ENTREVISTA

Portas abertas

Mayana Zatz, referência em estudos genéticos no Brasil, é otimista com o potencial das pesquisas, compreende a pressa das pessoas por soluções antes inimagináveis e alerta: “Só vamos injetar células-tronco embrionárias em humanos quando tivermos controle definitivo dos procedimentos”

jailton Garcia

Mayana Zatz, a renomada pesquisadora do DNA humano, não é de família de doutores. Diz ela que o interesse pela ciência é genético. Começou a estudar o assunto cedo, quando ainda não era moda, e considera sorte o fato de ter se tornado a ciência do século.

Coordenadora do Centro de Estudos do Genoma Humano da Universidade de São Paulo (USP), onde também é pró-reitora de pesquisas, Mayana estuda há mais de 30 anos terapias para doenças neuromusculares. Poder trabalhar com genética e com as células-tronco, que criam uma possibilidade de tratamento, para ela, é o melhor dos mundos. As pesquisas do genoma na USP começaram nos anos 1960, mas ganharam força duas décadas depois, quando, graças à tecnologia, foi possível deslanchar o estudo do DNA.

Guardadas as devidas proporções de época e ambiente, Mayana considera que a descoberta está para este século 21 como a da penicilina (em 1928) para o século 20. No ano passado, Mayana comemorou uma de suas maiores vitórias: a liberação da pesquisa com células-tronco embrionárias, as únicas capazes de se converter em qualquer um dos 216 tipos de células do corpo humano e com potencial de promover a cura de doenças como câncer e mal de Alzheimer, entre outras. A briga começou em 2004 e no ano seguinte, com a Lei de Biossegurança, a utilização das pesquisas com células-tronco embrionárias foi aprovada pelo Congresso – mas uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) da Procuradoria-Geral da República barrou o processo. Em maio do ano passado, no julgamento da Adin, o Supremo Tribunal Federal (STF), finalmente, liberou a pesquisa.

Apesar de o seu grupo na USP utilizar apenas células-tronco adultas, a geneticista ficou empolgada com a possibilidade que se abre para toda a medicina genética, e de lá para cá, tem estado à frente dos primeiros passos do país rumo ao aprofundamento dessa pesquisa. “Briguei muito para aprovar as pesquisas com as células-tronco embrionárias, porque só elas conseguem formar neurônios”, diz. Mayana nasceu em Tel Aviv, Israel, em 1947. Aos 7 anos, veio para o Brasil. Graduou-se em Ciências Biológicas em 1968, pela USP, e já possui quase 300 trabalhos científicos publicados em revistas médicas internacionais. Em 1981, ajudou a fundar e preside até hoje a Associação Brasileira de Distrofia Muscular (www.abdim.org.br).

Ela está ciente de que aquelas pessoas que convivem com problemas de solução antes inimaginável agora têm pressa, mas alerta: são necessárias ainda muitas experiências antes de se poder testar a injeção de células-tronco em humanos com segurança. O importante é que, com as vitórias do ano passado, as portas para a pesquisa estão, enfim, abertas e já se colhem frutos, como o aumento das verbas públicas para a pesquisa e o apoio do Reino Unido para formar expertise brasileira na área.

O que se pode esperar dos resultados do estudo do DNA?
A partir da década de 80, os estudos do DNA ganharam força e poderemos estudar cada vez mais e entender melhor o nosso genoma e os genes, responsáveis por todas as nossas características. Será possível responder às nossas grandes questões: por que ficamos doentes? Por que envelhecemos? Por que morremos? Quanto da nossa personalidade e do nosso comportamento depende de nossos genes? Vamos entender as doenças genéticas e tratá-las.

E o que há de mais promissor por enquanto?
Uma área muito promissora é a farmacogenética ou farmacogenoma, uma resposta individual às drogas, que vai revolucionar também a medicina e toda a área de farmacologia. Hoje, quando tomamos uma droga, somos cobaias. Não se conhece a reação individual. Alguns reagem muito bem, outros não têm reação nenhuma e em outros os efeitos colaterais podem ser muito graves.

Pode-se chegar a ponto de avaliar como a droga vai agir em cada pessoa?
Esse é um dos resultados que vamos ter a partir do estudo do genoma humano. Sabemos que tudo é determinado pelos nossos genes. No futuro, poderemos fazer um estudo dos genes antes de tomar um remédio. O médico vai saber a droga adequada para cada perfil genético. A pessoa não precisará ler aquelas bulas com letras minúsculas e não sofrerá todos os riscos colaterais. Existem várias drogas cuja velocidade de metabolização varia de acordo com o perfil. O que para alguns é inócuo para outros pode ter um efeito tóxico e levar à morte. Estima-se que cerca de 10 milhões de pessoas morram por ano por efeitos colaterais de remédios, e que 2 milhões sofram efeitos adversos.

Mas o estudo será acessível a poucos…
De fato não será para todos. Mas será importante saber, por exemplo, que o remédio que será bom para nós, não será bom para os japoneses. Cada remédio terá um comportamento diferente de acordo com os diferentes grupos étnicos.

O que se sabe sobre as doenças genéticas?
É qualquer doença que afeta o material genético, que pode ter sido herdado ou não. Existem mais de 7 mil tipos de doenças genéticas, que afetam 3% da população que nasce de pais normais. Toda vez que se busca a gravidez se corre esse risco de 3%. O câncer, por exemplo, é uma doença genética, e raramente é hereditário. Noventa e cinco por cento dos casos de câncer são genéticos.

Algumas doenças surgem de vários fatores?
Há muitas doenças que têm a herança multifatorial, que depende de uma predisposição genética e também de fatores ambientais. A maioria das nossas características tem interação entre gene e ambiente. Por exemplo, se você levar um tombo, cair e quebrar a perna, vai dizer que foi um acidente ambiental. Agora, se você pudesse reproduzir exatamente o mesmo tombo em outra pessoa talvez ela não quebrasse a perna, porque vai depender da constituição óssea. É isso, sempre há interação entre gene e ambiente na maioria das nossas características.

Compatibilidade genética tem a ver com hereditariedade?
Não. Existem muitas doenças recessivas. Se tiver um gene só que determina aquela doença, não acontece nada. Só vai acontecer algo se o pai e a mãe tiverem uma mutação daquele mesmo gene, e ambos passarem para o filho. Aí, com duas mutações, a doença aparece. É a doença recessiva e só tem risco para aquele casal. Não há risco para os filhos se vierem a ter filhos com pessoas que não são parentes.

A característica genética define a suscetibilidade das pessoas ao vício, sua reação ao consumo de drogas?
O alcoolismo tem um componente genético, e na resposta às drogas algumas pessoas certamente têm maior suscetibilidade. Em relação ao alcoolismo, estudos mostram incidência maior do problema em filhos de pais alcoólatras adotados por famílias não-alcoólatras e em gêmeos filhos de alcoólatras separados no nascimento.

É conveniente investigar essa suscetibilidade?
É uma questão polêmica que deve ser discutida com a sociedade. Mas é preciso tomar cuidado porque se a pessoa sabe que tem o fator genético, ela pode usar esse argumento para justificar os erros. Eu acho que certas pessoas têm uma maldade tão grande, uma capacidade para cometer crimes, que parece não ser apenas ambiental.
Mas não há conclusões.

Depressão e Síndrome do Pânico, além do fator ambiental, têm componente genético?
Sim, mas é importante falar disso sem criar culpa nas pessoas. As doenças psiquiátricas precisam ser desmistificadas. Assim como é normal as pessoas diabéticas aplicarem insulina, no futuro deverá ser normal a pessoa tomar alguma droga, tipo a serotonina, porque tem tendência à depressão. Isso precisa ser discutido e será cada vez mais aceito.

Valeria tratar preventivamente pessoas com tendências a doenças psiquiátricas e casos na família?
É difícil dizer enquanto não entendermos exatamente como é a biologia disso. Porque a pessoa pode ter uma tendência e não desenvolver a doença nunca. Aí trataríamos sem necessidade. E será que, se detectarmos precocemente, a pessoa já não vai ficar totalmente psicada? Temos como norma aqui não testar pessoas jovens para mutações de doenças que se iniciam tardiamente e para as quais não há tratamento. Existem inúmeras doenças que começam depois dos 40, 50 anos de idade. No caso de mutação de um gene só, dá para saber desde o nascimento se a pessoa tem aquela mutação, só que não há nada a fazer preventivamente.

O tratamento da distrofia muscular é o ponto forte de suas pesquisas, não é?
Nós focamos aqui as 50 doenças neuromusculares mais comuns da população. Meu grupo trabalha com as doenças neuromusculares, dentre elas, as distrofias, que atingem uma em cada mil pessoas em todo o mundo. Só no Brasil são umas 200 mil pessoas. Pode haver desde doenças muito graves que afetam bebês até aquelas que se iniciam na idade adulta e podem ter uma evolução muito lenta. Dentre todas as formas, a mais comum é uma distrofia que afeta só os meninos, que se chama distrofia de Duchenne. E foi por essa doença que eu iniciei a minha pesquisa.

Como se manifestam as doenças neuromusculares?
A pessoa vai perdendo progressivamente a musculatura e vai enfraquecendo, ou por um defeito do músculo ou por defeito dos neurônios. Aí vai se perdendo o músculo. Por isso briguei tanto para aprovar as pesquisas com as células-tronco embrionárias, porque só elas conseguem formar neurônios.

Quais são as células utilizadas nas pesquisas de distrofia?
Utilizamos células-tronco adultas de tecido adiposo, de polpa dentária, de cordão umbilical com resultados interessantes. Injetamos em camundongos com distrofia células de tecido adiposo humano, material extraído de lipoaspiração, e tivemos duas boas surpresas: eles não rejeitaram as células humanas e melhoraram clinicamente. Publicamos o resultado em uma revista científica no exterior e temos apresentado em congressos internacionais. Agora estamos injetando em outros modelos de camundongo e também em um modelo de cachorro que tem distrofia, num trabalho em colaboração com o grupo da Faculdade de Veterinária da USP.

Quanto tempo leva da pesquisa no animal para a aplicação no homem?
Pois é, todo mundo tem pressa. Nós também, mas não se pode pular etapas. É preciso acompanhar o animal por pelo menos um ou dois anos antes de pensar em começar ensaios clínicos em humanos. O cachorro, por exemplo, vamos ter de acompanhar por uns dois anos. O grande problema de injetar células-tronco é que, uma vez injetadas, perde-se o controle, ou seja, pode virar qualquer coisa, como um tumor, por exemplo. Então, nós só vamos poder injetar em humanos quando conseguirmos controlar definitivamente o processo.

O grande desafio é não se perder esse controle?
Sim, são inúmeras pesquisas para não se perder o controle do processo; qual o melhor meio para injetar; se a injeção deve ser feita local ou sistemicamente pela circulação; se é uma injeção ou se são várias. Então, são muitas questões para responder em modelos animais antes de pensar em ensaios clínicos. E as pessoas que estão com a doença têm pressa. Elas não conseguem entender quando a gente fala que isso demora.

Como foi a briga para legalizar a utilização das células-tronco embrionárias em pesquisas?
Foi uma briga que começou em 2004. Em 2005, com a Lei de Biossegurança, a utilização foi aprovada pelos parlamentares, mas aí houve a Ação Direta de Inconstitucionalidade, que barrou o processo. Mas em maio do ano passado a pesquisa foi aprovada definitivamente pelo Supremo Tribunal Federal. Essa foi uma das grandes vitórias que tive em 2008. Se bem que meu grupo, em particular, está estudando células-tronco adultas, com as quais estamos tendo resultados bastante interessantes. Mas eu quero ter a possibilidade também de trabalhar com as embrionárias.

E quais foram os avanços de maio para cá?
Logo após a aprovação da lei, fui com um grupo de pesquisadores brasileiros para o Reino Unido em uma missão financiada pelo Conselho Britânico para visitar os laboratórios mais adiantados do mundo em pesquisas com células-tronco embrionárias. Eles demonstraram forte espírito de colaboração, e o primeiro resultado é que teremos agora, em fevereiro, um curso ministrado pelo pessoal de lá no InCor (em São Paulo) sobre manipulação das células-tronco embrionárias. Além disso, o Ministério da Ciência e Tecnologia liberou verba para a pesquisa e, com isso, vamos expandir esse centro para realizar estudo específico com células-tronco adultas ou embrionárias.

As células embrionárias já utilizadas em pesquisas são importadas?
Sim, porque derivar uma linhagem é complicado. A colega Lygia da Veiga Pereira acredita que derivou uma primeira linhagem, mas ainda precisa validar. (Validar uma linhagem e conseguir a multiplicações das células significa que o Brasil não precisaria mais importar essa matéria-prima da pesquisa.) Mais importante do que não ter de importar será deter a tecnologia, até porque as importações na fase de pesquisas não têm custos.

Há alguma pesquisa parada ou retardada por trava judicial?
A única coisa que não conseguimos acelerar ainda foi a importação. Melhorou, mas continua sendo muito demorada. Enquanto nos Estados Unidos um reagente para uma pesquisa chega em 24 horas, no Brasil leva meses. Então, entre ter uma ideia e poder implementá-la, testá-la, demora muito. Se é uma ideia competitiva, outra pessoa lá fora pode ter a mesma ideia e sair na frente.

Isso é reflexo da falta de política pública?
Sim, falta de política pública, excesso de burocracia, de papelada, apesar de que algumas conversas que tive com a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) ajudaram no processo, mas ainda assim demora muito.

Qual foi o grande avanço tecnológico na área da genética?
A tecnologia dá saltos diários. O editor da revista The New England Journal of Medicine, maior publicação médica americana, disse que os avanços em genética vão a uma velocidade tão gigantesca, que se manter informado é como tentar beber água de uma mangueira de bombeiro. O Brasil tem um potencial gigantesco, temos cientistas muito bons e a gente tem uma qualidade muito boa para a pesquisa que se chama jogo de cintura.

Mas essa qualidade não briga com o que o Nelson Rodrigues chamava de Complexo de Vira-lata, que a gente está sempre atrás?
É e não é. Eu digo jogo de cintura no sentido de a gente se adaptar às condições porque, em pesquisa, a cada questão que você responde abre-se um leque de novas questões. E é aí que entra o jogo de cintura. Ter novas ideias para resolver as novas questões. Veja: por que o Brasil nunca ganhou o prêmio Nobel? Porque nossas condições não são competitivas. Entre milhões de cientistas no mundo, se duas pessoas têm uma boa ideia ao mesmo tempo, ganha quem pode testá-la mais rapidamente.

Com o avanço tão violento da tecnologia já não deveria haver cura para doenças tão antigas?
Não tem cura, mas a expectativa de vida, com todas as agressões ao ambiente, continua aumentando e está havendo uma mudança nas doenças que se tratava. No século passado, nos Estados Unidos, de cada mil crianças que nasciam, 150 morriam no primeiro ano de vida. Dessas, cinco morriam por questões genéticas. Hoje, de cada mil, morrem sete ou oito no primeiro ano e cinco continuam sendo por causa genética. Então, as mortes por causas genéticas hoje são 50%, 60% da mortalidade infantil. Em São Paulo, estamos chegando a um dígito de morte no primeiro ano de vida. As doenças genéticas estão ficando cada vez mais importantes como questão de saúde pública e são as mais difíceis de ser tratadas, mas existem avanços. Até dez anos atrás ninguém pensava em tratar doença genética e hoje se consegue tratar cada vez mais.

E como estão os investimentos públicos na pesquisa científica?
Houve um aumento substancial. O Ministério da Ciência e Tecnologia liberou, até o final de 2007, R$ 500 milhões para investimentos em pesquisa em quatro anos em todo o Brasil. Nunca foi dado tanto dinheiro para pesquisa. Em São Paulo, a Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) sempre deu muito dinheiro para os grupos qualificados de pesquisa.

O setor privado é muito ausente nessa questão?
Sim, totalmente folgado.

Quem tem acesso à medicina privada usufrui mais rapidamente das pesquisas ou o sistema público de saúde já está levando os resultados para a população pobre?
Não, está demorando muito. Tenho brigado há anos com o SUS porque quando estudamos qualquer doença genética desenvolvemos testes que permitem diagnóstico precoce. Dá para fazer aconselhamento. O casal pode saber se tem risco para futuros filhos. Se tiver, ele pode planejar a família. O SUS teria de custear porque quem pode pagar, paga. Mas a grande população, que não tem dinheiro, não tem acesso aos testes.

Significa trabalhar só para a elite. Isso não é desestimulante?
Sim, muito. Mas agora o SUS baixou uma portaria que prevê o custeio de alguns desses testes. E o impacto para a saúde da população será enorme. É daquelas contas que você tem o custo hoje, mas terá um benefício no longo prazo muito grande para a saúde pública. Dá para tratar e evitar nascimento de novos afetados com certas doenças genéticas.

A permissão ao aborto de fetos anencéfalos não seria uma forma de levar a ciência às periferias?
Sim, porque a gente sabe que qualquer pessoa que pode pagar interrompe a gestação. Só a mulher pobre é que não pode.

Os obstáculos morais e religiosos são maiores que os da própria legislação na questão do aborto?
Apesar de 70% da nossa população se dizer católica, cada um pega da religião somente o que convém. A gente atende aqui na USP pessoas com doenças genéticas e nunca ouvi esses argumentos.

Existe algum consenso no meio científico sobre o início da vida?
Tecnicamente, se diz que até 14 dias não há resquício de células nervosas. A formação do sistema nervoso é o princípio da vida. É muito importante as pessoas saberem que a vida não começa com a junção do óvulo com o espermatozoide. Estima-se que no corpo humano 70% dessas junções não dão em nada.

Existe um mercado se movimentando em torno das células-tronco?
Temos de tomar muito cuidado para não haver comércio. Por enquanto há comércio internacional. Há clínicas na China e na Ucrânia que oferecem tratamento para pacientes desesperados.

Algum país do mundo já utiliza legalmente células embrionárias em seres humanos?
É proibido injetar células embrionárias em seres humanos. Mas há pessoas que oferecem, só que ninguém sabe o que estão injetando. Existe um médico chinês que cobra mais de US$ 25 mil para injetar, mas até agora os resultados não são bem conhecidos. Mas já se sabe de casos de meningite e outros problemas. Esse médico já atendeu mais de mil pacientes.

Como se vai garantir a manipulação correta das células-tronco no Brasil?
O dinheiro que vamos receber do governo será utilizado para habilitar alguns centros para manipular essas células com a máxima segurança.

Quando for para o campo privado, como será feito o controle?
Tem a Anvisa, mas a gente sabe que não dá para controlar tudo.

O que faz despertar nos jovens o interesse pela ciência?
Primeiro é preciso divulgar a ciência na mídia. No caso das pesquisas com células-tronco, por exemplo, muita gente mudou de opinião depois que divulgamos fotos de um embrião de oito células e mostramos seu tamanho comparado ao tamanho de um buraco de uma agulha de injeção. Antes se dizia que a gente ia arrancar bracinho e perninha de feto. Então, foi muito importante deixar tudo muito claro e nós tivemos forte apoio da população porque tivemos apoio da mídia, que teve o papel de esclarecer a população e de mostrar aos parlamentares que a população queria a aprovação dessa lei.

Além disso, a USP tem um programa de pré-iniciação científica?
Queremos mostrar que ser cientista é muito legal, uma profissão fascinante. Daí a ideia de abrir os laboratórios da USP para alunos de ensino médio de escolas públicas. Fizemos uma parceria com a Secretaria de Educação e estamos com quase 400 alunos, que vão passar um ano dentro de todos os laboratórios da universidade. A ideia é contaminá-los com o vírus da curiosidade, que entendam como se faz uma pesquisa e como se discute os resultados. Confúcio disse: se você me falar eu provavelmente vou esquecer, se você me mostrar eu vou lembrar, mas se você me envolver eu vou entender.

Quanto custa para se sequenciar um DNA?
Estima-se que nos próximos dez anos se poderá sequenciar o DNA de qualquer pessoa por US$ 1.000. Mas em 2009 deverá ser possível por US$ 5.000. Mas logo estará acessível a todo mundo e todos vão querer sequenciar o DNA. O problema é que será gerado um monte de informação com pouco conhecimento. A gente vai achar um monte de mutações nas pessoas e não vamos saber interpretar.

E como evitar esse descontrole?
Por isso temos um projeto de fazer um banco de DNA de idosos saudáveis, o QIS – Quarta Idade Saudável, que vai ser meu parâmetro. Se eu achar uma mutação em um paciente e não souber se está associada a alguma doença, eu vou ao meu banco e vou saber se os idosos saudáveis têm essa mutação. Se eles tiverem, eu direi: não se preocupe porque é uma alteração normal. Qualquer pessoa poderá contribuir com o banco. São Paulo tem a vantagem de ter uma grande população com várias etnias submetidas ao mesmo ambiente. Então, será um material precioso. Nossa ideia é ter mil amostras.