Crônica

O Mundial de Clubes e as vastas costeletas

Tóquio pode ser uma reencenação do combate entre os conquistadores espanhóis e os libertadores do continente. Mais que nunca, a América é vermelha

mendonça

Está para começar uma guerra intercontinental. Grupos dos quatro cantos do mundo (desconfio que esta expressão surgiu quando ainda não sabiam que a Terra era redonda) se encontrarão em Tóquio para terríveis duelos. A Taça Mundial de Clubes vai reunir, mais uma vez, os campeões da Europa, da América do Sul, da Concacaf (América Central e do Norte e Caribe), da África, da Ásia e da Oceania. Na verdade, teremos times dos seis cantos do mundo.

Nosso maior inimigo deverá ser o Barcelona, o campeão europeu. O representante da América do Sul, como bem sabem o informado leitor e a formosa leitora, é o Internacional de Porto Alegre, vencedor da Taça Libertadores da América.

Mas eu lhes pergunto: quem são esses tais Libertadores da América? E eu lhes respondo: são os principais líderes do processo de independência das nações da América do Sul: Simón Bolívar, José de San Martín, Antonio José de Sucre, Bernardo O’Higgins e, quem diria?, d. Pedro I.

D. Pedro I, com suas vastas costeletas, proclamou a independência do Brasil contra o próprio pai. Depois teve de abdicar do trono, fez guerra contra o próprio irmão e tornou-se rei de Portugal.

O venezuelano Antonio José de Sucre, com suas vastas costeletas, aos 22 anos foi nomeado coronel por Simón Bolívar. Venceu a batalha de Pichincha (não, não foi uma batalha para conseguir desconto), assegurando a libertação do Equador. Depois participou da independência da Bolívia e foi seu primeiro presidente com apenas 30 anos. Sucre morreu duas vezes. A primeira foi numa emboscada no desfiladeiro de Berruecos, aos 35 anos. A segunda foi quando a moeda nacional do Equador, nomeada “sucre”, foi substituída pelo dólar, em 10 de setembro de 2000. Houve até um enterro simbólico.

O argentino San Martín, com suas vastas costeletas, participou das guerras de independência do Chile, do Peru e da Argentina. Começou sua carreira militar combatendo pela Espanha, mas, por influência dos maçons, trocou de lado e foi lutar pela independência americana. Em 1824, depois de muitas vitórias, desistiu da vida militar e mudou-se com a filha para a França. Morreu em 1850 na bela e tranqüila Boulogne-sur-Mer.

Bernardo O’Higgins foi o primeiro chefe de Estado do Chile independente, com suas vastas costeletas, usando o modesto título de Diretor Supremo. Renunciou voluntariamente ao cargo em 1823 para evitar uma guerra civil, exilando-se no Peru. Aos 64 anos permitiram que retornasse ao Chile. Morreu durante os preparativos para a viagem de volta.

Simón Bolívar nasceu em Caracas, numa aristocrática família de origem basca. Estudou na Espanha e ficou viúvo aos 20 anos. É considerado o maior de todos os libertadores. Com suas vastas costeletas foi ditador do Peru e presidente da Grã-Colômbia (formada por Colômbia, Venezuela, Equador e Panamá). Tinha sonhos de transformar a América do Sul numa federação como os EUA. Mas não alcançou seu objetivo. A Grã-Colômbia se dividiu e ele foi exilado para a Venezuela. Morreu tuberculoso e pobre, aos 47 anos.

Agora, em Tóquio, há grande chance de um confronto entre Inter e Barça. Teremos, então, uma reencenação do combate intercontinental, um replay de grande confronto do século 16: conquistadores espanhóis x colonizados sul-americanos. Nossa esperança é que o astro do Internacional, Fernandão, com suas vastas costeletas, vença os espanhóis, tal qual fizeram os primeiros libertadores da América.

Agora, mais que nunca, a América é vermelha.

José Roberto Torero é escritor, roteirista de cinema e TV (Pequeno Dicionário Amoroso, Retrato Falado), colunista de Esporte na Folha de S.Paulo e blogueiro (blogdotorero.blog.uol.com.br)