análise

Salários, juros e câmbio

Praticamente todos os preços de bens e serviços são formados a partir desses três preços básicos. E não é difícil entender as razões. Vamos a elas

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Alguém consegue imaginar uma mercadoria que não tenha utilizado força de trabalho na sua elaboração? Sobre os serviços, então, nem se diga. Dependem basicamente do trabalho das pessoas. Assim, os salários estão na formação dos preços de qualquer bem e serviço. A taxa de câmbio estabelece a relação da moeda nacional com as moedas que dominam a economia mundial e nas quais são cotados os preços no comércio internacional. Refiro-me principalmente ao dólar e, complementarmente, ao euro. Um país com uma economia muito fechada sofre uma influência menor da taxa de câmbio. Economias mais abertas (como a brasileira) aos fluxos de comércio e financeiros costumam ter maior influência da taxa de câmbio na inflação, já que os preços internos dependem dos preços dos produtos importados e exportados, convertidos à taxa de câmbio.

A taxa de juros talvez seja o mais importante dos três preços básicos. Reflete o “preço” do dinheiro e afeta todo o sistema de crédito da economia. Assim, quanto mais “cara” a moeda nacional (os juros), mais difícil adquiri-la no sistema bancário e financeiro por meio de empréstimos. Sendo uma moeda “cara”, acaba “valendo mais” do que as outras moedas. Na prática, de acordo com a realidade brasileira, os juros altos valorizam o real em relação ao dólar e às demais moedas (euro, iene etc.).

Mas o efeito de taxas de juros muito altas é mais complexo ainda para o organismo econômico. Ao encarecer o crédito, penaliza os consumidores e os empreendedores. Dificilmente uma empresa deixa de olhar para a taxa de juros antes de realizar um investimento. A rentabilidade esperada do investimento é sempre comparada com a alternativa de “deixar o dinheiro no banco”. Se a taxa de juros é alta, inibirá o investimento produtivo – que é o que gera renda, emprego, lucro e impostos.

No caso do consumo, nossa cultura é tomar a decisão de comprar um bem a prazo, analisando se a prestação cabe no salário. Certamente, se fizéssemos uma campanha nacional de esclarecimento dos juros embutidos nas prestações, muitos trabalhadores pensariam duas vezes antes de comprar. Não se trata de um comportamento irracional do brasileiro que compra a crédito. Contudo, se a taxa de juros do crediário fosse cortada ao meio (ainda assim seria muito alta!), o mesmo bem poderia ser adquirido por um número de prestações bem menor.

O efeito dos juros altos não pára por aí. A taxa básica de juros (chamada Selic, sigla de Sistema Especial de Liquidação e de Custódia) encarece o financiamento da dívida pública. Cada ponto percentual a mais na Selic, mantido por um ano, equivale a mais do que o orçamento anual do Bolsa Família. Uma dívida pública maior obriga à diminuição de gastos da União no futuro, comprometendo o investimento público necessário ao crescimento sustentável.

Voltando ao efeito dos juros sobre o câmbio, uma moeda muito valorizada (o real foi a moeda que mais se valorizou nos últimos quatro anos) estimula as importações e os gastos no exterior (turismo, por exemplo) e desestimula exportações e transferências. Ou seja, pode provocar desequilíbrio externo (déficits) e também pode pôr em risco a trajetória de crescimento da economia.

O efeito dos juros altos, sem exagero, pode ser devastador para a economia de um país. É como correr os 100 metros rasos com dez quilos a mais nas canelas. O competidor pode até chegar, mas nunca em primeiro lugar! Em outras palavras, o crescimento estará aquém do necessário para gerar empregos e corrigir as desigualdades de renda. Portanto, o debate público sobre esse tema é estratégico para os trabalhadores e o movimento sindical brasileiro.