Um domingo mais alegre na TV

Domingo pede cachimbo, dizia-se antigamente. Hoje, pede outros passatempos

Presente em praticamente todas as residências, a TV tem no domingo uma audiência cativa de milhões de pessoas. Não é preciso sair de casa para consumi-la e, o mais importante, não é necessário tirar dinheiro do bolso. Poucos se dão conta de que o pagamento é feito na hora de comprar qualquer produto ou serviço anunciado, uma vez que o custo da propaganda está embutido no valor pago. Mas quem vai se lembrar disso logo depois do almoço de domingo?

Pena que a TV brasileira retribua tão mal a fidelidade do público. Se sua qualidade já é duvidosa em qualquer dia da semana, no domingo torna-se insuperável. A emissora líder de audiência mantém há anos no ar o Domingão do Faustão, responsável por um dos momentos históricos da TV brasileira quando exibiu o “sushi erótico”. Em programa recente mostrou pés com calos e frieiras, em todos os detalhes, como se nada de mais agradável pudesse ser oferecido ao telespectador.

Se os concessionários de canais de televisão são insensíveis à elevação cultural da população, que pode e deve ser oferecida pela TV, cabe então ao Estado agir para forçar a oferta de programações realmente diversificadas. Está mais que na hora de o Brasil instituir um órgão regulador para o rádio e a TV capaz de intermediar as relações entre o público e as emissoras, criando políticas voltadas para atender aos mais diferentes gostos e anseios da população. 

O argumento de que quem não quer ver cenas desse tipo muda de canal não se sustenta porque as alternativas são do mesmo nível. Na verdade, troca-se de canal para ver a mesma coisa com outra roupagem. Basta lembrar o Gugu e a farsa do PCC, outro momento histórico.

Desligar a TV é abrir mão de um direito de cidadania. Afinal, as emissoras receberam do Estado as concessões dos canais para prestar um serviço ao público, e deveriam fazê-lo com qualidade. É como se deixássemos de pegar o ônibus porque ele está sujo ou atrasado. No caso da TV, o telespectador fica condenado a ter como divertimento na tarde de domingo, além dos programas de auditório, partidas de futebol e, depois, suas intermináveis mesas-redondas. Para não falar de programas com quadros beirando a escatologia, como acontece, em alguns momentos, no Pânico. A seguir temos doenças, crimes e catástrofes nas revistas eletrônicas da noite, deixando um travo amargo na garganta do público. Nada mais melancólico para o fim do dia consagrado ao descanso e a retomada de ânimo para uma nova semana de trabalho. 

Mas não é todo brasileiro que passa por esse sofrimento na frente da TV. Há os assinantes de canais pagos. No domingo das frieiras do Faustão, eles podiam ver no Canal Viva (da mesma Globo) Chico Buarque e Caetano Veloso em seus melhores momentos. Esses telespectadores, com certeza, terminaram o domingo em alto astral.

“É sempre melhor superestimar a mentalidade do público do que subestimá-la”, dizia no século passado um dos primeiros diretores da BBC, a rede estatal britânica. Enquanto outro acrescentava a necessidade de a televisão “despertar o público para ideias e gostos culturais menos familiares, ampliando mentes e horizontes, além de elevar a qualidade de vida do telespectador, capacitando-o para uma enriquecedora experiência de vida, em vez de meramente puxá-lo para o rotineiro”.

Poderíamos começar a buscar esses objetivos, aqui no Brasil, pela programação dos domingos. É aquela que precisa de uma ação mais urgente tal o grau de degradação a que chegou. Com isso teríamos um final de descanso mais alegre, menos tenso, inspirador de uma semana melhor. 

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