticas.

Mas o país continua com graves problemas sociais. Injustiça e desigualdade são marcas difíceis de arrancar. A violência no campo expulsa e mata trabalhadores. Direitos dos índios são desrespeitados. Conquistas trabalhistas obtidas com dificuldade volta e meia entram na mira conservadora. Episódios como o massacre de Corumbiara, tema de capa desta edição, não foram suficientes para mudar a face perversa da sociedade brasileira. Os avanços são inegáveis, mas as mazelas são crônicas e persistentes.

Não foi a Constituição que queríamos – com tantos artigos até hoje por regulamentar e outros tantos já emendados – nem vivemos ainda o país que sonhamos. Um passo foi dado na ruptura com o regime autoritário, apesar de a cultura da violência e dos caminhos tortos do não diálogo seguirem como empecilho à democracia. Em cerimônia para lembrar os 25 anos da Carta, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, entrevistado também nesta edição, disse que em 5 de outubro de 1988 o país encerrou “uma longa noite de atritos”. Fez uma espécie de mea-culpa, já que o PT expressou votos contrários ao texto final da Carta, embora tenha concordado em assiná-la. E observou que vários programas sociais de seu governo tinham por base a Constituição de 1988.

A fotografia estampada na capa mostra um Brasil que, mesmo tendo melhorado consideravelmente no período recente, ainda pode ser frágil como uma criança. Padece de democracia, de justiça e de cidadania.