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Calorosa abaixo de zero

Montreal é cosmopolita e acolhedora, apesar das baixas temperaturas. Numa das cidades mais seguras do mundo, o francês predomina

Cecile Benoit/Ministério do Turismo de Quebec

Edifícios de Montreal, vistos da pista de patinação do Bassin-Bonsecours

Um pedaço da Europa em plena América do Norte. É o que parece Montreal, a maior cidade da província de Quebec e a segunda maior do Canadá, atrás de Toronto. O lugar impressiona antes mesmo da aterrissagem, no Aeroporto Internacional Pierre Elliott Trudeau. No auge do inverno, em janeiro, os telhados cobertos de neve e a simetria dos quarteirões dão as boas-vindas aos visitantes.

O perfeito equilíbrio entre os charmosos sobrados com jardins e os arranha-céus rendeu-lhe o título de Cidade Design, concedido pela Unesco em 2006. Conhecida pelos festivais de jazz, que promove no verão, e por ser acolhedora com imigrantes e turistas, Montreal tende a agradar os mais diversos gostos, já que tem intensa vida cultural e noturna. São mais de 60 teatros, 120 cinemas, muitos museus e galerias de arte, festivais, centros comerciais enormes, parques e praças espalhados pelos quatro cantos, ótima rede de transporte público e, o que é melhor, um povo prestativo e educado com estrangeiros. Além de tudo isso, é possível andar com tranquilidade pela cidade, considerada uma das mais seguras da América do Norte e do mundo.

Mesmo fazendo parte de um país onde se fala inglês, Montreal é a segunda maior cidade do mundo cujo idioma é o francês, atrás apenas de Paris. Quando a língua inglesa começou a ofuscar a língua original, e o nacionalismo quebequense aumentou, o governo da província aprovou, em 1977, a Lei 101 – Carta da Língua Francesa –, que limita o uso do inglês e de outros idiomas na política, no comércio e na mídia. De acordo com o Ministério das Relações Exteriores, 84% da população fala francês; 10%, inglês; e 6%, alguma outra língua. Mesmo que você fale francês, é bom se preparar: o sotaque dos quebequenses difere muito do dos franceses. Só não vale tocar nesse assunto com os moradores, porque eles ficam bastante desconfortáveis com a comparação.

Para quem não domina o idioma, é de bom-tom aprender pelo menos o básico antes da chegada: “bom dia” (bonjour), “por favor” (s’il vous plaît), “muito obrigado” (merci) e “você fala inglês?” (parlez-vous anglais?) são palavras e expressões mágicas que facilitarão a recepção. Mas não é preciso entrar em pânico! Parte significativa dos habitantes fala inglês. Isso dá para perceber ao chegar à rua Sainte-Catherine, coração comercial da cidade, com milhares de lojas, outlets e shoppings que dão acesso à cidade subterrânea.

No inverno, quando a média de temperatura é -10 ºC (podendo chegar a -30 ºC), pode-se passar o dia nesse aglomerado de lojas e praças de alimentação. Com mais de 30 quilômetros de extensão e conectada a várias estações de metrô, a cidade subterrânea tem geralmente três andares, pé-direito alto e partes cobertas com telhados transparentes, que permitem a entrada da luz do sol e afastam, assim, qualquer sensação de claustrofobia. A época ideal para as compras na região é depois do Natal, quando as lojas fazem promoções com descontos de até 70%.

Linda Turgeon/ministério do Turismo de quebecEstádio
Estádio olímpico ao fundo, herança dos Jogos de 1976

O melhor da metrópole, porém, não está no subsolo. O Quarteirão Chinês, o Português e a Pequena Itália revelam boas surpresas gastronômicas e arquitetônicas. Nas ruas estreitas de Vieux Port (ou Cidade Velha) estão as mais baratas lojas de suvenires, além de ótimos restaurantes e cafés. Impossível não visitar o Mercado de Bonsecours, uma suntuosa construção de 1847, que já sediou o Parlamento do Canadá e a prefeitura e hoje abriga várias lojas de artesanato local, arte, antiguidades e restaurantes. Bem em frente, estão a pista de patinação e o porto, uma vista de tirar o fôlego mesmo no inverno, quando tudo está branco e a água, congelada.

A Catedral de Notre Dame não pode ser esquecida. Em frente à Praça das Armas, a basílica tem arquitetura gótica e o interior enorme e colorido. A poucas ruas dali, a casa de chá Ming Tao Xuan é uma viagem à China. Cada chá é preparado de maneira especial por Lee, o dono. Vale experimentar o Ancien Ti Kuan Yin, de textura um pouco cremosa e perfume floral, preparado na mesa do cliente, com louça chinesa e um ritual inesquecível. A loja é também um antiquário com milhares de peças tanto para preparação de chás quanto de decoração.

O endereço mais tradicional da música quebequense está igualmente no Vieux Port: Les Deux Pierrots, um bar onde as pessoas se encontram para cantar as músicas típicas, animadas por bandas locais. Assim como a animação lá, o preço da cerveja também é alto: 15 dólares canadenses a jarra de um litro. Ou seja, R$ 26.

Quem quiser experimentar as cervejas locais deve dar uma passada em um dépaneur, espécie de mercearia presente em quase todos os quarteirões, e pedir pelas montrealenses Maudite, avermelhada, e Fin du Monde, dourada, com 8% e 9% de teor alcoólico, respectivamente.

A cidra de gelo (ou cidre de glace), uma espécie de vinho licoroso de maçã feito das frutas congeladas, também é imperdível. O melhor local para comprar essa bebida tipicamente quebequense, assim como vinhos e destilados, é na Sociedade do Álcool de Quebec (SAQ), lojas do governo espalhadas por toda a cidade.

Cecile Benoit/ministério do Turismo de quebeccasas
Caminhar pela cidade revela surpresas como as ruas repletas de sobrados coloridos

Sabores típicos

E para comer bem em Montreal não é preciso procurar muito. Afinal, para aquele povo, comer é a celebração diária do prazer, do saber viver. Os pratos mais tradicionais são a poutine, batata frita com molho de carne e pedaços de queijo derretido (a mais tradicional da cidade é servida no La Banquise), e o sanduíche de carne defumada (viande fumée), especialidade ímpar do pitoresco restaurante judeu Schwartz, que existe desde 1928 e serve cerca de mil pessoas por dia, no Boulevard Saint Laurent.

A alguns quarteirões dali, moderno e retrô se misturam nas mesas do Café Cagibi. Quase sempre lotada de jovens com seus notebooks, a casa tem ambiente aconchegante, ideal para tomar um chocolate quente ou mesmo para escutar música, já que vez ou outra DJs tomam conta do lugar. Très cool!

No coração do Quartier Latin, na rua Saint Denis, fervilham sabores e cultura. A região é repleta de restaurantes, cinemas e livrarias. No vietnamita Lymai, não há badalação, mas come-se bem e com pouco dinheiro. Um exemplo é o prato Le fameuax général Tao, com frango empanado ao molho agridoce e legumes, por 13 dólares canadenses. Se estiver nas redondezas e quiser descansar, o visitante pode ir à Grande Biblioteca, no Boulevard de Maisonneuve Est, um espaço gigantesco com mais de 1 milhão de livros, milhares de DVDs e CDs do mundo inteiro, televisões com acesso a filmes e álbuns de música educativos para crianças, bancadas de estudo e confortáveis poltronas.

Xandra stefanelmuseu
O Biodôme reproduz quatro ecossistemas, entre eles o polar

Além de educação, a cidade respira cultura. São mais de 30 museus. Tem o de Arte Contemporânea, o do Chateau Dufresne, o do Chateau Ramezay, o Centro de História de Montreal. Mas o imperdível é o de Belas Artes, dividido pela rua Sherbooke. Vale ir com tempo para apreciar a coleção permanente, com obras canadenses feitas desde a chegada dos colonizadores – quando a região ainda se chamava Nova França – até os dias atuais.

Mas Montreal está além dos roteiros turísticos. É uma cidade para conhecer a pé, parando nos cafés, que se espalham por todos os quarteirões. É assim que se descobrem cantinhos como o Chez Brasil, um simpático restaurante onde tem feijoada, pão de queijo, caipirinha e muita música brasileira.

Para os esportistas, a pista de esqui mais próxima da cidade fica em Sainte Julie, cerca de 30 minutos de ônibus. E, para curtir a neve sem gastar muito, os parques Mont Royal e Jean Drapeau são ótimas opções. Neles é possível alugar equipamentos de esqui e patinação e apreciar a inspiradora paisagem. O Jean Drapeau é formado pelas ilhas de Sainte Hélène e Notre Dame. É lá que fica o museu da Biosfera, onde, em janeiro, a prefeitura promove a Festa da Neve, evento que reúne milhares de famílias em atividades esportivas para celebração do inverno, que apesar de rigoroso é lindo e cheio de encantos.

Café Cagibi